Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 086/2022
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 449/2022
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Institui o Programa de Microcrédito Desenvolve Guaíba e autoriza o Poder Executivo a apoiar o Acesso ao Crédito em condições adequadas aos Microempreendedores individuais, microempresas, empresas de pequeno porte e micro e pequenos produtores rurais, mediante cumprimento de condições que especifica, e dá outras providências. "

1. Relatório:

O Poder Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 086/2022 à Câmara Municipal, que cria o Programa de Microcrédito Desenvolve Guaíba e o autoriza a apoiar o acesso ao crédito em condições adequadas aos microempreendedores individuais, microempresas, empresas de pequeno porte e micro e pequenos produtores rurais. A proposição foi encaminhada à Procuradoria Jurídica para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno.

3. FUNÇÕES DA PROCURADORIA JURÍDICA:

A Procuradoria Jurídica da Câmara de Guaíba, órgão consultivo com previsão no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18, exerce as funções de assessoramento jurídico e de orientação da Mesa Diretora, da Presidência da Casa e dos setores legislativos, através da emissão de pareceres escritos e verbais, bem como de opiniões fundamentadas objetivando a tomada de decisões, por meio de reuniões, de manifestações escritas e de aconselhamentos. Trata-se de órgão público que, embora não detenha competência decisória, orienta juridicamente o gestor público e os setores legislativos, sem caráter vinculante.

Os pareceres jurídicos são atos resultantes do exercício da função consultiva desta Procuradoria Jurídica, no sentido de alertar para eventuais inconformidades que possam estar presentes. Conforme leciona Hely Lopes Meirelles na obra Direito Administrativo Brasileiro, 41ª ed., Malheiros Editores: São Paulo, 2015, p. 204, “O parecer tem caráter meramente opinativo, não vinculando a Administração ou os particulares à sua motivação ou conclusões, salvo se aprovado por ato subsequente. Já, então, o que subsiste como ato administrativo não é o parecer, mas, sim, o ato de sua aprovação, que poderá revestir a modalidade normativa, ordinatória, negocial ou punitiva.”

Desse modo, a função consultiva desempenhada por esta Procuradoria com base no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18 – que dispõe sobre a organização administrativa da Câmara Municipal de Guaíba – não é vinculante, motivo pelo qual é possível, se for o caso, que os agentes políticos formem suas próprias convicções em discordância com as opiniões manifestadas por meio do parecer.

3. Mérito:

O artigo 18 da Constituição Federal de 1988, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo “autonomia política”, sob o ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir sua organização, legislação, administração e governo próprios.

A autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios, é tratada no artigo 30 da Lei Maior, nos seguintes termos:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I – legislar sobre assuntos de interesse local;

II – suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III – instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV – criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V – organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI – manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VII – prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII – promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

IX – promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

A lei que se pretende criar se insere, efetivamente, na definição de interesse local, pois estabelece um programa de viabilização de microcrédito pelo Município de Guaíba em parceria com operadores financeiros previamente credenciados, de alcance estritamente municipal, com fundamento no art. 30, inciso I, da Constituição Federal de 1988.

Quanto à iniciativa para deflagrar o processo legislativo, as hipóteses de iniciativa privativa do Poder Executivo, que limitam o poder de iniciativa dos Vereadores, estão expressamente previstas na CF/88, aplicadas por simetria aos Estados e Municípios. Dispõe o artigo 61, § 1º, da CF/88:

Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

§ 1º São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:

I – fixem ou modifiquem os efetivos das Forças Armadas;

II – disponham sobre:

a) criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração;

b) organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração dos Territórios;

c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)

d) organização do Ministério Público e da Defensoria Pública da União, bem como normas gerais para a organização do Ministério Público e da Defensoria Pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios;

e) criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública, observadoo disposto no art. 84, VI; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)

f) militares das Forças Armadas, seu regime jurídico, provimento de cargos, promoções, estabilidade, remuneração, reforma e transferência para a reserva. (Incluída pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)

Para os fins do direito municipal, mais relevante ainda é a observância das normas previstas na Constituição Estadual em relação à iniciativa para o processo legislativo, já que, em caso de eventual controle de constitucionalidade, o parâmetro para a análise da conformidade vertical se dá em relação ao disposto na Constituição Gaúcha, conforme preveem o art. 125, § 2º, da CF/88 e o art. 95, XII, alínea “d”, da CE/RS. Nesse caso, informa o art. 60 da Constituição Estadual:

Art. 60.  São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que:

I – fixem ou modifiquem os efetivos da Brigada Militar e do Corpo de Bombeiros Militar; (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 67, de 17/06/14)

II – disponham sobre:

a) criação e aumento da remuneração de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta ou autárquica;

b) servidores públicos do Estado, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria de civis, e reforma ou transferência de militares para a inatividade;

c) organização da Defensoria Pública do Estado;

d) criação, estruturação e atribuições das Secretarias e órgãos da administração pública.

No âmbito municipal, o artigo 119 da Lei Orgânica, à semelhança do artigo 60 da Constituição Estadual, faz reserva de iniciativa aos projetos de lei sobre certas matérias:

Art. 119 É competência exclusiva do Prefeito a iniciativa dos projetos de lei que disponham sobre:

I – criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração;

II – organização administrativa, matéria orçamentária e serviços públicos;

III – servidores públicos, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria;

IV – criação e extinção de Secretarias e órgãos da administração pública. (Redação dada pela Emenda à Lei Orgânica nº 2/2017)

A iniciativa para a deflagração do processo legislativo está adequada, porquanto o projeto disciplina um programa municipal de microcrédito a empreendedores instalados no Município de Guaíba, cuja coordenação será de responsabilidade da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e Inovação (art. 5º), sendo a iniciativa legislativa, portanto, privativa do Chefe do Executivo.

Em relação à matéria de fundo, observa-se que a proposição tem o objetivo geral de promover o desenvolvimento local, através do apoio aos microempreendedores instalados no Município de Guaíba, possibilitando-lhes o acesso ao crédito, serviços financeiros e educação empreendedora, por meio de um programa que envolverá a municipalidade, operadores financeiros cadastrados e os empreendedores locais interessados.

Para a concessão dos incentivos, a proposta define algumas condições, como a formalização e atividade do empreendedor há pelo menos seis meses, a limitação de uma única operação de crédito para cada beneficiário e valores e prazos máximos que deverão ser respeitados pelos agentes. Como estabelece o art. 4º, o Chefe do Executivo estabelecerá, ainda, as condições e critérios para a formalização do instrumento de credenciamento com os agentes financeiros e/ou operadores credenciados, que poderão ser associações qualificadas como organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIPs), sociedades de crédito ao microempreendedor e à empresa de pequeno porte (SCMEPP), cooperativas singulares de crédito ou instituições financeiras. Também se remete à regulamentação do Poder Executivo o conjunto de requisitos para o credenciamento e a atuação das instituições, de modo a garantir o êxito e a segurança do programa.

Quanto à técnica legislativa, sugere-se uma revisão dos trechos em que equivocadamente mencionada a Lei nº 13.336/2018 (art. 1º, § 1º, e art. 2º, II), devendo ser mencionada a Lei nº 13.636/2018, que trata da matéria. No parágrafo único do art. 3º, deve ser esclarecido se o prazo máximo de pagamento das operações de crédito será de 20 ou 24 meses, diante da imprecisão do trecho “será de até 24 (vinte meses)...”. Na cláusula de vigência (art. 9º), se a intenção é que a lei entre em vigor a partir da publicação, recomenda-se a sua correção para que conste: “Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.”. Por fim, sugere-se a substituição dos trechos “§ Único –“ por “Parágrafo único.”, pois esta última foi a designação adotada pela LC nº 95/98 em seu art. 10, III.

3. Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa e não vinculante do parecer jurídico, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria opina pela legalidade e regular tramitação do Projeto de Lei do Executivo nº 086/2022, por inexistirem vícios de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário, recomendando-se a revisão da técnica legislativa, nos termos expostos no último parágrafo da fundamentação.

É o parecer.

Guaíba, 23 de dezembro de 2022.

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS n.º 110.114B

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23/12/2022 15:39:46
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