Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 016/2024
PROPONENTE : Ver. Rosalvo Duarte
     
PARECER : Nº 041/2024
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Institui a "Semana Municipal de Conscientização sobre o Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH)" no Município de Guaíba"

1. Relatório:

O Vereador Rosalvo Duarte (PL) apresentou o Projeto de Lei do Legislativo nº 016/2024 à Câmara Municipal, o qual “Institui a "Semana Municipal de Conscientização sobre o Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH)" no Município de Guaíba". A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência para análise nos termos do artigo 94 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Vereadores.

2. Mérito:

A matéria de fundo insere-se na competência local, não havendo qualquer óbice à proposta. A proposição encontra respaldo no que diz respeito à autonomia e à competência legislativa do Município, insculpidas no artigo 18 da Constituição Federal de 1988, que garante a autonomia a este ente, bem como no artigo 30 da CF/88, que garante a autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios. O referido artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, dispõe que:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

(...)                          

A instituição de datas a serem celebradas no âmbito municipal é assunto de interesse local, verificando-se que a proposta legislativa ora em análise encontra-se ao abrigo do comando constitucional que estabelece a competência legislativa ao Município, não havendo, portanto, sob esse prisma, óbice material à regular tramitação do Projeto de Lei do Legislativo n.º 016/2024.

Por outro lado, em relação à forma como foi construído o texto do art. 2º da proposta, pretendendo autorizar a administração a realizar ações, resta caracterizada a afronta ao princípio da separação entre os poderes, insculpido no art. 2º da Constituição Federal:

Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

No que diz respeito à iniciativa legislativa para deflagrar o processo legislativo, a Lei Orgânica do Município dispõe, no art. 52, entre as iniciativas reservadas ao Prefeito encontra-se dispor sobre a organização e funcionamento da Administração. Sob esse aspecto, destarte, ocorre afronta à reserva de iniciativa do Chefe do Executivo para deflagrar o processo legislativo a disposição do art. 1º da proposta que estabelece norma autorizativa, incluindo a data no Calendário Oficial.

 

Em que pese a inconstitucionalidade do art. 1º da proposição prevendo a inclusão no Calendário Oficial, nada impede, conforme tem entendido esta Procuradoria, entretanto, iniciativa parlamentar no sentido de instituir a celebração em si, com previsão de objetivos específicos, desde que não imponha ou “permita” medidas ao Executivo.

Nesse sentido a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MUNICÍPIO DE PELOTAS. LEI MUNICIPAL Nº 6.019/2013 QUE INCLUI NO CALENDÁRIO OFICIAL DE EVENTOS DO MUNICÍPIO AS FESTAS DE IEMANJÁ E NOSSA SENHORA DOS NAVEGANTES. Constitui-se em vício de iniciativa a promulgação, pelo Poder Legislativo de Lei Municipal que, ao incluir no calendário oficial de eventos do município as festas de Iemanjá e de Nossa Senhora dos Navegantes, interfere na organização de órgãos da Administração Pública, matéria reservada ao Chefe do Poder Executivo; bem como origina despesas não previstas na lei de diretrizes orçamentárias, com a criação de atribuições e serviços a serem executados pela Administração Municipal. Afronta ao artigo 8º, artigo 10, artigo 60, inciso II, alínea "d", artigo 61, incisos I e II, artigo 82, incisos III e VII, artigo 149, incisos I, II e III, bem como ao artigo 154, incisos I e II, todos da Constituição Estadual. JULGARAM PROCEDENTE. UNÂNIME (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70057519886, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 06/10/2014)

DECISÃO: Trata-se de agravo de instrumento cujo objeto é decisão que negou seguimento a recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, assim ementado: “AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - CRIAÇÃO DO DIA MUNICIPAL DO ALCOÓLICO ANÔNIMO - AUSÊNCIA DE VÍCIO DE INICIATIVA. A Lei que instituiu o dia Municipal do Alcoólico Anônimo, não interfere em matéria cuja iniciativa legislativa é exclusiva do Poder Executivo, não padecendo, consequentemente, de vício de iniciativa.” O recurso extraordinário busca fundamento no art. 102, III, a, da Constituição Federal. A parte recorrente alega violação ao art. 2º da Constituição. Por meio de despacho de fls. 142, o relator originário, Ministro Joaquim Barbosa, determinou o sobrestamento do feito até o julgamento do RE 586.224-RG. Afasto o sobrestamento e passo à análise do recurso. O recurso extraordinário é inadmissível. De início, nota-se que a parte recorrente não apresentou mínima fundamentação quanto à repercussão geral das questões constitucionais discutidas, limitando-se a fazer observações genéricas sobre o tema. Tal como redigida, a preliminar de repercussão geral apresentada poderia ser aplicada a qualquer recurso, independentemente das especificidades do caso concreto, o que, de forma inequívoca, não atende ao disposto no art. 543-A, § 2º, do CPC/1973, vigente à época. Como já registrado por este Tribunal, a “simples descrição do instituto da repercussão geral não é suficiente para desincumbir a parte recorrente do ônus processual de demonstrar de forma fundamentada porque a questão específica apresentada no recurso extraordinário seria relevante do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico e ultrapassaria o mero interesse subjetivo da causa” (RE 596.579-AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski). O Tribunal de origem julgou improcedente o pedido de inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 9.607/2008, que instituiu o Dia Municipal dos Alcoólicos Anônimos – AA, sob o fundamento de que referida norma “não dispõe ou regulamenta funcionamento e/ou organização da Administração Pública ou de qualquer de seus órgãos”. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que não há burla à reserva de iniciativa do Chefe do Poder Executivo na hipótese em que o projeto de lei parlamentar: (i) não preveja aumento de despesas fora dos casos constitucionalmente autorizados; e (ii) não disponha sobre atribuições ou estabeleça obrigações a órgãos públicos.

DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.  Lei n° 1.817, de 14 de dezembro de 2016, do Município de São Luiz do Paraitinga, que "tomba como interesse histórico, social, cultural e religioso a Capela de Nossa Senhora do Bom Parto, situada no Bairro de Cachoeira dos Pintos, e dá outras providências".  (1) VÍCIO DE INICIATIVA: Possibilidade de o tombamento ser instituído mediante lei (modalidade "provisória").  Efeito declaratório, que demanda a ulterior prática de atos administrativos pelo Executivo Local para que o tombamento se converta em "definitivo". Não constatação de indevida ingerência do Poder Legislativo na esfera de atribuições do Poder Executivo.  (2) GESTÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA POR ATO NORMATIVO DO LEGISLATIVO: O estabelecimento de normas atinentes à organização e ao funcionamento da Administração Pública, a criação de atribuições a órgão subvencionado pela Edilidade e a definição de prazos rígidos para a prática de atos de gestão pelo Poder Executivo são funções acometidas, de modo privativo, ao Alcaide (arts. 47, II, XIV e XIX, "a", e 144, CE). Inidôneas tais práticas pelos Edis.  Inconstitucionalidade declarada dos arts.  3° “caput”; 4°, § 1°; e 5° todos da Lei guerreada.  (3) NORMAS DE CUNHO AUTORIZATIVO: Lei autorizativa ou de delegação que não encontra sentido no ordenamento jurídico, vez que o Prefeito não precisa de autorização do Legislativo para o exercício de atos de sua exclusiva ou mesmo concorrente competência.  Violação flagrante à separação de Poderes (art. 5º, CE). Inconstitucionalidade declarada dos artigos 4º, "caput", e 6º, ambos da norma local "sub judice".  (4) FALTA DE PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA ESPECÍFICA: não é inconstitucional a lei que inclui gastos no orçamento municipal anual sem a indicação de fonte de custeio em contrapartida ou com seu apontamento genérico.  Doutrina e jurisprudência do STF, do STJ e desta Corte.  AÇÃO PROCEDENTE, EM PARTE.  (TJ SP. ADI n° 2248076-47.2017.8.26.0000. J. 08.08.2018).

3. Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula, por si só, a manifestação das comissões permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria orienta pela regular tramitação da proposta, não obstante a necessidade de supressão do contido no art. 1º, quanto à inclusão no Calendário Oficial de Eventos, em razão de vício de iniciativa, caracterizado com base no artigo 61, § 1º, da CF/88, artigo 60, II, “d”, da CE/RS e artigos 52, VI, e 119, II, da Lei Orgânica Municipal.

É o parecer.   

Guaíba, 08 de fevereiro de 2024.

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador Geral

OAB/RS nº 107.136

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08/02/2024 14:12:36
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