Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 066/2023
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 301/2023
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Institui o Sistema de Vídeo Cercamento Eletrônico do Município de Guaíba."

1. Relatório:

O Poder Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei do Executivo nº 066/2023 à Câmara Municipal, o qual “Institui o Sistema de Vídeo Cercamento Eletrônico do Município de Guaíba”. A proposta foi encaminhada à Procuradoria Jurídica para análise com fulcro no art. 72 do Regimento Interno.

2. Mérito:

Constata-se, preliminarmente, quanto à competência legislativa dos entes federados, que a matéria constante do Projeto de Lei do Executivo n.º 066/2023, de autoria do Pode Executivo Municipal, encontra-se inserida no âmbito de matérias de interesse local, tendo a CF/88 instituído para os Municípios uma competência genérica para legislar sobre assunto de interesse local e suplementar a legislação estadual e federal no que couber.

Efetivamente, a Constituição Federal de 1988 fortaleceu a autonomia dos municípios, no ensinamento de Celso Ribeiro Bastos, emprestando a estes entes quatro competências particularmente significativas:

  • auto-organização, através da existência de Lei Orgânica Municipal;
  • auto-governo, através da eleição de prefeito e vereadores;
  • faculdade normativa, através da capacidade de editar leis locais próprias ou legislação suplementar às leis estaduais e federais;
  • auto-administração ou auto-determinação, através da administração e prestação de serviços de interesse local.

Alexandre de Moraes traz lição lapidar quanto à competência municipal, considerando a primordial e essencial competência legislativa do município a possibilidade de auto-organizar-se através da edição de sua Lei Orgânica. As competências legislativas dos Municípios se evidenciam, ademais, pelo princípio da predominância do interesse local, o qual tem que ver com as peculiaridades e premências do ente em questão, configurando interesses específicos mais pontualmente atrelados às precisões particulares de cada município. O E. Min. Gilmar Ferreira Mendes trata do tema com particular ilustração:

As competências implícitas decorrem da cláusula do art. 30, I, da CF, que atribui aos Municípios ‘legislar sobre assuntos de interesse local’, significando interesse predominantemente municipal, já que não há fato local que não repercuta, de alguma forma, igualmente, sobre as demais esferas da Federação. Consideram-se de interesse local as atividades, e a respectiva regulação legislativa, pertinentes a transportes coletivos municipais, coleta de lixo, ordenação do solo urbano, fiscalização das condições de higiene de bares e restaurantes, entre outras.

O artigo 18 da Constituição Federal de 1988, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo “autonomia política”, sob o ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir a sua organização, legislação, a administração e o governo próprios.

A autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os municípios, é tratada no artigo 30 da Lei Maior, nos seguintes termos:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

O artigo 23 da Constituição Federal estabelece competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:

I - Zelar pela guarda da Constituição, das Leis e das Instituições democráticas e conservar o patrimônio público;

II –...

III - Proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos;

...

VI - Proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;

...

XII – Estabelecer e implantar política de educação para a segurança do trânsito.

Pela competência suplementar, compete ao município suplementar a legislação federal e estadual, no que couber, ou seja, o município pode suprir as omissões e lacunas da legislação federal e estadual, sem obviamente contraditá-las e ainda estabelecer normas que digam respeito às realidades específicas do Município. Tal competência se aplica também às matérias elencadas no artigo 23 da Constituição Federal.

Na mesma senda, o art. 9º, § 4º, da Lei Federal nº 13.675/2018 dispões expressamente sobre o dever dos municípios de implantar programas, ações e projetos de segurança pública, com liberdade de organização e funcionamento:

§ 4º Os sistemas estaduais, distrital e municipais serão responsáveis pela implementação dos respectivos programas, ações e projetos de segurança pública, com liberdade de organização e funcionamento, respeitado o disposto nesta Lei.

O Ministério da Justiça define o conceito de Segurança Pública como atividade pertinente aos órgãos estatais e à comunidade como um todo, realizada com o fito de proteger a cidadania, prevenindo e controlando manifestações da criminalidade e da violência, efetivas ou potenciais, garantindo o exercício  pleno da cidadania nos limites da lei.

É pertinente destacar trecho da ADPF 995, recentemente julgada pelo STF, que tratou sobre as guardas municipais integrarem, ademais, o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP):

As guardas municipais são reconhecidamente órgãos de segurança pública e aquelas devidamente criadas e instituídas integram o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP). (...) Nos termos da jurisprudência desta Corte (...), as guardas municipais, sob o aspecto material, exercem atividade típica de segurança pública, consubstanciada na proteção de bens, serviços e instalações municipais (CF/1988, art. 144, § 8º), e que se afigura essencial ao atendimento de necessidades inadiáveis da comunidade (CF/1988, art. 9º, § 1º).
[ADPF 995, rel. min. Alexandre de Moraes, j. 25-8-2023, P, Informativo STF1.105].

... referindo-se expressamente ao dever dos municípios de implantar programas, ações e projetos de segurança pública, com liberdade de organização e funcionamento (§ 4º do mesmo dispositivo).

Constata-se, ademais, que o Governo do Estado do Rio Grande do Sul institui o Programa “SEGURANÇA INTEGRADA COM OS MUNICÍPIOS – SIM/RS”, o qual exige, nos termos do proposto no art. 8º do PLE, sala de monitoramento integrado.

Está bem exercida, ademais, a iniciativa para a deflagração do processo legislativo, tratando a proposta de atos que cabem ao Poder Executivo Municipal, versando sobre a organização e o funcionamento da administração da segurança pública, sendo de iniciativa do Chefe do Poder Executivo Municipal, por força do art. 60, II, d e 82, VII, ambos da Constituição Estadual.

Quanto à matéria de fundo, portanto, não se verificam óbices, indo ao encontro das normas gerais estabelecidas pela legislação federal e estadual acerca do tema. Ressalta-se que a viabilidade das previsões contidas nos artigos 3º, art. 4º, §§ 2º e 5º e art. 8º, § 1º do PLE 066/2023 dependem de tais disposições estarem previstas no convênio ou termo de cooperação firmado com o Governo do Estado do Rio Grande do Sul.

Consoante se verificou nas peças orçamentárias (e.g. Lei Municipal nº 4.305/2022), a ação orçamentária que diz respeito ao videomonitoramento está prevista nas peças orçamentárias, nos termos da legislação que diz respeito às normas de Administração Financeira e Orçamentária.

3. Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria opina pela legalidade e pela regular tramitação do Projeto de Lei do Executivo nº 066/2023, por inexistirem vícios de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário.

É o parecer.

Guaíba, 10 de outubro de 2023.

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador-Geral

OAB/RS nº 107.136

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10/10/2023 11:39:51
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