Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 169/2023
PROPONENTE : Ver. Alex Medeiros
     
PARECER : Nº 346/2023
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Concede isenção do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) incidente sobre imóveis edificados atingidos por enchentes ou alagamentos causados pelas chuvas ocorridas no Município de Guaíba a partir da data de publicação desta Lei Complementar e acrescenta inciso XI ao art. 29 da Lei Complementar nº 3.208/2014 – Código Tributário Municipal"

1. Relatório:

O Vereador Alex Medeiros (PP) apresentou o Projeto de Lei nº 169/2023 à Câmara Municipal, o qual “Concede isenção do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) incidente sobre imóveis edificados atingidos por enchentes ou alagamentos causados pelas chuvas ocorridas no Município de Guaíba a partir da data de publicação desta Lei Complementar e acrescenta inciso XI ao art. 29 da Lei Complementar nº 3.208/2014 – Código Tributário Municipal”. A proposição foi encaminhada à Procuradoria para análise nos termos do art. 94 do Regimento Interno. O proponente apresentou substitutivo, entregue à Procuradoria para análise.

2. Mérito:

De fato, a norma insculpida no art. 94 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba prevê que cabe ao Presidente do Legislativo a prerrogativa de devolver ao autor as proposições manifestadamente inconstitucionais ou ilegais (art. 94, §1º). O mesmo controle já é exercido no âmbito da Câmara dos Deputados, com base em seu Regimento Interno (art. 137, §1º), e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI) e foi replicado em diversos outros regimentos internos de outros parlamentos brasileiros.

A própria doutrina jurídica prevê o instituto do controle de constitucionalidade político também chamado de controle preventivo, através de exame perfunctório pela Presidência da Mesa Diretora. A devolução será efetivada mediante despacho fundamentado da Presidência, sempre indicando o artigo constitucional, da Lei Orgânica ou Regimental violado, garantido o direito do autor de recorrer dessa decisão ao Plenário, conforme o art. 94, parágrafo único do RI.

Constata-se que a matéria constante do Projeto de Lei do Legislativo nº 169/2023 de fato se insere no âmbito do interesse local, nos termos do artigo 30, I, da CF/88, portanto de competência legislativa do Município, ao qual ainda cabe suplementar a legislação federal e a estadual no que couber, por força do artigo 30, II, da CF/88. Também o inciso III do artigo 30 da CF/88 garante aos Municípios autonomia através da outorga de competência tributária:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

Luís Roberto Barroso destaca a autonomia municipal para se auto-organizar:

Ressalte-se, por oportuno, que a capacidade de auto-organização é, do ponto de vista formal, a mais relevante manifestação da autonomia às Unidades federadas e o poder de se estruturarem tal qual um Estado, gozando de titularidade de funções da mesma natureza daquelas que compõem o Estado federal.[1]

A lei tributária municipal será viável na medida em que conformar-se às diretrizes traçadas pela Constituição Federal. O próprio Código Tributário Nacional expressa a atribuição constitucional da competência tributária, compreendendo a competência legislativa do Município, conforme leciona o e. Ministro Luís Roberto Barroso:

Aos Municípios cabe decretar seus impostos, o que só podem fazer, obviamente, através de leis que, consequentemente, têm que emanar de seu poder legiferante. Elaboram, ainda, inúmeros preceitos regendo as mais diversas relações de âmbito local. Conclusivamente, então, podemos asseverar que, dentro dos limites fixados pela Constituição estadual e pela Lei Orgânica, possuem os Municípios capacidade para legislar sobre as matérias que lhes são especificamente afetadas.[2]

Também não incorre em inconstitucionalidade formal, visto que, ao não criar obrigações ou atribuições a órgãos públicos, não usurpa a esfera de competência do Poder Executivo Municipal prevista no art. 61 da Constituição Federal, tendo quanto a isso observado os requisitos formais do processo legislativo, além de não ultrapassar o disposto no art. 2º da CF/88 e art. 10 da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul quanto à separação dos Poderes do Estado.

O alcance material da norma diz respeito à matéria tributária no âmbito do Município, tendo o Supremo Tribunal Federal assentado entendimento acerca da possibilidade de autoria parlamentar de leis que tratam de matéria tributária:

Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. 2. Isenção tributária. Não observância dos parâmetros estampados na Lei de Responsabilidade Fiscal. Fundamento infraconstitucional autônomo. Enunciado 283. 3. Benefício fiscal. Lei instituidora. Iniciativa comum ou concorrente. Precedentes. 4. Agravo regimental ao qual se nega provimento. (ARE 642014 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 27/08/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-180 DIVULG 12-09-2013 PUBLIC 13-09-2013)

As matérias de competência e iniciativa reservada são rol taxativo na CF/88 e nas Constituições Estaduais e Leis Orgânicas, lecionando HELY LOPES MEIRELLES que:

Leis de iniciativa da Câmara ou, mais propriamente, de seus vereadores, são todas as que a lei orgânica municipal não reserva, expressa e privativamente, à iniciativa do prefeito. As leis orgânicas municipais devem reproduzir, dentre as matérias previstas nos arts. 61, §1º, e 165 da CF, as que se inserem no âmbito da competência municipal. São, pois, de iniciativa exclusiva do prefeito, como chefe do Executivo local, os projetos de lei que disponham sobre criação, estruturação e atribuição das secretarias, órgãos e entes da Administração Pública Municipal; matéria de organização administrativa e planejamento de execução de obras e serviços públicos; criação de cargos, funções ou empregos públicos na Administração direta, autárquica e fundacional do Município; o regime jurídico e previdenciário dos servidores municipais, fixação e aumento de sua remuneração; o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias, o orçamento anual e os créditos suplementares e especiais. Os demais projetos competem concorrentemente ao prefeito e á Câmara, na forma regimental. (grifo nosso)

 

As leis que dispõe sobre matéria tributária não se inserem dentre as de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, tendo os Tribunais firmado jurisprudência no sentido de que a competência para deflagrar o processo legislativo acerca da matéria é concorrente, dentre esses o Supremo Tribunal Federal e os Tribunais Estaduais:

Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. INICIATIVA LEGISLATIVA. MATÉRIA TRIBUTÁRIA. CONCORRÊNCIA ENTRE PODER LEGISLATIVO E PODER EXECUTIVO. LEI QUE CONCEDE ISENÇÃO. POSSIBILIDADE AINDA QUE O TEMA VENHA A REPERCUTIR NO ORÇAMENTO MUNICIPAL. RECURSO QUE NÃO SE INSURGIU CONTRA A DECISÃO AGRAVADA. DECISÃO QUE SE MANTÊM POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. 1. O recurso extraordinário é cabível contra acórdão que julga constitucionalidade in abstracto de leis em face da Constituição Estadual, quando for o caso de observância ao princípio da simetria. Precedente: Rcl 383, Tribunal Pleno, Rel. Min. Moreira Alves. 2. A iniciativa para início do processo legislativo em matéria tributária pertence concorrentemente ao Poder Legislativo e ao Poder Executivo (art. 61, § 1º, II, b, da CF). Precedentes: ADI 724-MC, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 15.05.92; RE 590.697-ED, Primeira Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Dje de 06.09.2011; RE 362.573-AgR, Segunda Turma, Rel. Min. Eros Grau, Dje de 17.08.2007). 3. In casu, o Tribunal de origem entendeu pela inconstitucionalidade formal de lei em matéria tributária por entender que a matéria estaria adstrita à iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, dada a eventual repercussão da referida lei no orçamento municipal. Consectariamente, providos o agravo de instrumento e o recurso extraordinário, em face da jurisprudência desta Corte. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF - AI: 809719 MG , Relator: Min. LUIZ FUX, Data de Julgamento: 09/04/2013, Primeira Turma, Data de Publicação: ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-078 DIVULG 25-04-2013 PUBLIC 26-04-2013)

 

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MATÉRIA TRIBUTÁRIA. COMPETÊNCIA CONCORRENTE. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE INICIATIVA. IMPROCEDÊNCIA. 1. Lei Complementar, de iniciativa parlamentar, que possibilita o parcelamento do ITBI e que não padece de vício de iniciativa e que não acarreta redução de receita passível de afrontar disposições constitucionais. 2. De fato, a iniciativa para início do processo legislativo em matéria tributária pertence concorrentemente ao Poder Legislativo e ao Poder Executivo (art. 61, § 1º, II, b, da CF). Precedentes: ADI 724-MC, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 15.05.92; RE 590.697-ED, Primeira Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Dje de 06.09.2011; RE 362.573-AgR, Segunda Turma, Rel. Min. Eros Grau, Dje de 17.08.2007; AI 809719 AgR, Rel. Min. Luis Fux, Primeira Turma, j. em 09/04/2013. ADI JULGADA IMPROCEDENTE. UNÂNIME. (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70059239814, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eugênio Facchini Neto, Julgado em 01/12/2015)

 

"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. MUNICÍPIO DE LENÇÓIS PAULISTA. LEI MUNICIPAL Nº 4.539/2013. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO FISCAL. INICIATIVA DE LEI EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA. COMPETÊNCIA COMUM OU CONCORRENTE. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO." (RE 858.644-AgR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe de 2/6/2015)

 

“ADI - LEI Nº 7.999/85, DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, COM A REDAÇÃO QUE LHE DEU A LEI Nº 9.535/92 - BENEFÍCIO TRIBUTÁRIO - MATÉRIA DE INICIATIVA COMUM OU CONCORRENTE - REPERCUSSÃO NO ORÇAMENTO ESTADUAL - ALEGADA USURPAÇÃO DA CLÁUSULA DE INICIATIVA RESERVADA AO CHEFE DO PODER EXECUTIVO - AUSÊNCIA DE PLAUSIBILIDADE JURÍDICA - MEDIDA CAUTELAR INDEFERIDA. - A Constituição de 1988 admite a iniciativa parlamentar na instauração do processo legislativo em tema de direito tributário. - A iniciativa reservada, por constituir matéria de direito estrito, não se presume e nem comporta interpretação ampliativa, na medida em que - por implicar limitação ao poder de instauração do processo legislativo - deve necessariamente derivar de norma constitucional explícita e inequívoca. - O ato de legislar sobre direito tributário, ainda que para conceder benefícios jurídicos de ordem fiscal, não se equipara - especialmente para os fins de instauração do respectivo processo legislativo - ao ato de legislar sobre o orçamento do Estado”.

A matéria proposta também não trata de lei orçamentária, mas meramente de matéria tributária, possuindo viabilidade quanto à iniciativa:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS DE DECISÃO MONOCRÁTICA. CONVERSÃO EM AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSO LEGISLATIVO. NORMAS SOBRE DIREITO TRIBUTÁRIO. INICIATIVA CONCORRENTE ENTRE O CHEFE DO PODER EXECUTIVO E OS MEMBROS DO LEGISLATIVO. POSSIBILIDADE DE LEI QUE VERSE SOBRE O TEMA REPERCUTIR NO ORÇAMENTO DO ENTE FEDERADO. IRRELEVÂNCIA PARA FINS DE DEFINIÇÃO DOS LEGITIMADOS PARA A INSTAURAÇÃO DO PROCESSO LEGISLATIVO. AGRAVO IMPROVIDO. I – A iniciativa de leis que versem sobre matéria tributária é concorrente entre o chefe do poder executivo e os membros do legislativo. II – A circunstância de as leis que versem sobre matéria tributária poderem repercutir no orçamento do ente federado não conduz à conclusão de que sua iniciativa é privativa do chefe do executivo. III – Agravo Regimental improvido” (STF, ED-RE 590.697-MG, 2ª Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 23-08-2011, v.u., DJe 06-09-2011).

2.1. Do cumprimento das exigências orçamentário-financeiras

Não obstante, a proposição deve levar em conta os preceitos estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal – LC 101/2000, notadamente em seu art. 14, que exige a elaboração de impacto orçamentário-financeiro acompanhando a proposição e que tenha sido prevista nas leis orçamentárias ou que esteja acompanhada de medidas de compensação por meio do aumento de receita:

Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições:

I - demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias;

II - estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

§ 1º A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado.

O mesmo preceito é norma constitucional disposta no art. 113 do ADCT, incluído pela EC nº 95/2016:

Art. 113. A proposição legislativa que crie ou altere despesa obrigatória ou renúncia de receita deverá ser acompanhada da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 95, de 2016)

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul – TJRS possui precedentes cristalinos acerca da necessidade de impacto, quando a propositura legislativa que disponha sobre renúncia a crédito tributário:

AÇÃO DIRETA DE INSCONSTITUCIONALIDADE. MUNICÍPIO DE MONTENEGRO. LEI MUNICIPAL No 6.615/2019 QUE CONCEDE DESCONTO NO IMPOSTO PREDIAL E TERRITORIAL URBANO. RENÚNCIA DE RECEITA FISCAL SEM ACOMPANHAMENTO DE ESTIMATIVA DE IMPACTO ORÇAMENTÁRIO E FINANCEIRO. - Tratando-se isenção de IPTU, a matéria é classificada como tributária, havendo competência concorrente entre os Poderes Legislativo e Executivo. Art. 61, II, ?b?, da Constituição Federal e art. 60 da Constituição Estadual - A propositura legislativa que disponha sobre renúncia a crédito tributário, deve ser acompanhada de estimativa de impacto orçamentário-financeiro, possibilitando averiguação da preservação do equilíbrio do orçamento - Ausente a estimativa de impacto orçamentário-financeiro, é de ser reconhecida a inconstitucionalidade da lei municipal, face a afronta ao art. 14 da Lei Complementar no 101/2000, art. 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, bem como ao art. 19 da Constituição Estadual. JULGARAM PROCEDENTE A AÇÃO. UNÂNIME.(Direta de Inconstitucionalidade, No 70082265372, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Matilde Chabar Maia, Julgado em: 27-11-2019) (TJ-RS - ADI: 70082265372 RS, Relator: Matilde Chabar Maia, Data de Julgamento: 27/11/2019, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 06/12/2019).

Obrigatória, logo, a juntada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que a política de benefícios deva entrar em vigor e nos dois seguintes, com a demonstração do atendimento ao disposto na LDO e, ao menos, de uma das seguintes condições:

1) comprovação de que essa renúncia ampliada foi considerada na Lei Orçamentária Anual – LOA vigente e de que não afetará as metas de resultados fiscais; ou

2) demonstração de medidas de compensação, no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois seguintes, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

 

A propósito do assunto, leia-se a Súmula Administrativa nº 1 da Procuradoria Jurídica da Câmara de Guaíba: “Os projetos de lei que visem conceder ou ampliar benefícios de natureza tributária, tais como isenções, anistias e remissões sobre tributos municipais, além dos demais constantes no § 1º do art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal, são da competência legislativa municipal e de iniciativa concorrente, demandando, contudo, a instrução com estimativa do impacto orçamentário-financeiro para o exercício em que deva entrar em vigor e nos dois seguintes, que comprove a compatibilidade com a Lei de Diretrizes Orçamentárias e, ao menos, uma das seguintes condições: a) prévia consideração da renúncia na receita da lei orçamentária vigente e não comprometimento das metas de resultados fiscais; b) existência de medidas de compensação pelo aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.” (Enunciado aprovado em 3/12/2019, no Expediente de Súmula Administrativa nº 001/2019).

2.2. DAS VEDAÇÕES ELEITORAIS

Deve-se ter em mente a importância de que a medida entre em vigor ainda em 2023 em observância quando à impossibilidade de conceder benefício fiscal em ano eleitoral, se não houver identidade do meio normativo concedido em outros exercícios financeiros anteriores, por força do art. 73, § 10, da Lei Federal nº 9.504/1997 – Lei Eleitoral.

O art. 73, § 10, da Lei Federal nº 9.504/1997, proíbe a distribuição gratuita de bens, valores e benefícios no ano em que se realizarem as eleições, salvo nas hipóteses expressamente excepcionadas:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

[...]

§ 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa.

 

Quanto a benefícios fiscais, concedidos mediante a redução total ou parcial do montante a pagar, decorrente do lançamento de tributos municipais, o Tribunal Superior Eleitoral entende pela caracterização da conduta vedada do citado art. 73, § 10, da Lei Eleitoral. Vejamos:

[...] a norma do §10 do art. 73 da Lei nº 9.504/1997 é obstáculo a ter-se, no ano das eleições, o implemento de benefício fiscal referente à dívida ativa do Município, bem como o encaminhamento à Câmara de Vereadores de projeto de lei, no aludido período, objetivando a previsão normativa voltada a favorecer inadimplentes. (TSE, Consulta nº 153169/DF, Rel. Min. Marco Aurélio Mendes de Farias Mello, D.J.E.28 out.2011) Não obstante, mais recentemente àquela Corte exarou a seguinte decisão: [...] A validade ou não de lançamento de Programa de Recuperação Fiscal (Refis) em face do disposto no art. 73, § 10, da Lei nº 9.504/1997 deve ser apreciada com base no quadro fático-jurídico extraído do caso concreto (TSE, Consulta nº 36815 – DF, Rel. Min. designado Gilmar Ferreira Mendes, j. 08/04/2015).

 

Quanto à isenção do IPTU em ano eleitoral, o Tribunal Superior Eleitoral já assentou entendimento de que evidenciadas a identidade do meio normativo e períodos concedidos em outros exercícios financeiros, como também o mesmo índice, já previsto no Código Tributário Municipal, tratando-se, pois, de mera repetição mediante critérios objetivos, não há que se falar em conduta vedada. É o que se extrai do recente Acórdão nº 27263, de 07/05/2019, do TSE no Recurso Eleitoral nº 16631:

ELEIÇÕES 2016. RECURSOS ELEITORAIS. REPRESENTAÇÃO. PREFEITO. VICE-PREFEITO. CONDUTAS VEDADAS AOS AGENTES PÚBLICOS. ART. 73, DA LEI 9.504/97. CONCESSÃO DE DESCONTO PARA PAGAMENTO DO IPTU (§10). NÃO-OCORRÊNCIA.  PRECEDENTE TSE. ANÁLISE FÁTICA. PRÁTICA REITERADA. PREVISÃO LEGAL DO ÍNDICE. CRITÉRIOS OBJETIVOS. VEICULAÇÃO DE PROPAGANDA INSTITUCIONAL VIA RESPECTIVO CARNÊ. INSUFICIÊNCIA.  CONTRATAÇÃO E DEMISSÃO DE SERVIDORES TEMPORÁRIOS (INCISO V). EXCEPCIONALIDADE NÃO-COMPROVADA. ILÍCITO CONFIGURADO. PUBLICIDADE INSTITUCIONAL. MANUTENÇÃO DE PLACA DE OBRA PÚBLICA NO PERÍODO VEDADO (INCISO VI, "B"). AUSÊNCIA DE PROVA. GASTOS COM PUBLICIDADE INSTITUCIONAL. NÃO-DEMONSTRAÇÃO. COMPROVAÇÃO E VALORES CORRESPONDENTES À MÉDIA. AFASTAMENTO. MANUTENÇÃO DA MULTA POR FUNDAMENTO DIVERSO. SOLIDARIEDADE RECONHECIDA. CASSAÇÃO DE DIPLOMAS INADEQUADA AO CASO. RECURSO PROVIDO EM PARTE. 1. Ao teor da Cta 368-15/DF, do Tribunal Superior Eleitoral, a análise de implementação de medidas de natureza fiscal com escopo no § 10, do art. 73, da Lei 9.504/1997, deve ser feita com vistas ao quadro fático-jurídico extraído do caso concreto. 2. Na situação sub judice a controvérsia refere-se ao desconto concedido para o pagamento em cota única aos contribuintes do IPTU, contudo, restaram evidenciadas a identidade do meio normativo e períodos concedidos em outros exercícios financeiros, como também o mesmo índice, já previsto no Código Tributário Municipal, tratando-se, pois, de mera repetição mediante critérios objetivos. 3. As circunstâncias expostas em conjunto com o entendimento da Corte Superior Eleitoral desconstituem a teoria de que a conduta foi casuística pelo período eleitoral. 4. Os carnês de IPTU, isoladamente, são extremamente frágeis para uma eventual configuração de propaganda institucional, mesmo porque se trata de uma das principais receitas tributárias do município, e, ainda que seja impositivo, é comum que os entes trabalhem com regras de marketing para conscientizar a importância do pagamento. 5. A simples nomenclatura de cargos pela legislação para a contração temporária não é suficiente, devendo ser avaliado os requisitos constitucionais inerentes à espécie: necessidade temporária e excepcional interesse público. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. 6. A par disso, as contratações em exame são, em sua maioria, atividades permanentes e não se interligam ao caráter de essencialidade diretamente à população, mas sim reflete a ausência de planejamento e/ou não atendimento da regra do concurso público. No âmbito eleitoral, ganha contornos ainda maiores, a fim de que a máquina pública não seja empregada como meio de favorecimento a determinado candidato, notadamente pelo equilíbrio do pleito. 7. Não estando os cargos contratados respaldados pela exceção contida na alínea d, do inciso V, do artigo 73 da Lei nº 9.504/97, impõe-se o reconhecimento da prática vedada. 8. Ausente a data de identificação da publicidade supostamente mantida em período vedado não é autorizada a presunção pelo simples fato de constar a data do término da obra. 9. Não comprovada a alegação de que todos os gastos apresentados com publicidade ocorreram durante o período eleitoral, bem como sendo estes compatíveis com a média dos anos anteriores, deve ser mantida a decisão que afastou a prática. 10. Recurso parcialmente provido para alterar apenas o fundamento, ante o reconhecimento da prática vedada do art. 73, inciso V, alínea d, da Lei 9.504/1997, mantendo, porém, a condenação solidária aos candidatos ao pagamento de multa no quantum arbitrado em primeiro grau, eis que compatível com os fatos. 11. Única infringência. Não-adequação a penalidade de cassação dos diplomas, nos termos do §4º, do art. 73, da Lei 9.504/1997, sendo suficiente a aplicação de multa. (Recurso Eleitoral nº 16631, ACÓRDÃO nº 27263 de 07/05/2019, Relator(a) ANTÔNIO VELOSO PELEJA JÚNIOR, Publicação: DEJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 2925, Data 22/05/2019, Página 2-4)

Nesse sentido, o art. 73, § 10, da Lei das Eleições proscreve a distribuição gratuita de bens, valores e benefícios no ano das eleições, excepcionando-se apenas os casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior.

[1] Barroso, Luís Roberto, Direito Constitucional Brasileiro: O Problema da Federação, Rio de Janeiro, p. 22.

[2] Barroso, Luís Roberto, op. Cit., pág. 76

3. Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula a manifestação das comissões permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria, em conclusão, entende que a viabilidade jurídica do Projeto de Lei do Legislativo nº 169/2022 está condicionada à instrução com estimativa do impacto orçamentário-financeiro para o exercício em que deva entrar em vigor e nos dois seguintes, que comprove a compatibilidade com a LDO e, pelo menos, uma das seguintes condições: 1) prévia consideração da renúncia de receita na lei orçamentária vigente e não comprometimento das metas de resultados fiscais; ou 2) existência de medidas de compensação pelo aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

Ademais, por força da Consulta TSE nº 36815 – DF, recomenda-se que sejam observadas as condições da propositura no que diz respeito à concessão de benefício fiscal em ano eleitoral – “a norma do §10 do art. 73 da Lei nº 9.504/1997 é obstáculo a ter-se, no ano das eleições, o implemento de benefício fiscal referente à dívida ativa do Município, bem como o encaminhamento à Câmara de Vereadores de projeto de lei, no aludido período”, excepcionando-se apenas os casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior.

É o parecer.

Guaíba, 20 de novembro de 2023.

 

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador Geral

OAB/RS 107.136

 

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20/11/2023 13:34:56
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