PARECER JURÍDICO |
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"Altera as Leis Municipais 4.129/2022 e 4130/2022, cria a Secretaria Municipal de Políticas para Mulheres, Família e Direitos Humanos e dá outras providências." 1. Relatório:O Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 084/2022 à Câmara Municipal, que altera as Leis Municipais nº 4.129/2022 e 4.130/2022, dispondo sobre os quadros de pessoal do Poder Executivo do Município de Guaíba. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pelo Presidente da Câmara para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno. 2. FUNÇÕES DA PROCURADORIA JURÍDICA:A Procuradoria Jurídica da Câmara de Guaíba, órgão consultivo com previsão no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18, exerce as funções de assessoramento jurídico e de orientação da Mesa Diretora, da Presidência da Casa e dos setores legislativos, através da emissão de pareceres escritos e verbais, bem como de opiniões fundamentadas objetivando a tomada de decisões, por meio de reuniões, de manifestações escritas e de aconselhamentos. Trata-se de órgão público que, embora não detenha competência decisória, orienta juridicamente o gestor público e os setores legislativos, sem caráter vinculante. Os pareceres jurídicos são atos resultantes do exercício da função consultiva desta Procuradoria Jurídica, no sentido de alertar para eventuais inconformidades que possam estar presentes. Conforme leciona Hely Lopes Meirelles na obra Direito Administrativo Brasileiro, 41ª ed., Malheiros Editores: São Paulo, 2015, p. 204, “O parecer tem caráter meramente opinativo, não vinculando a Administração ou os particulares à sua motivação ou conclusões, salvo se aprovado por ato subsequente. Já, então, o que subsiste como ato administrativo não é o parecer, mas, sim, o ato de sua aprovação, que poderá revestir a modalidade normativa, ordinatória, negocial ou punitiva”. Desse modo, a função consultiva desempenhada por esta Procuradoria com base no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/2018 – que dispõe sobre a organização administrativa da Câmara Municipal de Guaíba – não é vinculante, motivo pelo qual é possível, se for o caso, que os agentes políticos formem suas próprias convicções em discordância com as opiniões manifestadas por meio do parecer jurídico. 3. Mérito:Em relação à competência, não há qualquer óbice à proposta. Conforme dispõe o artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, o artigo 6º, I, da Lei Orgânica do Município de Guaíba refere que “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local.” A reestruturação que se pretende realizar sobre a organização e o quadro de pessoal do Poder Executivo se insere, efetivamente, na definição de interesse local, já que compete a cada esfera da federação (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), no âmbito de cada poder constituído e das instituições autônomas, promover a organização do seu quadro de cargos e da sua política remuneratória, de modo que cabe ao Município de Guaíba adotar essa medida quanto aos seus servidores, nos termos do art. 30, inciso I, da CF/88. A iniciativa para a deflagração do processo legislativo, por sua vez, está adequada, pois o projeto apresentado trata da organização administrativa e do quadro de cargos do Poder Executivo, cuja iniciativa é privativa do Prefeito, à luz do art. 61, § 1º, inc. II, “a”, da CF/88, no art. 60, inc. II, alínea “a”, da CE/RS e no art. 119, inc. I, da Lei Orgânica Municipal. No que diz respeito ao mérito, a proposição busca promover adequações em sua organização administrativa, para o fim de instituir a Secretaria Municipal de Políticas para Mulheres, Família e Direitos Humanos, criando-se o respectivo cargo público de Secretário Municipal; para extinguir a atual Coordenadoria Municipal da Mulher, instituída pela Lei Municipal nº 3.891/2020; para alterar as competências da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana; e também para criar, alterar e extinguir cargos em comissão e funções gratificadas no quadro de pessoal do Poder Executivo, previsto na Lei Municipal nº 4.129/2022. Nesse ponto, necessário afirmar que a proposição não é suficientemente clara por não ter especificado, nem mesmo brevemente, quais cargos e funções está a criar, alterar ou extinguir, o que, sem sombra de dúvidas, prejudica o exame de mérito por parte dos Vereadores, aos quais compete avaliar as mudanças pretendidas à luz do interesse público. Em outras palavras, ainda que a submissão das propostas legislativas em reuniões extraordinárias seja, de fato, prerrogativa do Chefe do Executivo – o que não se está a questionar –, certo é que a falta de detalhamento, na exposição de motivos, acerca das modificações pretendidas no quadro de pessoal dificulta sobremaneira a análise pelos agentes envolvidos, especialmente pelos que estão no Poder Legislativo, que precisam, em curto prazo e de forma temerária, identificar, por um exercício penoso de comparação, quais cargos e funções estão sendo criados, alterados e extintos, para que se tenha real conhecimento do objeto da proposição apresentada pelo Poder Executivo. Dito isso, considerando que a proposição não especifica, em momento algum, os cargos e funções que está criando, alterando ou extinguindo, procedeu-se a uma precária análise comparativa entre os quadros atuais da Lei Municipal nº 4.129/2022 e aqueles propostos no Projeto de Lei do Executivo nº 084/2022, identificando-se as seguintes modificações:[1]
Salienta-se, novamente, que os dados identificados não são oficiais e expressam a simples tentativa de alcançar a informação sobre os cargos e funções que estão sendo criados, alterados e extintos. Caso haja interesse das comissões permanentes pela identificação oficial das mudanças propostas, sugere-se a busca por esclarecimentos junto ao Poder Executivo. Ultrapassada essa etapa preliminar, esclarece-se que, como decorrência do princípio constitucional da impessoalidade, o provimento de cargos e empregos públicos na Administração Pública exige, como regra, a aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma do inciso II do art. 37 da CF/88. Excepcionalmente, entretanto, é possível a criação de cargos de provimento em comissão ou de funções gratificadas quando as demandas funcionais envolverem a direção, a chefia ou o assessoramento de órgãos e agentes públicos. Essa regra de exceção está inscrita no art. 37, inc. V, da CF/1988, que prevê: “as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento”. Considerando ser pressuposto das funções gratificadas e dos cargos em comissão o exercício de direção, chefia ou assessoramento de órgãos e servidores, há uma necessária relação de confiança entre o agente e a autoridade a quem se subordina hierarquicamente, dirigindo-se as atribuições ao atendimento de demandas superiores da Administração Pública, sem o propósito de viabilizar a execução de tarefas burocráticas, técnicas ou operacionais do Poder Público, reservadas aos servidores públicos efetivos. Tais pressupostos são indispensáveis para a validade jurídica das leis que instituam funções gratificadas ou cargos em comissão. Isso porque o não atendimento desses requisitos afronta a regra do concurso público (art. 37, II, da CF/88) e torna a lei materialmente inconstitucional desde o seu nascedouro. São vários os precedentes da jurisprudência nacional no sentido da inconstitucionalidade de leis que criaram funções de confiança ou cargos em comissão com a previsão de atribuições diversas das de direção, chefia ou assessoramento de órgãos e agentes públicos, sendo pertinente destacar alguns deles:
A Chefe do Executivo em exercício argumenta que o projeto de lei visa à adequação e à criação de funções gratificadas, privativas de servidores efetivos, bem como a ajustes pontuais nas atribuições de alguns cargos comissionados, de modo a conferir maior eficiência ao atendimento das demandas que são diariamente impostas aos diversos setores da Prefeitura do Município de Guaíba. Relata que é apenas a partir da rotina diária de trabalho que se evidenciam as carências e, assim, se torna possível planejar as medidas para adequar as atribuições dos agentes às novas necessidades. Isso posto, além da criação da Secretaria Municipal de Políticas para Mulheres, Família e Direitos Humanos, com o respectivo cargo público de Secretário Municipal, a proposição busca ajustar o quadro de pessoal e a organização administrativas às referidas demandas por atendimento, sendo proposta a criação e a extinção de cargos comissionados e de funções gratificadas, bem como a alteração do padrão de vencimento de determinadas funções, cuja relação não oficial consta neste parecer, dado que não houve detalhamento, na justificativa, sobre os cargos e funções criados/alterados/extintos. Haja vista a falta de informação oficial sobre os cargos criados/alterados/extintos, fica prejudicada a análise das atribuições dos cargos, considerando ser inviável a esta Procuradoria proceder ao exame de regularidade das atribuições de todos os cargos comissionados e funções gratificadas do Poder Executivo Municipal no tempo disponibilizado (129 páginas de atribuições constantes no Anexo I). Ressalta-se apenas que é condição inafastável da viabilidade jurídica da criação de cargos comissionados e de funções gratificadas que suas atribuições expressem tarefas de direção, chefia ou assessoramento, sendo inconstitucional a criação de tais cargos e funções para o exercício de atividades burocráticas, técnicas ou típicas da Administração Pública, para as quais é exigida a realização de concurso público. Por fim, ainda no aspecto da juridicidade da proposta, destaca-se que o Supremo Tribunal Federal (STF) definiu tese de repercussão geral acerca dos requisitos constitucionais para a criação de cargos comissionados (Tema nº 1.010), a seguir descritos:
Assim, além da compatibilidade das atribuições com as funções de direção, chefia ou assessoramento, necessário frisar que a viabilidade da criação de cargos comissionado fica condicionada à proporcionalidade da relação entre comissionados e efetivos no âmbito deste Município, bem como ao pressuposto da relação de confiança entre a autoridade nomeante e o servidor nomeado, que deflui da natureza de suas atribuições, que devem ser necessariamente descritas na própria lei de forma clara e objetiva. Além do atendimento da competência, da iniciativa e dos requisitos de constitucionalidade material acima expostos, o projeto que verse sobre a criação de cargos ou funções gratificadas deve demonstrar o cumprimento de requisitos de ordem orçamentária, previstos no artigo 169, § 1º, da CF/88, e dos artigos 15, 16, 17, 20 e 22 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LC nº 101/2000). Prevê o artigo 169, caput e § 1º, da CF/88:
Na Lei de Responsabilidade Fiscal, preceituam os artigos 15 e 16, inc. I e II:
Tais regras estão atendidas, visto que, além da previsão autorizativa dos arts. 25 e 26 da Lei de Diretrizes Orçamentárias (Lei Municipal nº 4.081/2021), houve a apresentação de estimativa de impacto orçamentário-financeiro contendo as informações necessárias. Ainda, dispõe o art. 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal:
Quanto ao disposto no art. 17 da LRF, cabe reiterar que a estimativa de impacto orçamentário-financeiro apresenta a origem dos recursos para o custeio da despesa e contém as premissas básicas, comprovando-se, ainda, que a despesa criada não afetará as metas de resultados fiscais. Além disso, estabelecem os artigos 19 e 20 da LC nº 101/00:
Segundo a estimativa de impacto orçamentário-financeiro, a receita corrente líquida prevista para o exercício é de R$ 381.983.010,36. A despesa total com pessoal projetada para o final do exercício é de R$ 181.248.908,64, representando 47,45% da receita corrente líquida, percentual abaixo do limite prudencial do art. 22, parágrafo único, da LRF:
Portanto, diante do impacto orçamentário-financeiro apresentado e da demonstração de não atingimento do limite prudencial previsto no art. 22, parágrafo único, da LRF, não há vedação de natureza financeira à medida proposta. [1] Ressalta-se que é possível ter passado despercebida alguma modificação dos quadros de pessoal, considerando o reduzido tempo para a análise e a extensão da relação de cargos e funções gratificadas. 4. Conclusão:Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa e não vinculante do parecer jurídico, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria Jurídica tece as seguintes considerações sobre o Projeto de Lei do Executivo nº 084/2022: a) a competência legislativa e a iniciativa foram adequadamente atendidas, visto que o assunto é de interesse local (art. 30, inciso I, da CF/88), não extrapolando competências de outros entes, e a proposta foi apresentada pelo Chefe do Executivo, autoridade competente para definir o quadro de pessoal e a política remuneratória do ente (art. 61, § 1º, II, “a”, da CF/88; art. 60, II, “a”, da CE/RS; art. 119, I, da LOM); b) diante da falta de informação oficial sobre os cargos criados/alterados/extintos, tendo sido realizada, por esta Procuradoria, uma análise comparativa não oficial dos quadros atuais da legislação e os propostos no PLE nº 084/2022 apenas para efeito de informação sobre as mudanças buscadas, fica prejudicada a análise das atribuições dos cargos, considerando ser inviável a esta Procuradoria proceder ao exame de regularidade das atribuições de todos os cargos comissionados e funções gratificadas do Executivo Municipal no tempo disponibilizado (129 páginas de atribuições constantes no Anexo I); c) ressalta-se, entretanto, que, nos termos do Tema nº 1.010 do STF, toda a criação de cargos comissionados é excepcional e deve estar fundamentada na relação de confiança entre a autoridade nomeante e o servidor nomeado, tão somente para o exercício de funções de direção, chefia ou assessoramento, sendo vedada a criação de CCs ou FGs para o desempenho das tarefas burocráticas, técnicas ou típicas da Administração Pública, para as quais é reservado o concurso público como modalidade de admissão, devendo, ainda, haver uma relação de proporcionalidade numérica entre o quadro de comissionados e o de efetivos; d) no aspecto orçamentário-financeiro, foi apresentado o necessário documento de impacto exigido pela Lei de Responsabilidade Fiscal, que demonstra a origem dos recursos e os percentuais atingidos com medida, que não ultrapassam os limites legais de despesa com pessoal definidos pelos arts. 20 e 22 da Lei Complementar nº 101/00. É o parecer, salvo melhor juízo. Guaíba, 23 de dezembro de 2022. GUSTAVO DOBLER Procurador OAB/RS nº 110.114B Documento Assinado Digitalmente no padrão ICP-Brasil por:![]() 23/12/2022 18:47:45 |
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