PARECER JURÍDICO |
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"Altera a Lei Municipal n.º 3.858, de 09 de Janeiro de 2020, ficando proibida a queima, soltura e manuseio de fogos de artifício e artefatos pirotécnicos de alto impacto sonoro, tecnicamente classificados como “Fogos de Estampido” e “Artigos Explosivos”." 1. Relatório:O Ver. Ale Alves apresentou o Projeto de Lei do Legislativo nº 002/2023 à Câmara Municipal, objetivando alterar a Lei Municipal nº 3.858, de 9 de janeiro de 2020, para proibir, no âmbito do Município de Guaíba, a queima, soltura e manuseio de fogos de artifício e artefatos pirotécnicos de alto impacto sonoro, tecnicamente classificados como “fogos de estampido” e “artigos explosivos”. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno. 2. Mérito:De fato, a norma inscrita no art. 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal outorga ao Presidente do Legislativo a possibilidade de devolução ao autor de proposições maculadas por manifesta inconstitucionalidade (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou de caráter pessoal (art. 105, III). Solução similar é encontrada no Regimento Interno da Câmara dos Deputados (art. 137, § 1º) – parlamento em que o controle vem sendo exercido –, no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI – em que a solução é o arquivamento) e em diversos outros regimentos de casas legislativas pátrias. A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como o instituto do controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame superficial pela Presidência da Mesa Diretora, considerado controle preventivo de constitucionalidade interno, antes que a proposição possa percorrer o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução se perfaz por despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único). O artigo 18 da Constituição Federal de 1988, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo “autonomia política”, sob o ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir sua organização, legislação, administração e governo próprios. A autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios, é tratada no artigo 30 da Lei Maior, nos seguintes termos:
A regulamentação que se pretende instituir se insere, efetivamente, na definição de interesse local, além de revestir-se do caráter de norma suplementar à legislação estadual. Isso porque o PLL nº 002/2023, além de veicular matéria de relevância para o Município, não atrelada às competências privativas da União (art. 22 da CF/1988), estabelece a proibição de queima e soltura de fogos de artifício e artigos pirotécnicos com estampidos, assim como de quaisquer artefatos pirotécnicos festivos de efeito sonoro ruidoso no âmbito do Município de Guaíba, normativa até mesmo mais rígida do que a estadual (Lei Estadual nº 15.366, de 5 de novembro de 2019), que proíbe a queima e a soltura de fogos de artifício com estampido que ultrapassem a faixa de 100 decibéis a uma distância de 100 metros de sua deflagração. Em relação ao ponto, verifica-se que, segundo a jurisprudência predominante no Supremo Tribunal Federal, não há qualquer vedação a que os Municípios legislem de maneira mais rigorosa do que os demais entes federados (Estados e União), desde que com o propósito de garantir uma maior proteção ao meio ambiente, solução tida como harmoniosa com o ordenamento jurídico pela aplicação do critério da norma mais favorável ao meio ambiente (in dubio pro ambiente):
Deve-se considerar, portanto, que, diante do dever de os Municípios também promoverem adequadas condições de qualidade ambiental, presente a sua competência para legislar sobre o tema, até mesmo de maneira mais rigorosa do que a regulação dos demais entes federados. Nesse sentido, a respeito da competência suplementar dos Municípios para legislar sobre a proteção e a defesa do meio ambiente, veja-se a esclarecedora lição de Paulo Bessa Antunes, um dos maiores expoentes do Direito Ambiental:
Assim sendo, com fundamento no critério da norma ambiental mais favorável (in dubio pro ambiente), pode o Município de Guaíba fixar regramento mais restritivo e protetor da qualidade ambiental, sem incidir em inconstitucionalidade formal, ainda que a Lei Estadual nº 15.366/19 proíba a queima e soltura de fogos de artifício e artigos pirotécnicos com estampido apenas acima de 100 decibéis. No que diz respeito à iniciativa para deflagrar o processo legislativo, as hipóteses de iniciativa privativa do Poder Executivo, que poderiam limitar o poder de iniciativa dos Vereadores, estão expressamente previstas na Constituição Federal, aplicadas por simetria aos Estados e Municípios. Dispõe o artigo 61, § 1º, da CF:
Para os fins do direito municipal, mais relevante ainda é a observância das normas previstas na Constituição Estadual no que diz respeito à iniciativa para o processo legislativo, uma vez que, em caso de eventual controle de constitucionalidade, o parâmetro para a análise da conformidade vertical se dá em relação ao disposto na Constituição Gaúcha, conforme preveem o artigo 125, § 2º, da CF/88 e artigo 95, XII, alínea “d”, da CE/RS. Nesse caso, refere o artigo 60 da Constituição Estadual:
No âmbito municipal, o artigo 119 da Lei Orgânica, à semelhança do artigo 60 da Constituição Estadual, faz reserva de iniciativa aos projetos de lei sobre certas matérias:
Verifica-se, no caso, que não há qualquer limitação constitucional à propositura de projeto de lei por Vereador versando sobre a matéria tratada, tendo em vista que os dispositivos constitucionais não estabelecem a reserva de iniciativa para o tema. Quanto à matéria de fundo, também não há qualquer óbice à proposta. Convém lembrar que o objetivo primordial do Projeto de Lei do Legislativo nº 002/2023 é promover a proteção dos animais enquanto componentes do meio ambiente natural, assim como garantir a tranquilidade e o sossego da população de Guaíba, tarefas que constituem deveres do Poder Público e que, portanto, fundamentam a legitimidade da vedação proposta no projeto de lei. A proposição, notadamente, também versa sobre poder de polícia e posturas municipais, matérias sobre as quais os Municípios podem legislar (art. 13, inc. I, da CE/RS) visando à garantia dos interesses legítimos da coletividade. 3. Conclusão:Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa e não vinculante do parecer jurídico, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria opina pela legalidade e regular tramitação do Projeto de Lei do Legislativo nº 002/2023, por inexistirem vícios formais ou materiais que impeçam a sua deliberação em Plenário. É o parecer, salvo melhor juízo. Guaíba, 6 de janeiro de 2023. GUSTAVO DOBLER Procurador OAB/RS nº 110.114B Documento Assinado Digitalmente no padrão ICP-Brasil por:![]() 06/01/2023 14:31:16 |
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Documento publicado digitalmente por GUSTAVO DOBLER em 06/01/2023 ás 14:31:02. Chave MD5 para verificação de integridade desta publicação 5adb65f0954af87e01d5f4d1c7c79375.
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