PARECER JURÍDICO |
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"Altera a Lei Municipal nº 4.129/2022, cria funções gratificadas, altera cargos e dá outras providências." 1. Relatório:O Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 024/2023 à Câmara Municipal, que altera a Lei Municipal nº 4.129/2022. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pelo Presidente da Câmara Municipal para análise com fulcro no art. 94 do Regimento Interno. O parecer jurídico foi lançado no sentido da necessidade de juntada do documento de impacto orçamentário-financeiro exigido pelo art. 17 da LRF. O proponente apresentou substitutivo e anexou documentos à proposição legislativa, que retornou à Procuradoria para nova análise. 2. FUNÇÕES DA PROCURADORIA JURÍDICA:A Procuradoria Jurídica, órgão consultivo previsto no art. 3º da LM nº 3.687/2018, exerce as funções de assessoramento jurídico e de orientação da Mesa Diretora, da Presidência e dos setores legislativos, pela emissão de pareceres escritos e verbais, bem como de opiniões fundamentadas para a tomada de decisões, por meio de manifestações escritas e aconselhamentos. Trata-se de órgão público que, embora não detenha competência decisória, orienta juridicamente o gestor público e os setores legislativos, sem caráter vinculante. Os pareceres jurídicos são atos resultantes do exercício da função consultiva desta Procuradoria Jurídica, no sentido de alertar para eventuais inconformidades que possam estar presentes. Conforme leciona Hely Lopes Meirelles na obra Direito Administrativo Brasileiro, 41ª ed., Malheiros Editores: São Paulo, 2015, p. 204, “O parecer tem caráter meramente opinativo, não vinculando a Administração ou os particulares à sua motivação ou conclusões, salvo se aprovado por ato subsequente. Já, então, o que subsiste como ato administrativo não é o parecer, mas, sim, o ato de sua aprovação, que poderá revestir a modalidade normativa, ordinatória, negocial ou punitiva”. Desse modo, a função consultiva desempenhada por esta Procuradoria com base no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/2018 – que dispõe sobre a organização administrativa da Câmara Municipal de Guaíba – não é vinculante, motivo pelo qual é possível, se for o caso, que os agentes políticos formem suas próprias convicções em discordância com as opiniões manifestadas por meio do parecer jurídico. 3. MÉRITO:Em relação à competência, não há qualquer óbice à proposta. Conforme dispõe o artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, o artigo 6º, I, da Lei Orgânica do Município de Guaíba estabelece: “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local.” As modificações pretendidas sobre o quadro de pessoal do Poder Executivo se inserem, efetivamente, na definição de interesse local, já que compete a cada esfera da federação (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), no âmbito de cada poder constituído e das instituições autônomas, organizar seu quadro de cargos e sua política remuneratória, de modo que cabe ao Município de Guaíba adotar essa medida quanto aos seus servidores, nos termos do art. 30, inciso I, da CF/88. A iniciativa para a deflagração do processo legislativo, por sua vez, está adequada, pois o projeto apresentado trata da organização administrativa e do quadro de cargos do Poder Executivo, cuja iniciativa é privativa do Prefeito, à luz do art. 61, § 1º, inc. II, “a”, da CF/88, no art. 60, inc. II, “a”, da CE/RS e no art. 119, inc. I, da Lei Orgânica Municipal. No que diz respeito ao mérito, a proposição busca promover modificações no quadro de pessoal do Poder Executivo, criando-se e extinguindo-se funções gratificadas e cargos em comissão, na forma determinada pelos arts. 1º a 20 e pelo Anexo Único. Nesse ponto, a proposição é clara ao especificar quais cargos e funções está a criar e extinguir, sendo promovidas as seguintes modificações:
Ultrapassada essa etapa preliminar, recorda-se que, como decorrência do princípio da impessoalidade, o provimento de cargos e empregos públicos na Administração Pública exige, como regra, aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, conforme o art. 37, II, da CF/88. Excepcionalmente, entretanto, é possível a criação de cargos de provimento em comissão ou de funções gratificadas quando as demandas funcionais envolverem a direção, a chefia ou o assessoramento de órgãos e agentes públicos. Essa regra de exceção está inscrita no art. 37, inc. V, da CF/1988, que prevê: “as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento”. Considerando ser pressuposto das funções gratificadas e dos cargos em comissão o exercício de direção, chefia ou assessoramento de órgãos e servidores, há uma necessária relação de confiança entre o agente público e a autoridade nomeante, dirigindo-se as atribuições ao atendimento de demandas superiores da Administração Pública, sem o propósito de viabilizar a execução das atividades burocráticas, técnicas ou operacionais do Poder Público, reservadas aos servidores públicos efetivos. Tais pressupostos são indispensáveis para a validade jurídica das leis que instituam funções gratificadas ou cargos em comissão. Isso porque o não atendimento desses requisitos afronta a regra do concurso público (art. 37, II, da CF/88) e torna a lei materialmente inconstitucional desde o seu nascedouro. São vários os precedentes da jurisprudência nacional no sentido da inconstitucionalidade de leis que criaram funções de confiança ou cargos em comissão com atribuições incompatíveis com as de direção, chefia ou assessoramento de órgãos e agentes públicos, sendo pertinente destacar alguns deles:
O Chefe do Executivo argumenta que o projeto de lei visa à adequação e à criação de funções gratificadas, privativas de servidores efetivos, bem como remanejo de alguns cargos comissionados, de modo a atender às necessidades da Administração Pública, crescentes e dinâmicas. Afirmou, ainda, que é apenas através da rotina diária de trabalho que se evidenciam as carências e, a partir disso, podem-se adotar as medidas para adequar atribuições dos agentes públicos às novas necessidades, o que constitui verdadeiro dever do Poder Executivo. Por fim, expôs que, por meio da proposta legislativa, busca-se atingir a máxima eficiência das funções desempenhadas pela Administração Pública. Ressalta-se, novamente, que é condição inafastável da viabilidade jurídica da criação de cargos comissionados e de funções gratificadas que as suas atribuições representem tarefas de direção, chefia ou assessoramento, sendo inconstitucional a criação de tais cargos e funções para exercício de atividades burocráticas, técnicas ou típicas da Administração Pública, para as quais é exigida a realização de concurso público. Destaca-se, ainda no aspecto da juridicidade da proposta, que o Supremo Tribunal Federal definiu tese de repercussão geral acerca dos requisitos constitucionais para a criação de cargos comissionados (Tema nº 1.010), a seguir descritos:
Assim, além da compatibilidade das atribuições com as funções de direção, chefia ou assessoramento, necessário frisar que a viabilidade da criação de cargos comissionado fica condicionada à proporcionalidade da relação entre comissionados e efetivos no âmbito deste Município, bem como ao pressuposto da relação de confiança entre a autoridade nomeante e o servidor nomeado, que deflui da natureza de suas atribuições, que devem ser necessariamente descritas na própria lei de forma clara e objetiva. Além do atendimento da competência, da iniciativa e dos requisitos de constitucionalidade material acima expostos, o projeto que verse sobre a criação de cargos ou funções gratificadas deve demonstrar o cumprimento de requisitos de ordem orçamentária, previstos no artigo 169, § 1º, da CF/88, e nos artigos 15, 16, 17, 19, 20 e 22 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LC nº 101/2000). Prevê o artigo 169, caput e § 1º, da CF/88:
Na Lei de Responsabilidade Fiscal, preceituam os artigos 15 e 16, inc. I e II: Art. 15. Serão consideradas não autorizadas, irregulares e lesivas ao patrimônio público a geração de despesa ou assunção de obrigação que não atendam o disposto nos arts. 16 e 17.
Ainda, dispõe o art. 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal:
Além disso, estabelecem os artigos 19 e 20 da LC nº 101/00:
Por fim, o parágrafo único do art. 22 da LRF define limite prudencial sobre o qual incidem as despesas totais com pessoal na Administração Pública:
Conforme a estimativa de impacto orçamentário-financeiro, o impacto monetário refletirá somente as funções gratificadas, visto que os cargos comissionados serão compensados com a extinção de cargos comissionados de igual valor. Declarou-se haver autorização na Lei de Diretrizes Orçamentárias, com a indicação da classificação orçamentária por onde correrá a despesa, e informou-se o impacto no ano corrente e nos dois subsequentes. Quanto à dotação orçamentária, informou-se que a receita corrente líquida (RCL) para o exercício de 2023 é de R$ 421.230.974,82. A despesa total com pessoal projetada para o final do exercício, com o impacto, é de R$ 195.105.445,95, representando 46,32% da RCL, percentual abaixo do limite prudencial estabelecido pelo art. 22, parágrafo único, da LRF, que vedaria a instituição dos cargos comissionados e funções gratificadas. 4. Conclusão:Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa e não vinculante do parecer jurídico, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria Jurídica tece as seguintes considerações sobre o substitutivo ao Projeto de Lei do Executivo nº 024/2023: a) a competência legislativa e a iniciativa foram adequadamente atendidas, pois o assunto é de interesse local (art. 30, inciso I, da CF/88) e não extrapola competências de outros entes, sendo a proposta apresentada pelo Chefe do Poder Executivo, autoridade competente para definir o quadro de pessoal e a política remuneratória (art. 61, § 1º, II, “a”, da CF/88; art. 60, II, “a”, da CE/RS; art. 119, I, da LOM); b) nos termos do Tema nº 1.010 do STF, toda criação de cargos comissionados é excepcional e deve estar fundamentada na relação de confiança entre a autoridade nomeante e o servidor nomeado, tão somente para o exercício de funções de direção, chefia ou assessoramento, sendo vedada a criação de CCs ou FGs para o desempenho das tarefas burocráticas, técnicas ou típicas da Administração Pública, para as quais é reservado o concurso público como modalidade de admissão, devendo, ainda, haver uma relação de proporcionalidade numérica entre o quadro de comissionados e o de efetivos; c) no aspecto orçamentário-financeiro, a estimativa apresentada demonstra a origem dos recursos e as despesas aumentadas no ano corrente e nos dois subsequentes, além dos percentuais atingidos com a proposta, que não alcançam o limite prudencial estabelecido no parágrafo único do art. 22 da LRF; d) recomenda-se, por fim, a revisão da técnica legislativa, pois alguns dos cargos e funções gratificadas estão com nomes diversos nos artigos e no Anexo Único. É o parecer, salvo melhor juízo. Guaíba, 29 de maio de 2023. GUSTAVO DOBLER Procurador OAB/RS nº 110.114B Documento Assinado Digitalmente no padrão ICP-Brasil por:![]() 29/05/2023 16:47:14 |
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