Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 002/2023
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 018/2023
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Dispõe sobre a concessão de até 35% (trinta e cinco por cento) de desconto para pagamento em parcela única do IPTU, exercício 2023."

1. Relatório:

O Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei do Executivo nº 002/23 à Câmara Municipal, objetivando dispor sobre a concessão de até 35% (trinta e cinco por cento) de desconto para pagamento em parcela única do IPTU, exercício 2023. A proposição foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência para análise nos termos do art. 105 do Regimento Interno. O parecer opinou pela legalidade e regular tramitação. Na sequência, os Vereadores Miguel Crizel e Carla Vargas apresentaram, separadamente, emendas à proposição, sendo encaminhadas a esta Procuradoria para parecer jurídico.

2. Mérito:

O presente parecer jurídico limita-se às emendas apresentadas pelo Ver. Miguel Crizel e pela Ver.ª Carla Vargas, na medida em que a análise jurídica referente à proposição como um todo já foi realizada anteriormente.

A respeito do assunto, não é vedada, em regra, a apresentação de emendas parlamentares a projetos de lei de iniciativa exclusiva do Chefe do Executivo, pois exercida previamente a iniciativa pelo Prefeito. Os limites para o exercício desse poder estão fixados, inicialmente, no artigo 63 da Constituição Federal, que prevê:

Art. 63. Não será admitido aumento da despesa prevista:

I – nos projetos de iniciativa exclusiva do Presidente da República, ressalvado o disposto no art. 166, § 3º e § 4º;

II – nos projetos sobre organização dos serviços administrativos da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, dos Tribunais Federais e do Ministério Público.

Na Constituição Estadual, a matéria é regulada pelo artigo 61, que estabelece:

Art. 61. Não será admitido aumento na despesa prevista:

I – nos projetos de iniciativa privativa do Governador, ressalvado o disposto no art. 152;

II – nos projetos sobre organização dos serviços administrativos da Assembléia Legislativa, dos Tribunais e do Ministério Público.

Por fim, na esfera municipal, refere o artigo 46-A da Lei Orgânica de Guaíba:

Art. 46-A Não será admitido aumento na despesa prevista:

I – nos projetos de iniciativa exclusiva do Prefeito;

II – nos projetos sobre organização dos serviços administrativos da Câmara Municipal. (Redação acrescida pela Emenda à Lei Orgânica nº 2/2017)

O mais importante, portanto, no caso de emendas parlamentares a projetos de iniciativa do Executivo, é que não ocorra o aumento da despesa prevista, uma vez que tal medida é capaz de prejudicar o erário público por não demonstrar a viabilidade econômico-financeira, interferindo, assim, na independência do Poder Executivo, gestor das contas públicas. Além disso, a jurisprudência pacífica defende que as emendas parlamentares devem guardar o grau de pertinência temática da proposta originária, isto é, não podem veicular matérias diferentes das previstas inicialmente, de modo a não desnaturá-las ou desconfigurá-las. Veja-se a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:

As normas constitucionais de processo legislativo não impossibilitam, em regra, a modificação, por meio de emendas parlamentares, dos projetos de lei enviados pelo chefe do Poder Executivo no exercício de sua iniciativa privativa. Essa atribuição do Poder Legislativo brasileiro esbarra, porém, em duas limitações: a) a impossibilidade de o parlamento veicular matérias diferentes das versadas no projeto de lei, de modo a desfigurá-lo; e b) a impossibilidade de as emendas parlamentares aos projetos de lei de iniciativa do Presidente da República, ressalvado o disposto no § 3º e no § 4º do art. 166, implicarem aumento de despesa pública (inciso I do art. 63 da CF). [ADI 3.114, rel. min. Ayres Britto, j. 24-8-2005, P, DJ de 7-4-2006.] = ADI 2.583, rel. min. Cármen Lúcia, j. 1º-8-2011, P, DJE de 26-8-2011.

No mesmo sentido, a jurisprudência do Tribunal de Justiça Gaúcho:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI MUNICIPAL N.º 4.620/2016, DO MUNICÍPIO DE URUGUAIANA. PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO. EMENDAS PARLAMENTARES. IMPOSSIBILIDADE DE AUMENTO DE DESPESA EM PROJETO DE INICIATIVA PRIVATIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO MUNICIPAL. 1. A Constituição Estadual, em seu art. 60, inc. II, delimita quais são as matérias cujas leis são de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, sendo tal dispositivo aplicável aos Municípios, por simetria. É inquestionável o cabimento das emendas parlamentares em projetos de lei de iniciativa reservada, porém, tais emendas devem guardar relação com a temática original da proposição e não podem implicar aumento de despesa, o art. 61, inc. I, da CE, também aplicável aos Municípios por simetria. [...] JULGARAM PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO FORMULADO NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. UNÂNIME. (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70072358336, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Rel.: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 07/08/2017)

Dito isso, passa-se à análise de cada emenda parlamentar apresentada.

A emenda protocolada pelo Ver. Miguel Crizel se revela inconstitucional porque, ao suprimir o § 1º do art. 2º (“O atraso no pagamento de alguma parcela acarretará a perda do desconto aplicado a mesma”), enseja aumento da despesa prevista e, ao mesmo tempo, desnatura o objetivo do projeto. Isso porque, se o atraso no pagamento da parcela não mais enseja a perda do desconto pelo pagamento parcelado, deve-se considerar que o Município reduzirá a sua arrecadação sobre as parcelas atrasadas, o que, inversamente, significa o aumento da despesa, vedado pelos dispositivos que tratam do poder de emenda do parlamentar. Além disso, se o atraso não mais enseja a perda do desconto, desnatura-se a proposição na medida em que a Administração Pública deverá conceder o desconto de 10% mesmo com o atraso no pagamento parcelado, deixando de alcançar o propósito do projeto, qual seja, o de incentivar o adimplemento das obrigações tributárias para garantir a arrecadação.

Em relação à emenda protocolada pela Ver.ª Carla Vargas, não se constata qualquer inconstitucionalidade, visto em momento algum traduzir aumento de despesas ao Executivo ou impertinência temática com a proposição. Com efeito, a emenda altera o art. 1º para conceder o desconto de 35% somente aos doadores de sangue ou de medula óssea que fizerem o pagamento do tributo até 31/03/2023, sendo que, aos não doadores, serão concedidos descontos de 30%, 25% ou 15%, a depender da data do pagamento. Como se nota, há uma redução na despesa, porque os potenciais beneficiários do desconto de 35% – doadores de sangue ou de medula óssea – formam grupo muito menor do que aquele previsto no projeto originário (todos os contribuintes), além do que se diminuíram as faixas de desconto para os demais contribuintes não doadores. Por fim, inquestionável a pertinência temática da emenda com a proposição, pois tratam da mesma matéria.

3. Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa e não vinculante do parecer jurídico, a Procuradoria opina pela inconstitucionalidade da emenda do Vereador Miguel Crizel e pela constitucionalidade da emenda da Vereadora Carla Vargas, ambas ao Projeto de Lei do Executivo nº 002/2023, pelos motivos expostos.

É o parecer, salvo melhor juízo.

Guaíba, 26 de janeiro de 2023.

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B

Documento Assinado Digitalmente no padrão ICP-Brasil por:
ICP-BrasilGUSTAVO DOBLER:02914216017
26/01/2023 13:17:30
Documento publicado digitalmente por GUSTAVO DOBLER em 26/01/2023 ás 13:16:33. Chave MD5 para verificação de integridade desta publicação 9f66db8573bb2dd106e8f5d3f06a9d35.
A autenticidade deste poderá ser verificada em https://www.camaraguaiba.rs.gov.br/autenticidade, mediante código 149296.