PARECER JURÍDICO |
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"Altera e acrescenta dispositivos à Lei Municipal n.º 2.146/2006 e dá outras providências" 1. Relatório:O Vereador Alex Medeiros apresentou o Projeto de Lei nº 147/2022 à Câmara Municipal, que altera e acrescenta dispositivos à Lei Municipal nº 2.146/2006, que define o Plano Diretor do Município de Guaíba. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência para análise nos termos do art. 105 do Regimento Interno. 2. FUNÇÕES DA PROCURADORIA JURÍDICA:A Procuradoria Jurídica da Câmara de Guaíba, órgão consultivo com previsão no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18, exerce as funções de assessoramento jurídico e de orientação da Mesa Diretora, da Presidência da Casa e dos setores legislativos, através da emissão de pareceres escritos e verbais, bem como de opiniões fundamentadas objetivando a tomada de decisões, por meio de reuniões, de manifestações escritas e de aconselhamentos. Trata-se de órgão público que, embora não detenha competência decisória, orienta juridicamente o gestor público e os setores legislativos, sem caráter vinculante. Os pareceres jurídicos são atos resultantes do exercício da função consultiva, no sentido de alertar para inconformidades que possam estar presentes. Conforme Hely Lopes Meirelles na obra Direito Administrativo Brasileiro, 41ª ed., Malheiros Editores: São Paulo, 2015, p. 204, “O parecer tem caráter meramente opinativo, não vinculando a Administração ou os particulares à sua motivação ou conclusões, salvo se aprovado por ato subsequente. Já, então, o que subsiste como ato administrativo não é o parecer, mas, sim, o ato de sua aprovação, que poderá revestir a modalidade normativa, ordinatória, negocial ou punitiva”. Desse modo, a função consultiva desempenhada por esta Procuradoria com base no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18 não é vinculante, motivo pelo qual é possível, se for o caso, que os agentes políticos formem suas próprias convicções em discordância com as opiniões manifestadas por meio do parecer jurídico. 3. Mérito:De fato, a norma inscrita no art. 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal outorga ao Presidente do Legislativo a possibilidade de devolução ao autor de proposições maculadas por manifesta inconstitucionalidade (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou de caráter pessoal (art. 105, III). Solução similar é encontrada no Regimento Interno da Câmara dos Deputados (art. 137, § 1º) – parlamento em que o controle vem sendo exercido –, no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI – em que a solução é o arquivamento) e em diversos outros regimentos de casas legislativas pátrias. A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como o instituto do controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame superficial pela Presidência da Mesa Diretora, considerado controle preventivo de constitucionalidade interno, antes que a proposição possa percorrer o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução se perfaz por despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único). O artigo 18 da Constituição Federal de 1988, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo “autonomia política”, sob o ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir sua organização, legislação, administração e governo próprios. A autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios, é tratada no artigo 30 da Lei Maior, nos seguintes termos:
Nesses termos, a alteração pretendida no Plano Diretor se insere, efetivamente, na definição de interesse local. Isso porque, além de veicular tema de relevância para o Município, a proposta se refere ao planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano, matéria para a qual o Município é competente, conforme fundamenta o art. 30, VIII, da CF/88. No que diz respeito à iniciativa, também está adequada, porque não há qualquer dispositivo constitucional que restrinja o poder de iniciativa no que concerne aos projetos de lei sobre o plano diretor. Aplica-se, em razão disso, a regra geral prevista no artigo 61, caput, da CF/88, artigo 59, caput, da CE/RS e artigo 38, caput, da LOM, segundo os quais a iniciativa dos projetos de lei, salvo disposição contrária, cabe a qualquer membro do Legislativo, comissão permanente da Câmara Municipal, ao Prefeito e ao eleitorado. Veja-se a jurisprudência do TJRS sobre a iniciativa concorrente:
Quanto à matéria de fundo, o Projeto de Lei nº 147/2022 busca alterar novamente o § 5º do art. 163 da Lei Municipal nº 2.146/2006 (Plano Diretor Municipal), para incluir a Rua Borges de Medeiros entre aquelas cujos empreendimentos do comércio varejista, escritórios, consultórios em geral e de serviços estão isentos da obrigação de garantir vagas de estacionamento em projetos novos e de regularização. Também busca a proposição incluir, no Anexo 7 do Plano Diretor, a Rua Borges de Medeiros entre aquelas isentas de recuo de frente de ajardinamento, sendo ambas as alterações, como demonstrado, de interesse local e concernentes ao ordenamento da ocupação do solo urbano. Salienta-se, contudo, que é obrigatória a participação popular durante a tramitação do projeto, sob pena de inconstitucionalidade formal, tendo em vista que dispõe sobre a política de ordenamento territorial e ocupação do solo urbano, estando tal dever previsto no art. 177, § 5º, da Constituição Estadual[1] e no art. 40, § 4º, I, do Estatuto da Cidade[2]. Além disso, por tratar-se de projeto de lei complementar municipal, são exigidas a ampla divulgação e a realização de consulta pública para recebimento de sugestões da comunidade (art. 46, IV e § 1º, da LOM). Inclusive, o TJRS já declarou a inconstitucionalidade formal de leis municipais que, modificando o Plano Diretor, deixaram de oportunizar a participação popular:
Além disso, também é obrigatória a realização de estudos técnicos para a alteração do Plano Diretor, dado que o exercício da competência constitucional do art. 30, VIII, da CF/88 – promoção do adequado ordenamento territorial – pressupõe o planejamento das ações idealizadas, cujos impactos sobre a cidade devem ser previamente conhecidos e, na medida do possível, reduzidos ou compensados. O processo legislativo que busque modificar o Plano Diretor deve, portanto, incorporar a racionalidade e o planejamento como elementos condutores das decisões políticas, sob pena de inconstitucionalidade formal:
Ainda, conforme o art. 310, inc. I, do Plano Diretor, compete ao Conselho Municipal do Plano Diretor “opinar sobre os projetos de Lei e de decretos necessários à atualização e complementação da Lei do Plano Diretor de Planejamento e Gestão Municipal, a Lei de Parcelamento do Solo e do Código de Obras”. Nesse sentido, compete às comissões permanentes diligenciarem para a obtenção dos pareceres a respeito da proposição, proporcionando a necessária participação popular das instâncias de controle social. Por fim, destaca-se que o Ministério Público Estadual ingressou com ação civil pública em face do Município de Guaíba e da Câmara Municipal de Guaíba (Processo nº 5007073-48.2022.8.21.0052) buscando, entre outras medidas, que o Poder Legislativo seja ordenado a abster-se de cadastrar novas propostas legislativas de iniciativa parlamentar que tenham por objetivo a modificação do Plano Diretor. Embora tenha sido deferida a tutela de urgência pelo Juízo de primeiro grau, foi concedido efeito suspensivo em agravo de instrumento interposto pela Câmara Municipal de Guaíba no que tange ao item 2 da decisão recorrida[3], sendo determinada apenas a suspensão do PLL nº 083/2022 até o julgamento definitivo do recurso e mantida a multa cominatória já fixada. Ou seja, no cenário processual atual, não há impedimento à apresentação novas propostas legislativas, dado ter sido concedido efeito suspensivo parcial à tutela de urgência deferida. Assim, em termos gerais, o PL nº 147/2022 é juridicamente viável, uma vez que a matéria está compreendida nas competências legislativas municipais, a iniciativa legislativa é concorrente e a proposição é compatível com o interesse local. Porém, devem ser garantidas a ampla divulgação e a realização de audiências, consultas e debates visando à participação popular na construção da política, bem como a apresentação de estudos técnicos que subsidiem a modificação tendo em consideração os possíveis impactos sobre a cidade, além da necessária oitiva do Conselho Municipal do Plano Diretor (art. 310, I, da Lei nº 2.146/2006). [1] Art. 177 [...] § 5º Os Municípios assegurarão a participação das entidades comunitárias legalmente constituídas na definição do plano diretor e das diretrizes gerais de ocupação do território, bem como na elaboração e implementação dos planos, programas e projetos que lhe sejam concernentes. [2] Art. 40 [...] § 4º No processo de elaboração do plano diretor e na fiscalização de sua implementação, os Poderes Legislativo e Executivo municipais garantirão: I – a promoção de audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade; [3] 2) à requerida Câmara de Vereadores: a) retire do plenário o PLL nº 083/2022 e anule eventuais votações para aprovação do referido projeto; e b) abstenha-se de cadastrar novas propostas legislativas oriundas do próprio Poder Legislativo e que tenham como escopo a modificação do Plano Diretor Municipal de Guaíba, devendo realizar eventuais sugestões de alterações ao PDM no escopo do Grupo de Trabalho de atualização do Plano, coordenado pelo Poder Executivo, de modo a propiciar a revisão conjunta e integral do PDM, assim como o cumprimento integral de todas as etapas estabelecidas para revisão do Plano. 4. Conclusão:Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa e não vinculante do parecer jurídico, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria opina pela constitucionalidade do Projeto de Lei do Legislativo nº 147/2022, por inexistirem, até o presente momento, vícios formais ou materiais que impeçam a sua deliberação em Plenário. Ressalta-se, porém, que é obrigatória a participação popular durante a tramitação do projeto, sob pena de inconstitucionalidade formal, tendo em vista que dispõe sobre a política de ordenamento territorial e ocupação do solo urbano, estando tal dever previsto no art. 177, § 5º, da CE/RS e no art. 40, § 4º, I, do Estatuto da Cidade. A mesma obrigação se extrai do § 1º do art. 46 da Lei Orgânica Municipal, porquanto a proposição tem natureza de lei complementar municipal. Logo, a completa viabilidade jurídica do projeto, sob o aspecto formal, está condicionada à ampla divulgação, à realização de consultas/audiências públicas para discussão da proposta e para o recebimento de sugestões da comunidade e à deliberação pelo Conselho Municipal do Plano Diretor (art. 310, inciso I, da Lei Municipal nº 2.146/2006). Obrigatória, ainda, a apresentação de estudos técnicos que subsidiem as alterações tendo em conta os possíveis impactos sobre a cidade, pois as medidas públicas envolvendo matéria urbanística pressupõem o adequado planejamento, tal como se extrai do art. 30, VIII, da CF/88, sendo, portanto, requisito de constitucionalidade. É o parecer, salvo melhor juízo. Guaíba, 18 de novembro de 2022. GUSTAVO DOBLER Procurador OAB/RS nº 110.114B Documento Assinado Digitalmente no padrão ICP-Brasil por:![]() 18/11/2022 18:24:41 |
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Documento publicado digitalmente por GUSTAVO DOBLER em 18/11/2022 ás 18:24:00. Chave MD5 para verificação de integridade desta publicação 18a8d9c01180d1e94a5fe7f4a2bbe6ad.
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