Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 139/2022
PROPONENTE : Ver. Miguel Crizel
     
PARECER : Nº 370/2022
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Cria o programa de incentivo à doação de cabelos para pessoas em tratamento de câncer no Município de Guaíba"

1. Relatório:

O Vereador Miguel Crizel apresentou o Projeto de Lei nº 139/2022 à Câmara Municipal, objetivando criar o Programa de Incentivo à Doação de Cabelos para Pessoas em Tratamento de Câncer no Município de Guaíba. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno.

2. Mérito:

De fato, a norma insculpida no art. 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba prevê que cabe ao Presidente do Legislativo a prerrogativa de devolver ao autor as proposições manifestadamente inconstitucionais (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou ainda aquelas de caráter pessoal (art. 105, III). O mesmo controle já é exercido no âmbito da Câmara dos Deputados, com base em seu Regimento Interno (art. 137, § 1º) e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI), e foi replicado em diversos outros regimentos internos de outros parlamentos brasileiros.

A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame superficial pela Presidência da Mesa Diretora, com natureza preventiva e interna, antes que a proposição possa percorrer o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução se perfaz por despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único).

Inicialmente, verifica-se estar adequada a iniciativa para a deflagração do processo legislativo, já que o projeto de lei apresentado propõe a criação do Programa de Incentivo à Doação de Cabelos para Pessoas em Tratamento de Câncer no Município de Guaíba. Não há qualquer limitação constitucional à propositura de projeto de lei por vereador versando sobre a matéria tratada, desde que não sejam previstos deveres, obrigações ou mesmo permissões ao Poder Executivo quanto à logística e operacionalização da campanha. A propósito do tema, destaca-se o posicionamento da jurisprudência:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Lei nº 4.751/2014 que inclui no calendário oficial de eventos do Município a "Corrida Ciclística". Norma guerreada que não versou simplesmente sobre a instituição de data comemorativa no calendário oficial do Município, mas, ao revés, instituiu evento esportivo com criação de obrigações ao Executivo e despesas ao erário, sem previsão orçamentária e indicação da fonte e custeio. Afronta aos arts. 5º, 47, II e XIV, 25 e 144 da Carta Bandeirante, aplicáveis ao município por força do principio da simetria constitucional. Inconstitucionalidade reconhecida. [...] (TJ-SP - ADI: 21628784720148260000 SP 2162878-47.2014.8.26.0000, Relator: Xavier de Aquino, Data de Julgamento: 11/03/2015, Órgão Especial, Data de Publicação: 16/03/2015).

Quanto à matéria de fundo, não há qualquer óbice à proposição. Conforme dispõe o art. 30, I, da CF/88, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local”. No mesmo sentido, o art. 6º, I, da Lei Orgânica do Município de Guaíba refere: “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente, dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local”.

O Projeto de Lei do Legislativo nº 139/2022 se insere, efetivamente, na definição de interesse local, na medida em que institui, no Município de Guaíba, o Programa de Incentivo à Doação de Cabelos para Pessoas em Tratamento de Câncer, sem estabelecer obrigações ou encargos para a Administração Pública. A instituição de programas em âmbito municipal atende ao interesse local porque busca impulsionar setores, grupos ou atividades relevantes para a comunidade, incentivando o debate e a elaboração de novas políticas públicas.

Além disso, a proposição legislativa em análise tem sólido fundamento na CF/88, pois, em última análise, tutela a dignidade da pessoa humana, a promoção do bem comum e a solidariedade, valores retratados como fundamentos e objetivos da República Federativa do Brasil, nos termos seguintes:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...)

III - a dignidade da pessoa humana;

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; (...)

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, no Título VIII, que trata da “Ordem Social”, mais especificamente no Capítulo II, que compreende a Seguridade Social, estabelece que esta compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social (art. 194 da CF/88).

Mais especificamente, o art. 203 refere que a assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, tendo por objetivo a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; o amparo às crianças e adolescentes carentes; a promoção da integração ao mercado de trabalho; a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; e a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

É perceptível, pois, que a ação pretendida no Projeto de Lei nº 139/2022 é compatível com os interesses defendidos na CF/88 também no aspecto material.

3. Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula, por si só, a manifestação das comissões permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria opina pela legalidade e regular tramitação do Projeto de Lei do Legislativo nº 139/2022, por inexistirem vícios formais ou materiais que impeçam a sua deliberação em Plenário.

Sugere-se a substituição da palavra “onjetivos” por “objetivos” (art. 2º) e a retirada da vírgula no trecho “do Programa instituído por esta Lei,” (art. 4º). Ademais, necessária a substituição da palavra “promulgação” por “publicação” na cláusula de vigência do art. 5º.

É o parecer, salvo melhor juízo.

Guaíba, 27 de outubro de 2022.

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B

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27/10/2022 15:09:02
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