Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 015/2023
PROPONENTE : Mesa Diretora
     
PARECER : Nº 047/2023
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Altera a Lei nº 3.635/2018 que “Dispõe sobre a classificação de cargos, fixa vencimentos do quadro de servidores do Legislativo Municipal e dá outras providências"

1. Relatório:

A Mesa Diretora apresentou o Projeto de Lei do Legislativo nº 015/2023 à Câmara Municipal, que altera a Lei Municipal nº 3.635/2018, que dispõe sobre a classificação de cargos, fixa vencimentos do quadro de servidores do Legislativo Municipal e dá outras providências. A proposta foi encaminhada a esta Procuradoria Jurídica para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno.

2. FUNÇÕES DA PROCURADORIA JURÍDICA:

A Procuradoria da Câmara de Guaíba, órgão consultivo previsto no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18, exerce as funções de assessoramento jurídico e de orientação da Mesa Diretora, da Presidência da Casa e dos setores legislativos, através da emissão de pareceres escritos e verbais, bem como de opiniões fundamentadas objetivando a tomada de decisões, por meio de manifestações escritas e de aconselhamentos. Trata-se de órgão público que, embora não detenha competência decisória, orienta juridicamente o gestor público e os setores legislativos, sem caráter vinculante.

Os pareceres jurídicos são atos resultantes do exercício da função consultiva desta Procuradoria Jurídica, no sentido de alertar para eventuais inconformidades que possam estar presentes. Conforme leciona Hely Lopes Meirelles na obra Direito Administrativo Brasileiro, 41ª ed., Malheiros Editores: São Paulo, 2015, p. 204, “O parecer tem caráter meramente opinativo, não vinculando a Administração ou os particulares à sua motivação ou conclusões, salvo se aprovado por ato subsequente. Já, então, o que subsiste como ato administrativo não é o parecer, mas, sim, o ato de sua aprovação, que poderá revestir a modalidade normativa, ordinatória, negocial ou punitiva.

Desse modo, a função consultiva desempenhada por esta Procuradoria com base no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18 – que dispõe sobre a organização administrativa da Câmara Municipal de Guaíba – não é vinculante, motivo pelo qual é possível, se for o caso, que os agentes políticos formem suas próprias convicções em discordância com as opiniões manifestadas por meio do parecer jurídico.

3. Mérito:

Inicialmente, verifica-se estar adequada a iniciativa para a deflagração do processo legislativo, uma vez que o projeto de lei apresentado trata da organização do quadro de servidores da Câmara Municipal, o que compete à Mesa Diretora, nos termos dos arts. 27, III, e 28, III, da Lei Orgânica e do art. 28 do Regimento Interno:

Art. 27. Compete à Câmara Municipal com a sanção do Prefeito:

[...]

III – legislar sobre a criação e extinção de cargos e funções do Município, bem como fixar e alterar vencimentos e outras vantagens pecuniárias;

Art. 28. À Câmara Municipal, privativamente, entre outras atribuições, compete:

[...]

III – organizar seus serviços administrativos e nomear ou demitir seus funcionários e assessores, fixando seus vencimentos;

Art. 28. Compete à Mesa Diretora, além de outras atribuições estabelecidas na Lei Orgânica, propor a criação de cargos, créditos e verbas, necessários aos serviços administrativos do Poder Legislativo, a fixação ou alteração dos respectivos vencimentos, obedecido o princípio da paridade.

Quanto à competência, não há qualquer óbice à proposta. Segundo o art. 30, I, da CF/88, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” Também fixa o art. 6º da LOM: “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local.”

Com efeito, a organização e estruturação do quadro de servidores do Legislativo Municipal são matérias de competência exclusiva da Câmara Municipal, como dispõe a LOM, cabendo a esta, por iniciativa da Mesa Diretora, a definição dos cargos públicos e o seu quantitativo, respeitados os comandos constitucionais.

A proponente busca realizar modificações na lei que estabelece o quadro de cargos do Poder Legislativo Municipal, justificando a medida com o propósito de modernizar e qualificar a estrutura hoje existente, de satisfazer o interesse público primário e de atender ao princípio constitucional da eficiência (art. 37, caput, da CF/88).

Da leitura da proposição, verificam-se as seguintes alterações: a) modificação da denominação e do requisito de provimento de escolaridade do cargo efetivo de Auxiliar de Apoio Administrativo, que passará a denominar-se “Analista Legislativo” e exigirá formação completa em ensino superior (art. 1º), permanecendo os atuais servidores do cargo enquadrados na carreira de ingresso de nível médio e os próximos, convocados por aprovação em concurso público, enquadrados na carreira de nível superior (art. 5º); b) criação de mais uma vaga do cargo efetivo de Analista Legislativo (ainda denominado de Auxiliar de Apoio Administrativo) e majoração do seu vencimento de R$ 3.768,30 para R$ 4.250,00 (art. 2º); c) revogação do § 7º do art. 6º, que veda o recebimento de gratificações por encargo pelos ocupantes de cargos em comissão e de funções de confiança (art. 3º); d) modificação do requisito de provimento de escolaridade da função gratificada de Coordenador de Recursos Humanos, que passará a exigir ensino superior completo (art. 4º).

Quanto à alteração da denominação e do requisito de escolaridade do cargo público efetivo de Auxiliar de Apoio Administrativo, deve-se avaliar as circunstâncias da medida proposta levando em consideração, principalmente, a jurisprudência nacional que veda o ingresso no serviço público por meio de provimento derivado.

Isso porque é pacífico na jurisprudência brasileira o entendimento de que, devido à regra constitucional do concurso público (art. 37, II, da CF/88) como meio de acesso ao serviço público, são inconstitucionais quaisquer modalidades que permitam a investidura de agente público em cargo que não integre a carreira para a qual tenha sido devidamente admitido. Em outras palavras, como já definiu o Supremo Tribunal Federal na Súmula Vinculante nº 43, não pode o agente público investir-se, sem prévia aprovação em concurso público, em cargo que não integra a sua carreira, valendo-se de meios interpostos de provimento derivado, não admitidos pela ordem jurídica.

Nesse sentido, há diversas e incontáveis decisões dos Tribunais Superiores declarando a inconstitucionalidade de leis que operam a chamada ascensão funcional de servidores, que ocorre quando se permite ao agente público o ingresso em um cargo distinto e mais qualificado do que aquele no qual tenha sido investido anteriormente, a exemplo do caso a seguir citado, em que o Supremo Tribunal Federal reconheceu a inconstitucionalidade de lei que transforma os cargos de agente administrativo judiciário, de ensino fundamental, em cargos de escrevente técnico judiciário, de nível médio, ambos do quadro do Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo (TJM/SP):

O Supremo Tribunal Federal (STF) declarou a inconstitucionalidade de lei paulista que transforma cargos de agente administrativo judiciário, de ensino fundamental, em cargos de escrevente técnico judiciário, de nível médio, ambos do quadro de pessoal do Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo (TJM-SP). A decisão unânime do Plenário foi tomada na sessão virtual encerrada no dia 16/9.

Autor da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6853, o procurador-geral República, Augusto Aras, questionava a validade da Lei Complementar estadual 1.284/2016, ao argumento de não ter sido observada a necessidade de realização de concurso público para acesso a cargos públicos, nos termos do artigo 37, inciso II, da Constituição Federal. Alegava que se trata de hipótese de ascensão funcional, vedada pelo texto constitucional e pela jurisprudência do STF.

A lei permite aos ocupantes do cargo de nível fundamental optarem pelo reenquadramento mediante simples requerimento e com a comprovação de terem concluído o ensino médio e o curso de capacitação específico oferecido pelo próprio TJM-SP.

O argumento que conduziu o voto do julgamento é no sentido de que o caso não reflete mera reestruturação administrativa, mas criação de cargo completamente distinto, que apresenta diferentes requisitos de ingresso, atribuições e remunerações, sendo vedado, pela Constituição Federal, o acesso a cargos efetivos sem a prévia realização de concurso público. Considerou a relatora, Min. Rosa Weber, que a lei tratou de, efetivamente, transferir servidores de um cargo para outro, em violação ao princípio da isonomia que determina a aferição de capacidade técnica mediante concursos públicos, tendo sido expressamente aplicada a Súmula Vinculante nº 43.

Entende-se, porém, que a proposição em análise não está a tratar de simples ascensão funcional, vedada pelo ordenamento jurídico. Isso porque as circunstâncias das alterações propostas não revelam qualquer modificação do conjunto de deveres e responsabilidades dos servidores envolvidos, que, na realidade, manterão todas as atribuições do cargo para o qual foram admitidos e o seu devido enquadramento.

Embora o Supremo Tribunal Federal já tenha decidido ser vedada a ascensão funcional de servidores de cargos de nível médio para nível superior (MS 23670, Relator(a): Min. Maurício Corrêa, Tribunal Pleno, julgado em 29/11/2001), também já entendeu, mais recentemente, na ADI nº 7.089, que inexiste qualquer vedação à reestruturação convergente de carreiras análogas, a exemplo da Lei Estadual nº 3.226/2008, do Estado de Amazonas, que, entre outros pontos, reclassificou cargos de escrivão e oficial de justiça para nível superior e encaminhou para extinção o cargo de escrevente:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 49 DA LEI 3.226/2008, DO ESTADO DO AMAZONAS, QUE REESTRUTURA A REMUNERAÇÃO DA CARREIRA EM EXTINÇÃO DE ESCREVENTE JURAMENTADO DO TJAM. VIOLAÇÃO DO ART. 37, II, DA CF. NÃO OCORRÊNCIA. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA IMPROCEDENTE. I – No julgamento da ADI 4.303/RN, de relatoria da Ministra Cármen Lúcia, o Plenário do Supremo Tribunal Federal entendeu que a reestruturação convergente de carreiras análogas não contraria o postulado do concurso público. II - Ao garantir aos detentores do cargo em extinção de Escrevente Juramentado, com diploma de bacharel em Direito, a possibilidade de integrar a tabela dos serviços jurisdicionais de Analista Judiciário II, o dispositivo questionado reestruturou a remuneração dos referidos servidores, valendo-se, para tanto, do mesmo parâmetro utilizado para aqueles que exercem atividades análogas, tais como Oficial de Justiça Avaliador, Leiloeiro e Contador de Foro. III - O art. 49 da Lei Estadual 3.226/2008 não promoveu a indesejada transposição de servidores ou o provimento por qualquer meio de cargos sem concurso público, não se observando a transformação do cargo de Escrevente Juramentado em Analista Judiciário II. IV - Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente. (ADI 7089, Relator(a): RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 16/05/2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-106 DIVULG 31-05-2022 PUBLIC 01-06-2022)

Ou seja, o próprio Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade da lei amazonense que alterou o requisito de escolaridade dos cargos de escrivão e de oficial de justiça, passando-os de nível médio para nível superior, porquanto tal medida visa ao aprimoramento da habilitação técnica do quadro de servidores, o que tem sustento no princípio da eficiência administrativa (art. 37, caput, da CF/88).

Na ADIn nº 4.303, em fevereiro de 2014, o Supremo Tribunal Federal já decidiu que lei pode passar a exigir nível superior para cargos públicos, aumentando por consequência a sua remuneração:

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. ART. 1º, CAPUT E § 1º DA LEI COMPLEMENTAR N. 372/2008 DO RIO GRANDE DO NORTE. 1. A reestruturação convergente de carreiras análogas não contraria o art. 37, inc. II, da Constituição da República. Logo, a Lei Complementar potiguar n. 372/2008, ao manter exatamente a mesma estrutura de cargos e atribuições, é constitucional. 2. A norma questionada autoriza a possibilidade de serem equiparadas as remunerações dos servidores auxiliares técnicos e assistentes em administração judiciária, aprovados em concurso público para o qual se exigiu diploma de nível médio, ao sistema remuneratório dos servidores aprovados em concurso para cargo de nível superior. 3. A alegação de que existiriam diferenças entre as atribuições não pode ser objeto de ação de controle concentrado, porque exigiria a avaliação, de fato, de quais assistentes ou auxiliares técnicos foram redistribuídos para funções diferenciadas. Precedentes. 4. Servidores que ocupam os mesmos cargos, com a mesma denominação e na mesma estrutura de carreira, devem ganhar igualmente (princípio da isonomia). 5. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada improcedente. (ADI 4303, Relator: Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 05/02/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-166 DIVULG 27-08-2014 PUBLIC 28-08-2014)

De acordo com a decisão, pode a lei estabelecer modificações na estrutura de cargos de nível médio para alcançar o sistema remuneratório dos servidores aprovados em cargo de nível superior, desde que, em especial, sejam mantidos e preservados os enquadramentos dos servidores já admitidos, de modo a não configurar espécie de provimento derivado ou de equiparação remuneratória, vedadas pela Constituição: “[...] 11. No caso vertente, entretanto, não se há falar em equiparação porque foram mantidos os cargos de assistente e de auxiliar técnico, estes com nível de exigência diferenciado, a partir de agora, para os novos concursos, mas são os mesmos cargos.

A medida adotada pela proponente observou tal exigência, pois, segundo o art. 5º do PLL nº 015/2023, “Os atuais servidores ocupantes do cargo de Analista Legislativo permanecerão enquadrados na carreira de ingresso de nível médio, inclusive para fins de futuras progressões, sendo que, para ingressos a partir da publicação desta lei, o ingresso no cargo de Analista Legislativo, enquadrar-se-á na carreira de nível superior.” Isto é, os servidores que atualmente ocupam o cargo de Auxiliar de Apoio Administrativo – que passará a ser denominado de Analista Legislativo – permanecerão enquadrados na carreira tal como classificados originalmente (nível médio), valendo a nova regra para os próximos servidores a serem admitidos por concurso público, a demonstrar que o caso não reflete hipótese de ascensão funcional, até porque mantidas as atribuições do cargo, que apenas receberá denominação mais compatível com as relevantes funções do Legislativo.

Ressalta-se, nessa mesma linha, o entendimento do DPM na Informação nº 282/2023, quando da análise da minuta do projeto de lei apresentado: “Extrai-se, portanto, que as decisões judiciais não autorizam a mera transposição do cargo de nível técnico para nível superior, mas sim admitem a alteração dos requisitos de ingresso de determinado cargo, cuja exigência surtirá efeitos a partir dos novos ingressos, não se aplicando aos servidores que atualmente estão titulando os cargos – situação que também poderia ser aplicada ao art. 5º do Projeto de Lei.

Também como destacado pela proponente, há vários exemplos de reestruturações de cargos por meio das quais se passou a exigir o nível de escolaridade superior para a admissão, de modo a satisfazer o interesse público:

Poder Judiciário:

- Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (TJ-CE) - Cargo: Oficial de Justiça, Lei Estadual n° 13.221/2002;

- Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte (TJ-RN) - Cargos: Assistente em Administração Judiciária e Auxiliar Técnico, Lei Complementar nº 372/2008;

- Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão - Cargo: Oficial de Justiça, Lei Estadual 8.772/2008;

- Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJ-GO) - Cargo: Técnico Judiciário, Lei Estadual nº 17.663/12;

- Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) - Cargo: Oficial de Justiça, Lei Complementar nº 1.273/15;

- Tribunal de Justiça do Estado de Roraima (TJ-RR) - Cargo: Oficial de Justiça.

Tribunais de Contas:

- Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (TCE-SC) - Cargos: Técnico em Atividades Administrativas e de Controle Externo, Lei Complementar nº 255/2004;

- Tribunal de Contas do Estado do Mato Grosso (TCE-MT) - Cargo: Técnico em Atividades Administrativas e de Controle Externo, Lei Estadual nº 10.182/2014.

Outros órgãos públicos:

- Polícia Civil do Distrito Federal – Cargos: Agente de Polícia, Escrivão de Polícia, Papiloscopista Policial e Agente Policial de Custódia, Lei nº 9.624/96;

- Secretaria da Fazenda do Estado do Mato Grosso (Sefaz-MT) - Cargo: Agente de Fiscalização e Arrecadação de Tributos Estaduais, Lei Complementar nº 98/2001;

- Secretaria da Fazenda do Estado do Amazonas (Sefaz-AM) - Cargos: Técnico da Receita e Técnico em Arrecadação de Tributos Estaduais. Lei Estadual n° 2.750/2002;

- Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro (PC-RJ) - Cargos: Inspetor, Oficial de Cartório Policial e Papiloscopista, Lei Estadual n° 4.020/2002;

- Receita Federal do Brasil (RFB) - Cargo: Técnico da Receita Federal, Lei Federal nº 10.593/2002;

- Polícia Civil do Estado do Mato Grosso (PC-MT) - Cargos: Escrivão e Investigador de Polícia, Lei Complementar nº 155/2004;

- Polícia Militar (PM-DF) - Cargo: Soldado, Lei Federal nº 11.143/2005;

- Polícia Civil do Estado do Maranhão (PC-MA) - Cargos: Escrivão, Inspetor e Agente, Lei Estadual nº 8.508/2006;

- Polícia Rodoviária Federal (PRF) - Cargo: Policial Rodoviário Federal, Lei Federal nº 11.784/2008;

- Polícia Militar do Estado de Santa Catarina (PM-SC) - Cargo: Soldado, Lei Complementar Estadual nº 454/2009.

Assim, desde que preservado o enquadramento dos servidores na carreira na qual foram admitidos (neste caso, de nível médio), como previsto pelo art. 5º, não há vedação à reestruturação do quadro de cargos públicos, com a exigência de requisitos mais qualificados de admissão, tal como a previsão do requisito de escolaridade de formação completa em ensino superior para os novos agentes, o que vai ao encontro do já citado princípio da eficiência, cujo potencial de alcance é maior com a fixação de maiores níveis de qualificação daqueles que buscam ingressar no serviço público.

Quanto à criação de mais uma vaga do cargo efetivo de Analista Legislativo (ainda denominado de Auxiliar de Apoio Administrativo) e majoração do seu vencimento básico de R$ 3.768,30 para R$ 4.250,00 (art. 2º), cabe esclarecer que a CF/88, nos seus arts. 51, IV, e 52, XIII, estabelece que compete à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal dispor sobre a criação, transformação ou extinção dos seus cargos, norma que é qualificada como de reprodução obrigatória e, dessa forma, é repetida ainda que implicitamente nas ordens jurídicas dos demais entes federados.

Reserva a CF/88, portanto, autonomia ao Poder Legislativo para a definição de seu quadro de pessoal, devendo a fixação dos padrões de vencimento e dos demais componentes do sistema remuneratório observar, conforme o art. 39, § 1º, (a) a natureza, o grau de responsabilidade e a complexidade dos cargos componentes de cada carreira, (b) os requisitos de investidura e (c) as peculiaridades do cargo.

No caso em análise, entende a Mesa Diretora que, devido às características do cargo de Auxiliar de Apoio Administrativo (que passará a ser denominado de Analista Legislativo), deve ser concedido reajuste remuneratório, o que, como já referido, encontra-se na esfera de sua autonomia, desde que atendidos os requisitos de ordem orçamentária e financeira previstos na CF/88 e na Lei de Responsabilidade Fiscal.

Nesse ponto, como bem tem ressaltado esta Procuradoria Jurídica, além do atendimento da competência e da iniciativa, o projeto que verse sobre a criação de cargos públicos ou sobre a estrutura de carreiras deve demonstrar o cumprimento de requisitos orçamentários previstos na CF/88 e na LRF. Prevê o art. 169 da CF/88:

Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.

§ 1º A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos, empregos e funções ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, só poderão ser feitas: (Renumerado do parágrafo único, pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

I – se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

II – se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

Em relação à prévia dotação orçamentária, ficou comprovado no impacto orçamentário que há recursos suficientes para o atendimento da despesa, sem que se atinjam os limites aplicáveis ao Poder Legislativo em âmbito municipal. Quanto à autorização específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias, verifica-se que há previsão no artigo 57, o que se comprova da leitura da Lei Municipal nº 4.263/2022:

Art. 57. O aumento da despesa com pessoal, em decorrência de quaisquer das medidas relacionadas no artigo 169, § 1º, da Constituição Federal, respeitados os limites previstos nos artigos 20 e 22, parágrafo único, da Lei Complementar nº 101/2000, e cumpridas as exigências previstas nos artigos 16, 17 e 21 do referido diploma legal, fica autorizado para:

I – conceder vantagens e aumentar a remuneração de servidores;

II – criar e extinguir cargos públicos e alterar a estrutura de carreiras;

III – prover cargos efetivos, mediante concurso público, bem como efetuar contratações por tempo determinado para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público, respeitada a legislação municipal vigente;

IV – prover cargos em comissão e funções de confiança.

Ainda, a estimativa do impacto orçamentário-financeiro contempla a previsão da classificação orçamentária por onde correrá a despesa, declaração de que existe previsão da despesa na LDO, demonstração do impacto no exercício corrente (2023) e nos dois posteriores, indicação dos percentuais de despesa e declaração de compatibilidade com as metas fiscais.

Na Lei de Responsabilidade Fiscal, preceituam os artigos 15 e 16, inc. I e II:

Art. 15. Serão consideradas não autorizadas, irregulares e lesivas ao patrimônio público a geração de despesa ou assunção de obrigação que não atendam o disposto nos arts. 16 e 17.

Art. 16. A criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa será acompanhado de:

I – estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subseqüentes;

II – declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias.

Tais exigências estão devidamente atendidas pela estimativa de impacto orçamentário-financeiro apresentada no projeto. Ainda, dispõe o artigo 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LC nº 101/00):

Art. 17. Considera-se obrigatória de caráter continuado a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios.

§ 1º Os atos que criarem ou aumentarem despesa de que trata o caput deverão ser instruídos com a estimativa prevista no inciso I do art. 16 e demonstrar a origem dos recursos para seu custeio.

§ 2º Para efeito do atendimento do § 1º, o ato será acompanhado de comprovação de que a despesa criada ou aumentada não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo referido no § 1º do art. 4º, devendo seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes, ser compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa.

§ 3º Para efeito do § 2º, considera-se aumento permanente de receita o proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

§ 4º A comprovação referida no § 2º, apresentada pelo proponente, conterá as premissas e metodologia de cálculo utilizadas, sem prejuízo do exame de compatibilidade da despesa com as demais normas do plano plurianual e da lei de diretrizes orçamentárias.

§ 5º A despesa de que trata este artigo não será executada antes da implementação das medidas referidas no § 2º, as quais integrarão o instrumento que a criar ou aumentar.

§ 6º O disposto no § 1º não se aplica às despesas destinadas ao serviço da dívida nem ao reajustamento de remuneração de pessoal de que trata o inciso X do art. 37 da Constituição.

§ 7º Considera-se aumento de despesa a prorrogação daquela criada por prazo determinado.

Quanto ao referido dispositivo legal, cabe repisar que a estimativa de impacto orçamentário-financeiro apresenta a origem dos recursos para seu custeio e contém premissas e metodologia de cálculo, não afetando os resultados das metas fiscais.

Portanto, visto que não serão atingidos quaisquer dos limites previstos na CF/88 e na Lei Complementar nº 101/00, tem-se por cumpridas as exigências de caráter financeiro para a regular tramitação do Projeto de Lei do Legislativo nº 015/2023.

Em relação à revogação do § 7º do art. 6º, que veda o recebimento de gratificações por encargo pelos ocupantes de cargos em comissão e de funções de confiança (art. 3º), trata-se de matéria que também compete à própria Câmara Municipal definir no âmbito de sua autonomia organizacional, respaldada pelo art. 28 da Lei Orgânica Municipal, nada havendo expressamente, na CF/88 ou em outro parâmetro de constitucionalidade, que vede a percepção de gratificação por encargo por titulares de cargos em comissão ou funções de confiança, desde que, obviamente, acumulem as suas funções de direção, chefia ou assessoramento com as tarefas decorrentes do encargo.

Por fim, no que concerne à alteração do requisito de escolaridade da função gratificada de Coordenador de Recursos Humanos, verifica-se que, de fato, como fundamentou a proponente, tal medida vai ao encontro de recomendações dos órgãos de controle no sentido do aprimoramento técnico das atividades de chefia, direção e assessoramento próprias das funções de confiança, de modo que as competências outorgadas reflitam, verdadeiramente, as atribuições inerentes à administração superior, as quais bem expressam a natureza jurídica dessas funções.

4. Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa e não vinculante do parecer jurídico, a Procuradoria opina pela legalidade e regular tramitação do Projeto de Lei do Legislativo nº 015/2023, por inexistirem vícios materiais ou formais manifestos que impeçam a sua deliberação em Plenário.

Guaíba, 23 de fevereiro de 2023.

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B

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