Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 029/2024
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 102/2024
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Acrescenta cinco vagas para o cargo efetivo de Médico de Saúde da Família e três vagas para o cargo efetivo de Dentista, constantes na Lei Municipal n.º 1.116/1993, que reorganiza no serviço público municipal de Guaíba o plano classificado de cargos e dá outras providências"

1. Relatório:

O Poder Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei do Executivo nº 029/2024 à Câmara Municipal, o qual “Acrescenta cinco vagas para o cargo efetivo de Médico de Saúde da Família e três vagas para o cargo efetivo de Dentista, constantes na Lei Municipal n.º 1.116/1993, que reorganiza no serviço público municipal de Guaíba o plano classificado de cargos e dá outras providências.”. A proposta foi encaminhada à Procuradoria para análise nos termos do artigo 94 do Regimento Interno.

2. Mérito:

Verifica-se estar adequada a iniciativa para a deflagração do processo legislativo, uma vez que o projeto de lei apresentado propõe o acréscimo de cinco vagas de Médico de Saúde da Família e três vagas de Dentista ao quadro permanente de cargos, no quadro de cargos estabelecido no inciso II do art. 14 da Lei Municipal nº 1.116/93, o que está sob a reserva de iniciativa do Chefe do Poder Executivo, disposta de modo originário no art. 61, § 1º, da CF/88, aplicável por simetria aos demais entes:

Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

  • 1º São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:

I - fixem ou modifiquem os efetivos das Forças Armadas;

II - disponham sobre:

a) criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração;

b) organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração dos Territórios;

c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria;(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)

d) organização do Ministério Público e da Defensoria Pública da União, bem como normas gerais para a organização do Ministério Público e da Defensoria Pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios;

e) criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública, observadoo disposto no art. 84, VI;  (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)

f) militares das Forças Armadas, seu regime jurídico, provimento de cargos, promoções, estabilidade, remuneração, reforma e transferência para a reserva.(Incluída pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)

Para os fins do direito municipal, mais relevante ainda é a observância das normas previstas na Constituição Estadual no que diz respeito à iniciativa para o processo legislativo, uma vez que, em caso de eventual controle de constitucionalidade, o parâmetro para a análise da conformidade vertical se dá em relação ao disposto na Constituição Gaúcha, conforme preveem o artigo 125, § 2º, da CF/88 e o artigo 95, XII, alínea “d”, da CE/RS. Apenas excepcionalmente o parâmetro da constitucionalidade será a CF/88, desde que se trate de normas constitucionais de reprodução obrigatória (STF, RE nº 650.898/RS). Nesse caso, refere o artigo 60 da Constituição Estadual:

Art. 60.  São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que:

I - fixem ou modifiquem os efetivos da Brigada Militar e do Corpo de Bombeiros Militar; (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 67, de 17/06/14)

II - disponham sobre:

a) criação e aumento da remuneração de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta ou autárquica;

b) servidores públicos do Estado, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria de civis, e reforma ou transferência de militares para a inatividade;

c) organização da Defensoria Pública do Estado;

d) criação, estruturação e atribuições das Secretarias e órgãos da administração pública.

No âmbito municipal, a Lei Orgânica dispõe no art. 119:

Art. 119 É competência exclusiva do Prefeito a iniciativa dos projetos de lei que disponham sobre:

I - criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração;

II - organização administrativa, matéria orçamentária e serviços públicos;

III - servidores públicos, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria;

IV - criação e extinção de Secretarias e órgãos da administração pública. (Redação dada pela Emenda à Lei Orgânica nº 2/2017)

Portanto, verifica-se ter sido respeitada a iniciativa para a propositura do Projeto de Lei do Executivo nº 029/2024, pois apresentado pelo Executivo Municipal, enquanto responsável pela organização administrativa e pela disposição dos cargos públicos.

Em relação à competência legislativa, o art. 18 da CF/88, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo autonomia política, do ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir sua organização, legislação, administração e governo próprios.

A autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na CF/88 para os Municípios, é tratada no artigo 30 da Lei Maior, nos seguintes termos:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

A proposta se insere, efetivamente, na definição de interesse local. Isso porque acrescenta cargos públicos efetivos à estrutura administrativa do Poder Executivo, o que, de fato, é da competência legislativa municipal (art. 30, I, da CF/88).

Além do atendimento da competência e da iniciativa, o projeto que verse sobre a criação de cargos públicos deve demonstrar o cumprimento dos requisitos de viés orçamentário previstos no artigo 169, § 1º, da CF/88, e nos artigos 15, 16, 17, 20 e 22 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LC nº 101/2000).

Prevê o artigo 169, § 1º, da CF/88:

Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.

§ 1º A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos, empregos e funções ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, só poderão ser feitas: (Renumerado do parágrafo único, pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

I – se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

II – se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

Na Lei de Responsabilidade Fiscal, preceituam os artigos 15 e 16, inc. I e II:

Art. 15. Serão consideradas não autorizadas, irregulares e lesivas ao patrimônio público a geração de despesa ou assunção de obrigação que não atendam o disposto nos arts. 16 e 17.

Art. 16. A criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa será acompanhado de:

I – estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subseqüentes;

II – declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias.

    

Tais regras não estão atendidas, visto que, além da previsão autorizativa do arts. 56 da Lei de Diretrizes Orçamentárias 2024 (Lei Municipal nº 4.457/2023), ainda não houve a apresentação de estimativa de impacto orçamentário-financeiro contendo as informações necessárias.

 Ainda, dispõe o art. 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal:

Art. 17. Considera-se obrigatória de caráter continuado a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios.

§ 1º Os atos que criarem ou aumentarem despesa de que trata o caput deverão ser instruídos com a estimativa prevista no inciso I do art. 16 e demonstrar a origem dos recursos para seu custeio.

§ 2º Para efeito do atendimento do § 1º, o ato será acompanhado de comprovação de que a despesa criada ou aumentada não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo referido no § 1º do art. 4º, devendo seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes, ser compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa.

§ 3º Para efeito do § 2º, considera-se aumento permanente de receita o proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

§ 4º A comprovação referida no § 2º, apresentada pelo proponente, conterá as premissas e metodologia de cálculo utilizadas, sem prejuízo do exame de compatibilidade da despesa com as demais normas do plano plurianual e da lei de diretrizes orçamentárias.

§ 5º A despesa de que trata este artigo não será executada antes da implementação das medidas referidas no § 2º, as quais integrarão o instrumento que a criar ou aumentar.

§ 6º O disposto no § 1º não se aplica às despesas destinadas ao serviço da dívida nem ao reajustamento de remuneração de pessoal de que trata o inciso X do art. 37 da Constituição.

§ 7º Considera-se aumento de despesa a prorrogação daquela criada por prazo determinado.

Quanto ao disposto no art. 17 da LRF, cabe reiterar que a estimativa de impacto orçamentário-financeiro deve apresentar a origem dos recursos para o custeio da despesa e conter as premissas básicas, comprovando-se, ainda, que a despesa criada não afetará as metas de resultados fiscais.

Além disso, estabelecem os artigos 19 e 20 da LC nº 101/00:

Art. 19. Para os fins do disposto no caput do art. 169 da Constituição, a despesa total com pessoal, em cada período de apuração e em cada ente da Federação, não poderá exceder os percentuais da receita corrente líquida, a seguir discriminados:

I - União: 50% (cinqüenta por cento);

II - Estados: 60% (sessenta por cento);

III - Municípios: 60% (sessenta por cento).

Art. 20. A repartição dos limites globais do art. 19 não poderá exceder os seguintes percentuais:

[...]

III - na esfera municipal:

b) 54% (cinquenta e quatro) para o Executivo.

Cabe ainda referir que a contratação de profissionais da saúde está ressalvada da proibição do art. 73, V, ‘d’, da Lei Eleitoral, pois relaciona-se com a saúde da população (vide TSE, REspe nº 27563, Rel. Min. Carlos Augusto Ayres de Freitas Britto, DJ 12/02/2007; Recurso Especial Eleitoral nº 38704, Acórdão, Relator(a) Min. Edson Fachin, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônico, Tomo 183, Data 20/09/2019, Página 55/56).

3. Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria opina pela legalidade e pela regular tramitação do Projeto de Lei do Executivo nº 029/2024, de iniciativa do Poder Executivo Municipal, por inexistirem vícios materiais ou formais que impeçam a sua deliberação em Plenário, desde que anexado aos autos o devido impacto orçamentário e financeiro exigido pelo art. 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF – Lcp nº 101/2000.

 

É o parecer.

Guaíba, 08 de abril de 2024.

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS   

Procurador-Geral

OAB/RS nº 107.136

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08/04/2024 14:31:12
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