Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 084/2022
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 450/2022
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Altera as Leis Municipais 4.129/2022 e 4130/2022, cria a Secretaria Municipal de Políticas para Mulheres, Família e Direitos Humanos e dá outras providências."

1. Relatório:

O Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 084/2022 à Câmara Municipal, que altera as Leis Municipais nº 4.129/2022 e 4.130/2022, dispondo sobre os quadros de pessoal do Poder Executivo do Município de Guaíba. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pelo Presidente da Câmara para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno.

2. FUNÇÕES DA PROCURADORIA JURÍDICA:

A Procuradoria Jurídica da Câmara de Guaíba, órgão consultivo com previsão no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18, exerce as funções de assessoramento jurídico e de orientação da Mesa Diretora, da Presidência da Casa e dos setores legislativos, através da emissão de pareceres escritos e verbais, bem como de opiniões fundamentadas objetivando a tomada de decisões, por meio de reuniões, de manifestações escritas e de aconselhamentos. Trata-se de órgão público que, embora não detenha competência decisória, orienta juridicamente o gestor público e os setores legislativos, sem caráter vinculante.

Os pareceres jurídicos são atos resultantes do exercício da função consultiva desta Procuradoria Jurídica, no sentido de alertar para eventuais inconformidades que possam estar presentes. Conforme leciona Hely Lopes Meirelles na obra Direito Administrativo Brasileiro, 41ª ed., Malheiros Editores: São Paulo, 2015, p. 204, “O parecer tem caráter meramente opinativo, não vinculando a Administração ou os particulares à sua motivação ou conclusões, salvo se aprovado por ato subsequente. Já, então, o que subsiste como ato administrativo não é o parecer, mas, sim, o ato de sua aprovação, que poderá revestir a modalidade normativa, ordinatória, negocial ou punitiva”.

Desse modo, a função consultiva desempenhada por esta Procuradoria com base no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/2018 – que dispõe sobre a organização administrativa da Câmara Municipal de Guaíba – não é vinculante, motivo pelo qual é possível, se for o caso, que os agentes políticos formem suas próprias convicções em discordância com as opiniões manifestadas por meio do parecer jurídico.

3. Mérito:

Em relação à competência, não há qualquer óbice à proposta. Conforme dispõe o artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, o artigo 6º, I, da Lei Orgânica do Município de Guaíba refere que “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local.”

A reestruturação que se pretende realizar sobre a organização e o quadro de pessoal do Poder Executivo se insere, efetivamente, na definição de interesse local, já que compete a cada esfera da federação (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), no âmbito de cada poder constituído e das instituições autônomas, promover a organização do seu quadro de cargos e da sua política remuneratória, de modo que cabe ao Município de Guaíba adotar essa medida quanto aos seus servidores, nos termos do art. 30, inciso I, da CF/88.

A iniciativa para a deflagração do processo legislativo, por sua vez, está adequada, pois o projeto apresentado trata da organização administrativa e do quadro de cargos do Poder Executivo, cuja iniciativa é privativa do Prefeito, à luz do art. 61, § 1º, inc. II, “a”, da CF/88, no art. 60, inc. II, alínea “a”, da CE/RS e no art. 119, inc. I, da Lei Orgânica Municipal.

No que diz respeito ao mérito, a proposição busca promover adequações em sua organização administrativa, para o fim de instituir a Secretaria Municipal de Políticas para Mulheres, Família e Direitos Humanos, criando-se o respectivo cargo público de Secretário Municipal; para extinguir a atual Coordenadoria Municipal da Mulher, instituída pela Lei Municipal nº 3.891/2020; para alterar as competências da Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana; e também para criar, alterar e extinguir cargos em comissão e funções gratificadas no quadro de pessoal do Poder Executivo, previsto na Lei Municipal nº 4.129/2022.

Nesse ponto, necessário afirmar que a proposição não é suficientemente clara por não ter especificado, nem mesmo brevemente, quais cargos e funções está a criar, alterar ou extinguir, o que, sem sombra de dúvidas, prejudica o exame de mérito por parte dos Vereadores, aos quais compete avaliar as mudanças pretendidas à luz do interesse público.

Em outras palavras, ainda que a submissão das propostas legislativas em reuniões extraordinárias seja, de fato, prerrogativa do Chefe do Executivo – o que não se está a questionar –, certo é que a falta de detalhamento, na exposição de motivos, acerca das modificações pretendidas no quadro de pessoal dificulta sobremaneira a análise pelos agentes envolvidos, especialmente pelos que estão no Poder Legislativo, que precisam, em curto prazo e de forma temerária, identificar, por um exercício penoso de comparação, quais cargos e funções estão sendo criados, alterados e extintos, para que se tenha real conhecimento do objeto da proposição apresentada pelo Poder Executivo.

Dito isso, considerando que a proposição não especifica, em momento algum, os cargos e funções que está criando, alterando ou extinguindo, procedeu-se a uma precária análise comparativa entre os quadros atuais da Lei Municipal nº 4.129/2022 e aqueles propostos no Projeto de Lei do Executivo nº 084/2022, identificando-se as seguintes modificações:[1]

CCs/FGs criados

Provimento

Assessor do Serviço Público de Parques e Praças

CC-2/FG-2

Assessor do Serviço Público de Resíduos

CC-2/FG-2

Assessor do Controle de Estoque da Infraestrutura

CC-3/FG-3

Assessor do Coordenador de Licenciamento Ambiental

CC-3/FG-3

Assessor do Gerente da Agência Municipal de Desenvolvimento Econômico e Social

CC-3/FG-3

Assessor do Secretário Municipal de Políticas para Mulheres, Família e Direitos Humanos

CC-4/FG-4

Coordenador de Autonomia Econômica

CC-4/FG-4

Coordenador de Compras da Infraestrutura

CC-4/FG-4

Coordenador de Enfrentamento à Violência

CC-4/FG-4

Assessor Jurídico (+1)

CC-5/FG-5

Assessor Superior I (+3)

CC-5/FG-5

CCs/FGs alterados

Alteração proposta

Chefe da Casa de Acolhimento

Passa de CC-3/FG-3 para CC-4/FG-4

Chefe do Gabinete do Vice-Prefeito

Passa de CC-4/FG-4 para CC-5/FG-5

Coordenador de Proteção Social de Alta Complexidade

Passa de CC-4/FG-4 para CC-5/FG-5

CCs/FGs extintos

Provimento

Assessor de Controle de Máquinas e Equipamentos

CC-3/FG-3

Chefe da Junta Militar

CC-3/FG-3

Chefe do Departamento de Licenciamento Ambiental

CC-3/FG-3

Coordenador das Políticas da Mulher

CC-4/FG-4

FGs criados

Provimento

Assessor de Controle de Máquinas e Equipamentos

FG-3

Assessor do Coordenador de Engenharia

FG-3

Assessor do Coordenador do Departamento de Administração Financeira

FG-3

Assistente de Acompanhamento Legislativo

FG-3

Assistente Técnico (+1)

FG-3

Assistente Técnico Ambiental

FG-3

Chefe da Divisão de Políticas de Primeira Infância

FG-3

Chefe da Junta Militar

FG-3

Chefe do Centro de Referência de Atendimento à Mulher

FG-3

Coordenador de Compras da Cultura

FG-4

Coordenador de Contratos da Saúde

FG-4

Coordenador de Fiscalização de Trânsito

FG-4

Coordenador de Fiscalização de Transportes

FG-4

Coordenador de Licenciamento Ambiental

FG-4

Coordenador do Departamento de Administração Financeira

FG-4

Coordenador do Departamento de Transporte e Logística da Saúde

FG-4

Coordenador Administrativo

FG-5

Coordenador de Projetos Especiais em Educação

FG-5

FGS extintos

Provimento

Assessor de Administração Financeira

FG-2

Assessor do Serviço de Parques e Praças

FG-2

Assessor do Serviço Público de Resíduos

FG-2

Chefe do Departamento de Administração Financeira

FG-3

Chefe do Departamento de Fiscalização de Trânsito

FG-3

Chefe do Departamento de Serviço de Transporte Sanitário Eletivo

FG-3

Fiscal de Zonais

FG-4

Salienta-se, novamente, que os dados identificados não são oficiais e expressam a simples tentativa de alcançar a informação sobre os cargos e funções que estão sendo criados, alterados e extintos. Caso haja interesse das comissões permanentes pela identificação oficial das mudanças propostas, sugere-se a busca por esclarecimentos junto ao Poder Executivo.

Ultrapassada essa etapa preliminar, esclarece-se que, como decorrência do princípio constitucional da impessoalidade, o provimento de cargos e empregos públicos na Administração Pública exige, como regra, a aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma do inciso II do art. 37 da CF/88.

Excepcionalmente, entretanto, é possível a criação de cargos de provimento em comissão ou de funções gratificadas quando as demandas funcionais envolverem a direção, a chefia ou o assessoramento de órgãos e agentes públicos. Essa regra de exceção está inscrita no art. 37, inc. V, da CF/1988, que prevê: “as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento”.

Considerando ser pressuposto das funções gratificadas e dos cargos em comissão o exercício de direção, chefia ou assessoramento de órgãos e servidores, há uma necessária relação de confiança entre o agente e a autoridade a quem se subordina hierarquicamente, dirigindo-se as atribuições ao atendimento de demandas superiores da Administração Pública, sem o propósito de viabilizar a execução de tarefas burocráticas, técnicas ou operacionais do Poder Público, reservadas aos servidores públicos efetivos.

Tais pressupostos são indispensáveis para a validade jurídica das leis que instituam funções gratificadas ou cargos em comissão. Isso porque o não atendimento desses requisitos afronta a regra do concurso público (art. 37, II, da CF/88) e torna a lei materialmente inconstitucional desde o seu nascedouro. São vários os precedentes da jurisprudência nacional no sentido da inconstitucionalidade de leis que criaram funções de confiança ou cargos em comissão com a previsão de atribuições diversas das de direção, chefia ou assessoramento de órgãos e agentes públicos, sendo pertinente destacar alguns deles:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Lei nº 3.201, de 06 de agosto de 2015, que criou a função gratificada de Técnico de Enfermagem Socorrista do SAMU, e artigo 6º, da Lei nº 3.035, de 27 de junho de 2013, que criou a função gratificada de Motorista Socorrista, ambas do Município de Itápolis. Funções subalternas, de pouca complexidade, que evidenciam a natureza profissional, técnica e burocrática dos encargos. Ausência de atribuições de assessoramento, chefia e direção. Inconstitucionalidade reconhecida, com efeito ex tunc. Ação procedente, afastada a preliminar, com observação. (TJSP, ADI nº 2036714-66.2016.8.26.0000, Órgão Especial, julgada em 10/8/2016, Relator: Tristão Ribeiro).

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MUNICÍPIO DE NÃO-ME-TOQUE. LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL Nº 71/2010. CRIAÇÃO DE CARGOS EM COMISSÃO. ATRIBUIÇÕES TÉCNICAS, OPERACIONAIS E BUROCRÁTICAS. ATIVIDADES QUE PRESCINDEM DE VÍNCULO ESPECIAL DE CONFIANÇA ENTRE A AUTORIDADE E O AGENTE ESCOLHIDO PARA A FUNÇÃO. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 8º, CAPUT, 20, CAPUT E §4º, E 32, CAPUT, TODOS DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. NORMAS DE REPRODUÇÃO OBRIGATÓRIA. ART. 37, II E V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. MODULAÇÃO DOS EFEITOS. PRECEDENTES DO TJRS. - Consoante arts. 8º, caput, 20, caput e §4º, e 32, caput, da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, e art. 37, II e V, da Constituição Federal, a criação de cargos em comissão, por serem dotados de forma excepcional de provimento (livre nomeação e exoneração), somente é possível para aquelas atividades de direção, chefia ou assessoramento especificamente prevista na norma de regência. - Análise da relação de cargos constante de parte do artigo 20 e dos Anexos I e II, da Lei Complementar Municipal nº 71/2010, do Município de Não-Me-Toque, que revela flagrante inconstitucionalidade na criação de cargos em comissão destinados ao desempenho de funções técnicas, operacionais e burocráticas, sem qualquer vínculo direto ao desenvolvimento e planejamento de diretrizes das políticas traçadas pelo Chefe do Poder Executivo Municipal, não ostentando, portanto, atribuições relacionadas ao exercício de direção, chefia e assessoramento que exijam a fidúcia inerente ao cargo de confiança. [...] AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA PROCEDENTE. UNÂNIME. (Direta de Inconstitucionalidade, Nº 70082250374, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marilene Bonzanini, Julgado em: 28-10-2019)

A Chefe do Executivo em exercício argumenta que o projeto de lei visa à adequação e à criação de funções gratificadas, privativas de servidores efetivos, bem como a ajustes pontuais nas atribuições de alguns cargos comissionados, de modo a conferir maior eficiência ao atendimento das demandas que são diariamente impostas aos diversos setores da Prefeitura do Município de Guaíba. Relata que é apenas a partir da rotina diária de trabalho que se evidenciam as carências e, assim, se torna possível planejar as medidas para adequar as atribuições dos agentes às novas necessidades. Isso posto, além da criação da Secretaria Municipal de Políticas para Mulheres, Família e Direitos Humanos, com o respectivo cargo público de Secretário Municipal, a proposição busca ajustar o quadro de pessoal e a organização administrativas às referidas demandas por atendimento, sendo proposta a criação e a extinção de cargos comissionados e de funções gratificadas, bem como a alteração do padrão de vencimento de determinadas funções, cuja relação não oficial consta neste parecer, dado que não houve detalhamento, na justificativa, sobre os cargos e funções criados/alterados/extintos.

Haja vista a falta de informação oficial sobre os cargos criados/alterados/extintos, fica prejudicada a análise das atribuições dos cargos, considerando ser inviável a esta Procuradoria proceder ao exame de regularidade das atribuições de todos os cargos comissionados e funções gratificadas do Poder Executivo Municipal no tempo disponibilizado (129 páginas de atribuições constantes no Anexo I). Ressalta-se apenas que é condição inafastável da viabilidade jurídica da criação de cargos comissionados e de funções gratificadas que suas atribuições expressem tarefas de direção, chefia ou assessoramento, sendo inconstitucional a criação de tais cargos e funções para o exercício de atividades burocráticas, técnicas ou típicas da Administração Pública, para as quais é exigida a realização de concurso público.

Por fim, ainda no aspecto da juridicidade da proposta, destaca-se que o Supremo Tribunal Federal (STF) definiu tese de repercussão geral acerca dos requisitos constitucionais para a criação de cargos comissionados (Tema nº 1.010), a seguir descritos:

Tema nº 1.010 – STF:

a) A criação de cargos em comissão somente se justifica para o exercício de funções de direção, chefia e assessoramento, não se prestando ao desempenho de atividades burocráticas, técnicas ou operacionais; b) tal criação deve pressupor a necessária relação de confiança entre a autoridade nomeante e o servidor nomeado; c) o número de cargos comissionados criados deve guardar proporcionalidade com a necessidade que eles visam suprir e com o número de servidores ocupantes de cargos efetivos no ente federativo que os criar; e d) as atribuições dos cargos em comissão devem estar descritas, de forma clara e objetiva, na própria lei que os instituir.

Assim, além da compatibilidade das atribuições com as funções de direção, chefia ou assessoramento, necessário frisar que a viabilidade da criação de cargos comissionado fica condicionada à proporcionalidade da relação entre comissionados e efetivos no âmbito deste Município, bem como ao pressuposto da relação de confiança entre a autoridade nomeante e o servidor nomeado, que deflui da natureza de suas atribuições, que devem ser necessariamente descritas na própria lei de forma clara e objetiva.

Além do atendimento da competência, da iniciativa e dos requisitos de constitucionalidade material acima expostos, o projeto que verse sobre a criação de cargos ou funções gratificadas deve demonstrar o cumprimento de requisitos de ordem orçamentária, previstos no artigo 169, § 1º, da CF/88, e dos artigos 15, 16, 17, 20 e 22 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LC nº 101/2000).

Prevê o artigo 169, caput e § 1º, da CF/88:

Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.

§ 1º A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos, empregos e funções ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, só poderão ser feitas: (Renumerado do parágrafo único, pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

I – se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

II – se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

Na Lei de Responsabilidade Fiscal, preceituam os artigos 15 e 16, inc. I e II:

Art. 15. Serão consideradas não autorizadas, irregulares e lesivas ao patrimônio público a geração de despesa ou assunção de obrigação que não atendam o disposto nos arts. 16 e 17.

Art. 16. A criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa será acompanhado de:

I – estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subseqüentes;

II – declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias.

Tais regras estão atendidas, visto que, além da previsão autorizativa dos arts. 25 e 26 da Lei de Diretrizes Orçamentárias (Lei Municipal nº 4.081/2021), houve a apresentação de estimativa de impacto orçamentário-financeiro contendo as informações necessárias.

Ainda, dispõe o art. 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal:

Art. 17. Considera-se obrigatória de caráter continuado a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios.

§ 1º Os atos que criarem ou aumentarem despesa de que trata o caput deverão ser instruídos com a estimativa prevista no inciso I do art. 16 e demonstrar a origem dos recursos para seu custeio.

§ 2º Para efeito do atendimento do § 1º, o ato será acompanhado de comprovação de que a despesa criada ou aumentada não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo referido no § 1º do art. 4º, devendo seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes, ser compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa.

§ 3º Para efeito do § 2º, considera-se aumento permanente de receita o proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

§ 4º A comprovação referida no § 2º, apresentada pelo proponente, conterá as premissas e metodologia de cálculo utilizadas, sem prejuízo do exame de compatibilidade da despesa com as demais normas do plano plurianual e da lei de diretrizes orçamentárias.

§ 5º A despesa de que trata este artigo não será executada antes da implementação das medidas referidas no § 2º, as quais integrarão o instrumento que a criar ou aumentar.

§ 6º O disposto no § 1º não se aplica às despesas destinadas ao serviço da dívida nem ao reajustamento de remuneração de pessoal de que trata o inciso X do art. 37 da Constituição.

§ 7º Considera-se aumento de despesa a prorrogação daquela criada por prazo determinado.

Quanto ao disposto no art. 17 da LRF, cabe reiterar que a estimativa de impacto orçamentário-financeiro apresenta a origem dos recursos para o custeio da despesa e contém as premissas básicas, comprovando-se, ainda, que a despesa criada não afetará as metas de resultados fiscais.

Além disso, estabelecem os artigos 19 e 20 da LC nº 101/00:

Art. 19. Para os fins do disposto no caput do art. 169 da Constituição, a despesa total com pessoal, em cada período de apuração e em cada ente da Federação, não poderá exceder os percentuais da receita corrente líquida, a seguir discriminados:

I - União: 50% (cinqüenta por cento);

II - Estados: 60% (sessenta por cento);

III - Municípios: 60% (sessenta por cento).

Art. 20. A repartição dos limites globais do art. 19 não poderá exceder os seguintes percentuais:

[...]

III - na esfera municipal:

b) 54% (cinquenta e quatro) para o Executivo.

Segundo a estimativa de impacto orçamentário-financeiro, a receita corrente líquida prevista para o exercício é de R$ 381.983.010,36. A despesa total com pessoal projetada para o final do exercício é de R$ 181.248.908,64, representando 47,45% da receita corrente líquida, percentual abaixo do limite prudencial do art. 22, parágrafo único, da LRF:

Art. 22. A verificação do cumprimento dos limites estabelecidos nos arts. 19 e 20 será realizada ao final de cada quadrimestre.

Parágrafo único. Se a despesa total com pessoal exceder a 95% (noventa e cinco por cento) do limite, são vedados ao Poder ou órgão referido no art. 20 que houver incorrido no excesso:

I – concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a qualquer título, salvo os derivados de sentença judicial ou de determinação legal ou contratual, ressalvada a revisão prevista no inciso X do art. 37 da Constituição;

II – criação de cargo, emprego ou função;

III – alteração de estrutura de carreira que implique aumento de despesa;

IV – provimento de cargo público, admissão ou contratação de pessoal a qualquer título, ressalvada a reposição decorrente de aposentadoria ou falecimento de servidores das áreas de educação, saúde e segurança;

V – contratação de hora extra, salvo no caso do disposto no inciso II do § 6o do art. 57 da Constituição e as situações previstas na lei de diretrizes orçamentárias.

Portanto, diante do impacto orçamentário-financeiro apresentado e da demonstração de não atingimento do limite prudencial previsto no art. 22, parágrafo único, da LRF, não há vedação de natureza financeira à medida proposta.

[1] Ressalta-se que é possível ter passado despercebida alguma modificação dos quadros de pessoal, considerando o reduzido tempo para a análise e a extensão da relação de cargos e funções gratificadas.

4. Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa e não vinculante do parecer jurídico, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria Jurídica tece as seguintes considerações sobre o Projeto de Lei do Executivo nº 084/2022:

a) a competência legislativa e a iniciativa foram adequadamente atendidas, visto que o assunto é de interesse local (art. 30, inciso I, da CF/88), não extrapolando competências de outros entes, e a proposta foi apresentada pelo Chefe do Executivo, autoridade competente para definir o quadro de pessoal e a política remuneratória do ente (art. 61, § 1º, II, “a”, da CF/88; art. 60, II, “a”, da CE/RS; art. 119, I, da LOM);

b) diante da falta de informação oficial sobre os cargos criados/alterados/extintos, tendo sido realizada, por esta Procuradoria, uma análise comparativa não oficial dos quadros atuais da legislação e os propostos no PLE nº 084/2022 apenas para efeito de informação sobre as mudanças buscadas, fica prejudicada a análise das atribuições dos cargos, considerando ser inviável a esta Procuradoria proceder ao exame de regularidade das atribuições de todos os cargos comissionados e funções gratificadas do Executivo Municipal no tempo disponibilizado (129 páginas de atribuições constantes no Anexo I);

c) ressalta-se, entretanto, que, nos termos do Tema nº 1.010 do STF, toda a criação de cargos comissionados é excepcional e deve estar fundamentada na relação de confiança entre a autoridade nomeante e o servidor nomeado, tão somente para o exercício de funções de direção, chefia ou assessoramento, sendo vedada a criação de CCs ou FGs para o desempenho das tarefas burocráticas, técnicas ou típicas da Administração Pública, para as quais é reservado o concurso público como modalidade de admissão, devendo, ainda, haver uma relação de proporcionalidade numérica entre o quadro de comissionados e o de efetivos;

d) no aspecto orçamentário-financeiro, foi apresentado o necessário documento de impacto exigido pela Lei de Responsabilidade Fiscal, que demonstra a origem dos recursos e os percentuais atingidos com medida, que não ultrapassam os limites legais de despesa com pessoal definidos pelos arts. 20 e 22 da Lei Complementar nº 101/00.

É o parecer, salvo melhor juízo.

Guaíba, 23 de dezembro de 2022.

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B

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23/12/2022 15:47:45
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