Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 012/2023
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 056/2023
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Institui a Lei de Incentivo ao Artista Guaibense - LIAG, que dispõe sobre incentivo fiscal para realização de projetos culturais no município de Guaíba, o Programa de Apoio ao Artista e Técnicos de Guaíba - PROARTE - Guaíba, que consiste na finalidade de promover a aplicação de recursos financeiros decorrentes de incentivos a contribuintes e do Fundo Municipal de Cultura, e dá outras providências."

1. Relatório:

 O Poder Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 012/2023 à Câmara Municipal, o qual “Institui a Lei de Incentivo ao Artista Guaibense - LIAG, que dispõe sobre incentivo fiscal para realização de projetos culturais no município de Guaíba, o Programa de Apoio ao Artista e Técnicos de Guaíba - PROARTE - Guaíba, que consiste na finalidade de promover a aplicação de recursos financeiros decorrentes de incentivos a contribuintes e do Fundo Municipal de Cultura, e dá outras providências”. A proposição foi encaminhada à Procuradoria para análise nos termos do art. 105 do Regimento Interno. O proponente apresentou substitutivo, entregue à Procuradoria para análise.

2. Mérito:

Preliminarmente, constata-se que a matéria constante do Projeto de Lei do Executivo nº 012/2023 de fato se insere no âmbito do interesse local, nos termos do artigo 30, I, da CF/88, portanto de competência legislativa do Município, ao qual ainda cabe suplementar a legislação federal e a estadual no que couber, por força do artigo 30, II, da CF/88. Também o inciso III do artigo 30 da CF/88 garante aos Municípios autonomia através da outorga de competência tributária:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

Luís Roberto Barroso destaca a autonomia municipal para se auto-organizar:

Ressalte-se, por oportuno, que a capacidade de auto-organização é, do ponto de vista formal, a mais relevante manifestação da autonomia às Unidades federadas e o poder de se estruturarem tal qual um Estado, gozando de titularidade de funções da mesma natureza daquelas que compõem o Estado federal.[1]

A lei tributária municipal será viável na medida em que conformar-se às diretrizes traçadas pela Constituição Federal. O próprio Código Tributário Nacional expressa a atribuição constitucional da competência tributária, compreendendo a competência legislativa do Município, conforme leciona o e. Ministro Luís Roberto Barroso:

Aos Municípios cabe decretar seus impostos, o que só podem fazer, obviamente, através de leis que, consequentemente, têm que emanar de seu poder legiferante. Elaboram, ainda, inúmeros preceitos regendo as mais diversas relações de âmbito local. Conclusivamente, então, podemos asseverar que, dentro dos limites fixados pela Constituição estadual e pela Lei Orgânica, possuem os Municípios capacidade para legislar sobre as matérias que lhes são especificamente afetadas.[2]

Não é demasiado sublinhar que as leis que dispõe sobre matéria tributária não se inserem dentre as de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, tendo os Tribunais firmado jurisprudência no sentido de que a competência para deflagrar o processo legislativo acerca da matéria é concorrente, dentre esses o Supremo Tribunal Federal e os Tribunais Estaduais:

Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. INICIATIVA LEGISLATIVA. MATÉRIA TRIBUTÁRIA. CONCORRÊNCIA ENTRE PODER LEGISLATIVO E PODER EXECUTIVO. LEI QUE CONCEDE ISENÇÃO. POSSIBILIDADE AINDA QUE O TEMA VENHA A REPERCUTIR NO ORÇAMENTO MUNICIPAL. RECURSO QUE NÃO SE INSURGIU CONTRA A DECISÃO AGRAVADA. DECISÃO QUE SE MANTÊM POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. 1. O recurso extraordinário é cabível contra acórdão que julga constitucionalidade in abstracto de leis em face da Constituição Estadual, quando for o caso de observância ao princípio da simetria. Precedente: Rcl 383, Tribunal Pleno, Rel. Min. Moreira Alves. 2. A iniciativa para início do processo legislativo em matéria tributária pertence concorrentemente ao Poder Legislativo e ao Poder Executivo (art. 61, § 1º, II, b, da CF). Precedentes: ADI 724-MC, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 15.05.92; RE 590.697-ED, Primeira Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Dje de 06.09.2011; RE 362.573-AgR, Segunda Turma, Rel. Min. Eros Grau, Dje de 17.08.2007). 3. In casu, o Tribunal de origem entendeu pela inconstitucionalidade formal de lei em matéria tributária por entender que a matéria estaria adstrita à iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, dada a eventual repercussão da referida lei no orçamento municipal. Consectariamente, providos o agravo de instrumento e o recurso extraordinário, em face da jurisprudência desta Corte. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF - AI: 809719 MG , Relator: Min. LUIZ FUX, Data de Julgamento: 09/04/2013, Primeira Turma, Data de Publicação: ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-078 DIVULG 25-04-2013 PUBLIC 26-04-2013)

 

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MATÉRIA TRIBUTÁRIA. COMPETÊNCIA CONCORRENTE. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE INICIATIVA. IMPROCEDÊNCIA. 1. Lei Complementar, de iniciativa parlamentar, que possibilita o parcelamento do ITBI e que não padece de vício de iniciativa e que não acarreta redução de receita passível de afrontar disposições constitucionais. 2. De fato, a iniciativa para início do processo legislativo em matéria tributária pertence concorrentemente ao Poder Legislativo e ao Poder Executivo (art. 61, § 1º, II, b, da CF). Precedentes: ADI 724-MC, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 15.05.92; RE 590.697-ED, Primeira Turma, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Dje de 06.09.2011; RE 362.573-AgR, Segunda Turma, Rel. Min. Eros Grau, Dje de 17.08.2007; AI 809719 AgR, Rel. Min. Luis Fux, Primeira Turma, j. em 09/04/2013. ADI JULGADA IMPROCEDENTE. UNÂNIME. (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70059239814, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eugênio Facchini Neto, Julgado em 01/12/2015)

 

"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. MUNICÍPIO DE LENÇÓIS PAULISTA. LEI MUNICIPAL Nº 4.539/2013. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO FISCAL. INICIATIVA DE LEI EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA. COMPETÊNCIA COMUM OU CONCORRENTE. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO." (RE 858.644-AgR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe de 2/6/2015)

 

“ADI - LEI Nº 7.999/85, DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, COM A REDAÇÃO QUE LHE DEU A LEI Nº 9.535/92 - BENEFÍCIO TRIBUTÁRIO - MATÉRIA DE INICIATIVA COMUM OU CONCORRENTE - REPERCUSSÃO NO ORÇAMENTO ESTADUAL - ALEGADA USURPAÇÃO DA CLÁUSULA DE INICIATIVA RESERVADA AO CHEFE DO PODER EXECUTIVO - AUSÊNCIA DE PLAUSIBILIDADE JURÍDICA - MEDIDA CAUTELAR INDEFERIDA. - A Constituição de 1988 admite a iniciativa parlamentar na instauração do processo legislativo em tema de direito tributário. - A iniciativa reservada, por constituir matéria de direito estrito, não se presume e nem comporta interpretação ampliativa, na medida em que - por implicar limitação ao poder de instauração do processo legislativo - deve necessariamente derivar de norma constitucional explícita e inequívoca. - O ato de legislar sobre direito tributário, ainda que para conceder benefícios jurídicos de ordem fiscal, não se equipara - especialmente para os fins de instauração do respectivo processo legislativo - ao ato de legislar sobre o orçamento do Estado”.

A matéria proposta pretende instituir lei de incentivo apenas a pessoas jurídicas, art. 4º, III. Cabe sublinhar que a Lei Municipal nº 4.140/2022 aplica-se tanto a pessoas físicas e jurídicas.

Merece correção o art. 5º em relação ao previsto no art. 4º, II, visto que a redação do art. 5º faz referência apenas a pessoas jurídicas e o art. 4º, II, faz referência a pessoas jurídicas e físicas.

2.1. Do cumprimento das exigências orçamentário-financeiras

Não obstante, a proposição deve levar em conta os preceitos estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal – LC 101/2000, notadamente em seu art. 14, que exige a elaboração de impacto orçamentário-financeiro acompanhando a proposição e que tenha sido prevista nas leis orçamentárias ou que esteja acompanhada de medidas de compensação por meio do aumento de receita:

Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições:

I - demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias;

II - estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

§ 1º A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado.

O mesmo preceito é norma constitucional disposta no art. 113 do ADCT, incluído pela EC nº 95/2016:

Art. 113. A proposição legislativa que crie ou altere despesa obrigatória ou renúncia de receita deverá ser acompanhada da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 95, de 2016)

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul – TJRS possui precedentes cristalinos acerca da necessidade de impacto, quando a propositura legislativa que disponha sobre renúncia a crédito tributário:

AÇÃO DIRETA DE INSCONSTITUCIONALIDADE. MUNICÍPIO DE MONTENEGRO. LEI MUNICIPAL No 6.615/2019 QUE CONCEDE DESCONTO NO IMPOSTO PREDIAL E TERRITORIAL URBANO. RENÚNCIA DE RECEITA FISCAL SEM ACOMPANHAMENTO DE ESTIMATIVA DE IMPACTO ORÇAMENTÁRIO E FINANCEIRO. - Tratando-se isenção de IPTU, a matéria é classificada como tributária, havendo competência concorrente entre os Poderes Legislativo e Executivo. Art. 61, II, b, da Constituição Federal e art. 60 da Constituição Estadual - A propositura legislativa que disponha sobre renúncia a crédito tributário, deve ser acompanhada de estimativa de impacto orçamentário-financeiro, possibilitando averiguação da preservação do equilíbrio do orçamento - Ausente a estimativa de impacto orçamentário-financeiro, é de ser reconhecida a inconstitucionalidade da lei municipal, face a afronta ao art. 14 da Lei Complementar no 101/2000, art. 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, bem como ao art. 19 da Constituição Estadual. JULGARAM PROCEDENTE A AÇÃO. UNÂNIME.(Direta de Inconstitucionalidade, No 70082265372, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Matilde Chabar Maia, Julgado em: 27-11-2019) (TJ-RS - ADI: 70082265372 RS, Relator: Matilde Chabar Maia, Data de Julgamento: 27/11/2019, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 06/12/2019).

Obrigatória, logo, a juntada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que a política de benefícios deva entrar em vigor e nos dois seguintes, com a demonstração do atendimento ao disposto na LDO e, ao menos, de uma das seguintes condições:

1) comprovação de que essa renúncia ampliada foi considerada na Lei Orçamentária Anual – LOA vigente e de que não afetará as metas de resultados fiscais; ou

2) demonstração de medidas de compensação, no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois seguintes, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

 

A propósito do assunto, leia-se a Súmula Administrativa nº 1 da Procuradoria Jurídica da Câmara de Guaíba: “Os projetos de lei que visem conceder ou ampliar benefícios de natureza tributária, tais como isenções, anistias e remissões sobre tributos municipais, além dos demais constantes no § 1º do art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal, são da competência legislativa municipal e de iniciativa concorrente, demandando, contudo, a instrução com estimativa do impacto orçamentário-financeiro para o exercício em que deva entrar em vigor e nos dois seguintes, que comprove a compatibilidade com a Lei de Diretrizes Orçamentárias e, ao menos, uma das seguintes condições: a) prévia consideração da renúncia na receita da lei orçamentária vigente e não comprometimento das metas de resultados fiscais; b) existência de medidas de compensação pelo aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.” (Enunciado aprovado em 3/12/2019, no Expediente de Súmula Administrativa nº 001/2019).

Constata-se que foram previstos no PLDO, em seu anexo de Metas Fiscais – Estimativa e Compensação da Renúncia de Receita para o Exercício de 2023, R$ 250.000,00 em renúncia de receita para IPTU e ISS na forma de incentivo fiscal para incentivo à Cultura e ao Esporte. Nesse sentido foi incluído art. 18, parágrafo único no PLE, conferindo ao Secretário Municipal de Turismo e Cultura a prerrogativa de fixar o valor máximo de captação de projetos em cada segmento.

[1] Barroso, Luís Roberto, Direito Constitucional Brasileiro: O Problema da Federação, Rio de Janeiro, p. 22.

[2] Barroso, Luís Roberto, op. Cit., pág. 76

3. Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula a manifestação das comissões permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria, em conclusão, entende que a viabilidade jurídica do Projeto de Lei do Executivo nº 012/2023 visto que houve a instrução com estimativa do impacto orçamentário-financeiro para o exercício em que deva entrar em vigor e nos dois seguintes, comprovando a compatibilidade com a LDO e prévia consideração da renúncia de receita na lei orçamentária vigente e não comprometimento das metas de resultados fiscais.

Recomenda-se ainda que seja revista a redação da proposta, especialmente quanto aos artigos 1º (concordância verbal e nominal); que seja revista a redação dos artigos 4º e 8º, visto que ambos artigos tratam de forma esparsa de conceitos relativos ao projeto de lei; correção do art. 5º e art. 27, VII, em relação ao previsto no art. 4º, II, visto que a redação dos arts. 5º e 27, VII, faz referência apenas a pessoas jurídicas e o art. 4º, II, faz referência a pessoas jurídicas e físicas. É necessária a correção da numeração dos incisos do art. 12, visto que passam do inciso XXIII para o XIX; correção dos incisos do art. 27, visto que possui dois incisos VII.

 

Recomenda-se, ainda, que seja incluída previsão contendo o número de componentes da Comissão Julgadora de Projetos.

 

É necessária a correção da cláusula de vigência disposta no art. 42, para que esteja consoante a LC nº 95/98, que reserva a cláusula: “Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.” Também está incorreta a redação do art. 42 diante do art. 9º da referida LC 95/98, que dispõe: Art. 9º A cláusula de revogação deverá enumerar, expressamente, as leis ou disposições legais revogadas.

 

É o parecer.

Guaíba, 06 de março de 2023.

 

 

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador Geral

OAB/RS 107.136

Documento Assinado Digitalmente no padrão ICP-Brasil por:
ICP-BrasilFERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS:01902836022
06/03/2023 14:10:44
Documento publicado digitalmente por FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS em 06/03/2023 ás 14:10:19. Chave MD5 para verificação de integridade desta publicação 73cb249ba9becd9388113b59b0fba820.
A autenticidade deste poderá ser verificada em https://www.camaraguaiba.rs.gov.br/autenticidade, mediante código 155965.