PARECER JURÍDICO |
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"Altera a Lei Municipal nº 3.875/2020, a qual Regulamenta a concessão de vale-alimentação aos servidores ativos do Poder Legislativo Municipal de Guaíba e dá outras providências" 1. Relatório:A Mesa Diretora apresentou o Projeto de Lei do Legislativo nº 026/2023 à Câmara Municipal, objetivando alterar a Lei Municipal nº 3.875, de 19 de março de 2020, que regulamenta a concessão de vale-alimentação aos servidores ativos do Poder Legislativo Municipal de Guaíba. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência da Câmara para análise nos termos do art. 105 do Regimento Interno. 2. FUNÇÕES DA PROCURADORIA JURÍDICA:A Procuradoria Jurídica da Câmara de Guaíba, órgão consultivo com previsão no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18, exerce as funções de assessoramento jurídico e de orientação da Mesa Diretora, da Presidência da Casa e dos setores legislativos, através da emissão de pareceres escritos e verbais, bem como de opiniões fundamentadas objetivando a tomada de decisões, por meio de reuniões, de manifestações escritas e de aconselhamentos. Trata-se de órgão público que, embora não detenha competência decisória, orienta juridicamente o gestor público e os setores legislativos, sem caráter vinculante. Os pareceres jurídicos são atos resultantes do exercício da função consultiva desta Procuradoria Jurídica, no sentido de alertar para eventuais inconformidades que possam estar presentes. Conforme leciona Hely Lopes Meirelles na obra Direito Administrativo Brasileiro, 41ª ed., Malheiros Editores: São Paulo, 2015, p. 204, “O parecer tem caráter meramente opinativo, não vinculando a Administração ou os particulares à sua motivação ou conclusões, salvo se aprovado por ato subsequente. Já, então, o que subsiste como ato administrativo não é o parecer, mas, sim, o ato de sua aprovação, que poderá revestir a modalidade normativa, ordinatória, negocial ou punitiva”. Desse modo, a função consultiva desempenhada por esta Procuradoria com base no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18 – que dispõe sobre a organização administrativa da Câmara Municipal de Guaíba – não é vinculante, motivo pelo qual é possível, se for o caso, que os agentes políticos formem suas próprias convicções em discordância com as opiniões manifestadas por meio do parecer jurídico. 3. Mérito:3.1 Da viabilidade jurídica de concessão de vale-alimentação Inicialmente, deve-se mencionar que a Constituição Federal de 1988 (CF/88) não estabelece, expressamente, o recebimento de auxílios ou subsídios para a alimentação como um dos direitos sociais básicos do servidor público, como se percebe da leitura dos arts. 7º e 39, § 3º. Da mesma forma, no âmbito da iniciativa privada, não há qualquer vinculação constitucional ou legal que obrigue as empresas a concederem benefícios relacionados à alimentação do trabalhador, sendo tais vantagens conferidas por mera liberalidade ou por pactuação em instrumentos coletivos celebrados com o sindicato da categoria profissional, geralmente em acordos ou convenções coletivas de trabalho. Embora não haja obrigação constitucional ou legal de concessão de benefício relacionado à alimentação do servidor público, também não há óbice à sua instituição, desde que atendidos determinados parâmetros jurídicos. De início, é importante esclarecer que a concessão de auxílios para a alimentação dos servidores públicos pode materializar-se pelas seguintes modalidades: fornecimento de alimentos in natura, auxílio-alimentação, vale-refeição e vale-alimentação. Segundo o TCE/MT[1], “O auxílio-alimentação consiste em uma vantagem pecuniária, prevista em lei, conferida diretamente ao servidor público para subsidiar suas despesas com alimentação, quando este estiver em labor.” O vale-refeição “consiste em um documento ou cartão eletrônico/magnético que permite a troca de um valor ou crédito por refeições prontas, fornecidas em restaurantes ou similares, previamente credenciados.” O vale-alimentação, por outro lado, “representa um documento (tíquetes, vales, cupons) ou cartão eletrônico/magnético que permite a troca do valor nele inscrito ou creditado em produtos alimentícios vendidos por estabelecimentos credenciados (supermercados, panificadoras, mercearias ou similares)”. Por fim, o fornecimento in natura representa a entrega de produtos e gêneros alimentícios ou similares diretamente aos servidores públicos, sendo a “cesta básica” a forma mais comum de concessão do benefício. A diferença entre os institutos é pontual, porém relevante para a correta caracterização do objeto da proposição. Como se percebe, a proposição legislativa busca dispor sobre a concessão de vale-alimentação aos servidores do Legislativo Municipal, através da disponibilização de documento contendo créditos para a compra de mercadorias em estabelecimentos credenciados junto à empresa especializada já contratada. 3.2 Da adequação da espécie normativa e da iniciativa Para a instituição do benefício aos servidores públicos, faz-se necessária a promulgação de lei autorizativa em sentido estrito, não sendo outras espécies normativas adequadas para esse fim. Isso porque o inciso X do art. 37 da CF/88 dispõe que a remuneração dos servidores e o subsídio dos agentes políticos somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, incluindo-se o vale-alimentação no conceito amplo de remuneração para esse fim, como observa o TCE/SC, ainda que sua natureza seja indenizatória:
A respeito da iniciativa para a deflagração do processo legislativo, uma vez que o projeto propõe dispor sobre a concessão de vale-alimentação aos servidores municipais vinculados ao Legislativo, tem-se por correta a iniciativa da Mesa Diretora. Isso porque, a partir da Emenda Constitucional nº 19/1998, o inciso IV do art. 51 da CF/88 passou a prever que compete privativamente à Câmara dos Deputados a “iniciativa de lei para fixação da respectiva remuneração” dos cargos públicos da sua estrutura administrativa, regra também aplicável às câmaras municipais com base no princípio da simetria. Assim, muito embora o Poder Legislativo tenha autonomia para a criação de cargos por meio de resolução, a fixação da respectiva remuneração só é possível por meio de lei em sentido estrito, raciocínio extensível às vantagens pecuniárias como o vale-alimentação, que se insere no conceito amplo de remuneração e representa benefício que implica a realização de despesas públicas. A iniciativa legislativa é restrita à Mesa Diretora da Câmara Municipal, órgão diretivo dos trabalhos administrativos, conforme prevê expressamente o caput do art. 21 do Regimento Interno. 3.3 Dos critérios para a definição do valor Além da obrigatoriedade de lei em sentido estrito e da iniciativa legislativa privativa da Mesa Diretora da Câmara, a lei autorizativa do vale-alimentação aos servidores deve fixar critérios e regras isonômicas para a concessão do benefício, que não caracterizem tratamento privilegiado de um dado grupo de agentes em detrimento de outros, sem prejuízo da previsão de hipóteses nas quais o pagamento não será devido. Por essa razão, entende-se que, como regra, o valor deve ser isonômico entre os servidores públicos, até porque a verba é indenizatória e não remuneratória, só sendo admissíveis tratamentos diferenciados na exata medida da adequação de suas justificativas. Ainda, a fixação do valor do benefício deve respeitar os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, observando parâmetros equilibrados e passíveis de justificação, pois tais princípios têm matriz constitucional, pela ampliação do conceito de juridicidade para além da estrita legalidade, e exigem do agente político fidelidade a padrões adequados de conduta, representados também nos princípios da moralidade e da impessoalidade. 3.4 Das exigências orçamentário-financeiras Além do atendimento da competência e da iniciativa, o projeto que verse sobre a concessão de vantagens aos servidores públicos deve demonstrar o cumprimento de requisitos de ordem orçamentária, previstos no art. 169, § 1º, da CF/88, e na Lei Complementar Federal nº 101/00 – Lei de Responsabilidade Fiscal. Prevê o art. 169, caput e § 1º, da CF/88:
Em relação à prévia dotação orçamentária, a estimativa de impacto orçamentário e financeiro comprova que há recursos suficientes para o atendimento da despesa, sem que se atinjam os limites aplicáveis ao Poder Legislativo em âmbito municipal. Quanto à autorização específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias, presente a partir da leitura do art. 57, inciso I, da Lei Municipal nº 4.263, de 18 de novembro de 2022. Além disso, a estimativa do impacto orçamentário e financeiro contempla a previsão da classificação orçamentária por onde correrá a despesa, contendo declaração de que há previsão da despesa no orçamento e na programação financeira, com a demonstração do impacto no exercício corrente e nos dois posteriores, além da indicação dos percentuais de despesa e declaração de compatibilidade com as metas fiscais. Na Lei de Responsabilidade Fiscal, preceituam os artigos 15 e 16, inc. I e II:
A referidas exigências legais estão devidamente atendidas pela estimativa de impacto orçamentário e financeiro apresentada no projeto. Ainda, dispõe o artigo 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LC nº 101/00):
Quanto ao referido dispositivo, cabe reiterar que a estimativa de impacto orçamentário e financeiro apresenta a origem dos recursos para o custeio da despesa e contém as premissas e a metodologia de cálculo, comprovando-se, ainda, que a despesa criada não afetará as metas de resultados fiscais. A respeito da adequação da despesa aos limites constitucionais e da Lei Complementar nº 101/00, veja-se o disposto no artigo 29-A, inciso I, da CF/88:
No caso de Guaíba, a receita tributária e as transferências para o Município somaram, em 2022, o valor de R$ 337.669.051,93. Aplicados 7% para a fixação da despesa total do Poder Legislativo, chega-se ao limite de R$ 23.636.833,63, que não será atingido pela concessão do vale-alimentação, conforme estimativa de impacto orçamentário e financeiro. O artigo 29-A, § 1º, da CF/88 estabelece outro limite a ser observado:
Quanto ao referido limite, o impacto orçamentário-financeiro estabelece a projeção de despesa com folha de pagamento em R$ 13.793.029,78, alcançando 58,35% da receita do Poder Legislativo, o que não torna ilegal a despesa, considerando que o limite constitucional em análise é de 70%. Por fim, estabelecem os artigos 19 e 20 da LC nº 101/00:
Conforme a estimativa de impacto orçamentário-financeiro, a receita corrente líquida para o exercício de 2023 é de R$ 384.463.800,00, de modo que 6% desse valor resultaria no montante de R$ 23.067.828,00. A despesa total com pessoal projetada para o final do exercício é de R$ 13.793.029,78, representando 3,59% da receita corrente líquida. Portanto, não atingidos quaisquer dos limites previstos na CF/88 e na Lei Complementar nº 101/00 e apresentada a estimativa de impacto orçamentário-financeiro com as informações necessárias, tem-se por cumpridas as exigências de caráter financeiro para a deliberação parlamentar do Projeto de Lei do Legislativo nº 026/2023. [1] Disponível em: <https://www.tce.mt.gov.br/protocolo/documento/num/179345/ano/2015/numero_documento/146324/ano_documento/2015/hash/e7168953933308c0677d640e5cacaa6d>. 4. Conclusão:Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa e não vinculante do parecer jurídico, a Procuradoria opina pela legalidade e pela regular tramitação do Projeto de Lei do Legislativo nº 026/2023, por inexistirem vícios de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário. Guaíba, 28 de março de 2023. GUSTAVO DOBLER Procurador OAB/RS nº 110.114B Documento Assinado Digitalmente no padrão ICP-Brasil por:![]() 28/03/2023 20:39:39 |
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Documento publicado digitalmente por GUSTAVO DOBLER em 28/03/2023 ás 20:39:11. Chave MD5 para verificação de integridade desta publicação ea78ecd5bc0c566c193085c947052cfc.
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