PARECER JURÍDICO |
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"Altera a Lei Municipal nº 1.864, de 03 de maio de 2004, que Cria Função Gratificada para os cargos operacionais do Guaíbaprev e dá outras providências." 1. RelatórioO Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 068/2022 à Câmara Municipal, que altera a Lei Municipal nº 1.864, de 03 de maio de 2004, que cria funções gratificadas na estrutura administrativa do GuaíbaPrev e dá outras providências. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência para análise nos termos do art. 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal. O parecer jurídico de admissibilidade foi lançado pelo Procurador-Geral da Câmara. A Comissão de Constituição, Justiça e Redação solicitou nova manifestação da Procuradoria, tendo em vista a orientação técnica apresentada pelo IGAM. 2. FUNÇÕES DA PROCURADORIA JURÍDICA:A Procuradoria Jurídica da Câmara de Guaíba, órgão consultivo com previsão no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18, exerce as funções de assessoramento jurídico e de orientação da Mesa Diretora, da Presidência da Casa e dos setores legislativos, através da emissão de pareceres escritos e verbais, bem como de opiniões fundamentadas objetivando a tomada de decisões, por meio de reuniões, de manifestações escritas e de aconselhamentos. Trata-se de órgão público que, embora não detenha competência decisória, orienta juridicamente o gestor público e os setores legislativos, sem caráter vinculante. Os pareceres jurídicos são atos resultantes do exercício da função consultiva desta Procuradoria, no sentido de alertar para eventuais inconformidades que possam estar presentes. Conforme leciona Hely Lopes Meirelles na obra Direito Administrativo Brasileiro, 41ª ed., Malheiros Editores: São Paulo, 2015, p. 204, “O parecer tem caráter meramente opinativo, não vinculando a Administração ou os particulares à sua motivação ou conclusões, salvo se aprovado por ato subsequente. Já, então, o que subsiste como ato administrativo não é o parecer, mas, sim, o ato de sua aprovação, que poderá revestir a modalidade normativa, ordinatória, negocial ou punitiva”. Desse modo, a função consultiva desempenhada por esta Procuradoria com base no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18 – que dispõe sobre a organização administrativa da Câmara Municipal de Guaíba – não é vinculante, motivo pelo qual é possível, se for o caso, que os agentes políticos formem suas próprias convicções em discordância com as opiniões manifestadas por meio do parecer jurídico. 3. Mérito:O presente parecer jurídico é redigido a pedido da Comissão de Constituição, Justiça e Redação, levando em conta os apontamentos anteriores da Procuradoria Jurídica e do IGAM no sentido da excepcionalidade da criação de cargos em comissão e de funções gratificadas na Administração Pública, tendo sido solicitados esclarecimentos sobre a estrutura administrativa do GuaíbaPrev, cuja natureza jurídica é de autarquia municipal. Inicialmente, relativamente à competência legislativa e à iniciativa do processo legislativo, ratifica-se o parecer jurídico anterior, pois a matéria é de interesse local e reflete a competência legislativa municipal para dispor sobre os assuntos mais diretamente atinentes às necessidades do Município de Guaíba, com fundamento nos arts. 1º, 18, 29, 30, I, e 34, VII, “c”, todos da CF/88, além de estar na reserva de deflagração do Chefe do Executivo Municipal – autor da proposição –, conforme o art. 60, II, “a”, da Constituição Estadual. Quanto aos aspectos materiais da proposição, ressalta-se novamente que a finalidade primordial do Projeto de Lei do Executivo nº 068/2022 é dispor sobre as funções gratificadas do GuaíbaPrev, por meio de alterações na Lei Municipal nº 1.864/2004, que já disciplina a matéria. Por efeito da proposição, serão criadas duas novas funções gratificadas (art. 1º) – Coordenador de Recursos Humanos e Coordenador de Compensação Previdenciária –, atualizando-se e inserindo-se as atribuições, padrão remuneratório, carga horária e requisitos para o provimento das vagas (arts. 2º, 3º, 4º e 5º), além da definição dos valores do FG nos regimes normal, de tempo integral e de dedicação exclusiva (art. 6º). Também será alterado o art. 8º, para torná-lo mais claro, e serão revogados os arts. 6º e 10. Feito o esclarecimento inicial sobre o objeto, passa-se à análise do ponto especificamente questionado pela Comissão de Constituição, Justiça e Redação, que solicita esclarecimentos sobre a estrutura administrativa do GuaíbaPrev, considerando ter sido mencionado, nos pareceres jurídicos, que a criação de cargos em comissão e de funções gratificadas apenas se justifica para o exercício de funções de direção, chefia e assessoramento, não se prestando ao desempenho de atividades burocráticas, técnicas ou operacionais. A estrutura do GuaíbaPrev é assim definida pela Lei Municipal nº 2.048/2006 em seus arts. 20, 21, 24 e 26:
Além das funções públicas acima citadas, que compõem a estrutura técnico-administrativa básica do GuaíbaPrev, existem, ainda, funções gratificadas criadas pela Lei Municipal nº 1.864/2004 – que ora se pretende alterar –, com a seguinte organização:
Há, ainda, a informação de que, atualmente, há quatro servidores efetivos do Executivo Municipal cedidos ao GuaíbaPrev, um ocupando a FG de Coordenador Previdenciário e os demais sendo titulares dos cargos de Professor Nível III, Auxiliar de Apoio Administrativo e Servente de Escola. Com a criação de duas novas funções gratificadas, como propõe o Projeto de Lei do Executivo nº 068/2022, haverá, em resumo, 4 funções gratificadas para uma relação de 4 servidores em exercício, sendo estes todos cedidos pelo Poder Executivo. Nesse sentido, como decorrência do princípio constitucional da impessoalidade, a CF/88 estabelece, em seu art. 37, II, que o provimento de cargos e empregos públicos na Administração Pública exige, como regra, a aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego. Excepcionalmente, contudo, é possível a criação de cargos de provimento em comissão ou de funções gratificadas quando as demandas funcionais envolverem a direção, a chefia ou o assessoramento de órgãos e agentes públicos. Tal exceção está inscrita no art. 37, V, da CF/88, que estabelece: “as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento”. A criação de cargos em comissão e de funções gratificadas deve, porém, atentar-se para determinados requisitos de admissibilidade, considerando sobretudo que a natureza das atribuições é restrita à direção, chefia ou assessoramento da entidade e que, como regra, o provimento de cargos deve se dar por concurso público. O Supremo Tribunal Federal pacificou a matéria no ano de 2018, quando, por meio do Recurso Extraordinário nº 1.041.210/SP, com repercussão geral, delineou os pressupostos de sua criação:
Tal decisão é paradigmática e deve balizar a análise de regularidade jurídica desta proposição, dada a reconhecida repercussão geral do acórdão, isto é, a existência de questão relevante do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapasse os interesses subjetivos do processo (art. 1.035, § 1º, do Código de Processo Civil). Nessa linha, correto o IGAM quando alerta, na Orientação Técnica nº 23.055/2022, que determinadas atribuições previstas da proposição não expressam atividades de direção, chefia ou assessoramento, relevando-se muito mais como atribuições técnicas e burocráticas que competem a servidores efetivos. Inclusive, em atenção às recomendações, o GuaíbaPrev enviou ofício à Comissão de Constituição, Justiça e Redação e à Comissão de Obras e Serviços Públicos sugerindo adequações na descrição das atribuições das funções gratificadas, a fim de que observem a natureza de direção, chefia e assessoramento. Na jurisprudência, são frequentes as declarações de inconstitucionalidade quanto a cargos comissionados cujas atribuições expressem tarefas de caráter técnico-burocrático:
Recomenda-se, assim, que as comissões permanentes acolham a sugestão e elaborem emenda alterando as atribuições, ressaltando-se também que, conforme a jurisprudência do STF, a descrição deve ser clara e objetiva na própria lei que cria as funções gratificadas. Sugere-se, ainda, que seja suprimida da lei qualquer menção a “cargos operacionais”, pois tal expressão é destoante da natureza das funções propostas. Por outro lado, relativamente à proporcionalidade das funções gratificadas com a necessidade que visam suprir e com o número de titulares de cargos efetivos na entidade, há potenciais problemas que podem resultar da criação das duas novas funções gratificadas. Isso porque a natureza jurídica do GuaíbaPrev é de autarquia municipal, isto é, de pessoa jurídica de direito público, integrante da Administração Pública Indireta, que, nessa condição, sujeita-se a regime de direito público, com quadro próprio de pessoal, cuja admissão exige concurso público, e todos os servidores hoje lotados na entidade são cedidos pelo Executivo Municipal, não havendo um servidor público sequer que tenha sido admitido pelo próprio GuaíbaPrev, já que nunca houve concurso público organizado pela autarquia municipal. Verificam-se, nesse ponto, apontes do TCE/RS sobre a criação de cargos comissionados quando ausentes servidores efetivos do próprio quadro, a exemplo do Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Servidores Municipais de São Leopoldo (Proc. 8088-02.00/12-8):
Veja-se, também, o apontamento na prestação de contas do exercício de 2018 do Poder Legislativo de Cristal, que, embora não tenha provocado penalização pecuniária do gestor, por tratar-se de municipalidade de pequeno porte, resultou em advertência da irregularidade da admissão de pessoal por vínculos precários, quando ausente quadro próprio de servidores efetivos (Processo nº 1818-0200/18-9, do TCE/RS):
No caso, em que pese o GuaíbaPrev tenha servidores efetivos em atividade, todos são cedidos pelo Executivo Municipal, inexistindo, até hoje, a realização de qualquer concurso público pela autarquia municipal, o que, como exposto até o momento, contraria a forma de admissão de pessoal definida pela CF/88, revestida, inclusive, da natureza de princípio constitucional por parte da doutrina (princípio do concurso público). Nesses termos, a mesma interpretação dos apontamentos do TCE/RS é cabível ao caso em análise, pois, embora sejam servidores efetivos em sua origem, o vínculo com o GuaíbaPrev é precário, considerando que, a qualquer momento, podem ser requisitados pelo órgão cedente, criando o risco de descontinuidade das atividades da autarquia municipal e de quebra da memória administrativa da instituição, em prejuízo ao interesse público primário. Portanto, embora a proposição esteja adequada no aspecto formal, pois atende à competência legislativa municipal e à regra constitucional de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, a sua aprovação envolve, no aspecto da constitucionalidade material, o risco de que o quadro de funções gratificadas seja apontado como desproporcional em relação ao número de servidores efetivos em atividade (4) ou mesmo ao número de servidores efetivos da própria autarquia (0). 4. Conclusão:Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa e não vinculante do parecer jurídico, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria, em conclusão, tece as seguintes considerações sobre o Projeto de Lei do Executivo nº 068/2022: a) a competência legislativa e a iniciativa foram adequadamente atendidas, visto que o assunto é de interesse local (art. 30, inciso I, da CF/88), não extrapolando competências de outros entes, e a proposição foi apresentada pelo Chefe do Executivo, autoridade competente para criar funções na Administração Pública (art. 60, II, “a”, da CE/RS); b) no aspecto da constitucionalidade material, adverte-se que, como o quadro de pessoal do GuaíbaPrev é composto exclusivamente por servidores cedidos pelo Executivo Municipal (quatro, sendo um ocupante da FG de Coordenador Previdenciário e os demais titulares dos cargos de Professor Nível III, Auxiliar de Apoio Administrativo e Servente de Escola), a criação de duas novas funções gratificadas traz o risco de que seja apontada como desproporcional pelos órgãos de controle em relação ao número de servidores efetivos em atividade (4) ou mesmo ao número de servidores efetivos da própria autarquia municipal (0), com fundamento nos pressupostos definidos pelo STF no acórdão do RE nº 1.041.210/SP e no art. 37, II, da CF/88, que expressa o princípio do concurso público na Administração Pública. É o parecer. Guaíba, 22 de novembro de 2022. GUSTAVO DOBLER Procurador OAB/RS nº 110.114B Documento Assinado Digitalmente no padrão ICP-Brasil por:![]() 22/11/2022 20:57:00 |
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Documento publicado digitalmente por GUSTAVO DOBLER em 22/11/2022 ás 20:56:26. Chave MD5 para verificação de integridade desta publicação f134bba375961a2938cfe2bfe73702e7.
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