PARECER JURÍDICO |
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"Dispõe sobre a prevenção e conscientização dos riscos e consequências relacionados ao aborto." 1. Relatório:A Vereadora Carla Vargas apresentou o Projeto de Lei nº 134/2022 à Câmara Municipal, objetivando dispor sobre a prevenção e conscientização dos riscos e consequências relacionados ao aborto. A proposta foi encaminhada a esta Procuradoria Jurídica para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno. 2. Mérito:Preliminarmente, verifica-se que a norma inscrita no artigo 105 do Regimento Interno outorga ao Presidente do Legislativo a possibilidade de devolução ao autor de proposições maculadas por manifesta inconstitucionalidade (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou de caráter pessoal (art. 105, III). Solução similar é encontrada no Regimento Interno da Câmara dos Deputados (art. 137, § 1º) – parlamento em que o controle vem sendo exercido – e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI – em que a solução é o arquivamento) e em diversos outros regimentos de casas legislativas pátrias. A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame perfunctório pela Presidência da Mesa Diretora, considerado controle preventivo de constitucionalidade interno, antes que a proposição possa percorrer todo o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução é efetuada mediante despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único). Quanto ao conteúdo da matéria proposta, verifica-se que pretende criar deveres ao Executivo, para dispor que, no material informativo, publicitário, de propaganda ou didático sobre o aborto, editado pelo Poder Público, deverão constar claramente os riscos e consequências do aborto para a mulher. Pela proposição, também deverão os estabelecimentos públicos de saúde e assistência social afixar, em locais visíveis, placa com a informação de que é garantido o direito ao sigilo na entrega de criança para a adoção, como dispõe o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90). A matéria invade indevidamente a chamada reserva de administração, constante no art. 61, § 1º, da CF/88, substância central do princípio da separação de poderes, inscrito no art. 2º da CF/88, ao dispor sobre as atribuições do Poder Executivo, sobretudo das Secretarias de Saúde e de Assistência Social, o que cabe exclusivamente ao Chefe do Executivo decidir, por meio de atos administrativos. O Projeto de Lei do Legislativo nº 134/2022, ora em análise, vai de encontro, ainda, ao disposto no art. 60, II, “d”, da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, bem como afronta o previsto no art. 82, VII, do mesmo diploma:
Nessa perspectiva, Hely Lopes Meirelles leciona que não cabe ao Poder Legislativo, através de sua iniciativa legiferante, imiscuir-se em matéria tipicamente administrativa, em respeito ao princípio constitucional da separação dos poderes (art. 2º da CF/88 e art. 10 da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul):
A proposição trata, eminentemente, de disciplina tipicamente administrativa, a qual constitui atribuição político-administrativa do Prefeito, caracterizando inconstitucionalidade material e formal. Não cabe à lei de iniciativa parlamentar definir as políticas de prevenção ao aborto a serem realizadas pelos órgãos do Poder Executivo, por tratar-se de competência privativa do Prefeito, na esfera da sua discricionariedade. O Projeto de Lei do Legislativo nº 134/2022 apresenta, com base nos mesmos fundamentos, vício de iniciativa frente à LOM de Guaíba, que, em seu art. 119, reserva a competência exclusiva ao Chefe do Poder Executivo Municipal nos projetos de lei que tratem da organização administrativa, inclusive quanto às atribuições dos órgãos públicos:
Assim, embora sejam admiráveis a justificativa e os termos da proposta, o Projeto de Lei do Legislativo nº 134/2022 contém vício de iniciativa e afronta ao princípio da separação dos poderes, por dispor sobre matéria cuja iniciativa é reservada ao Chefe do Executivo, nos termos dos artigos 2º e 61, § 1º, II, “b”, da CF/88, dos artigos 5º, 60, II, “d”, e 82, VII, da CE/RS e artigo 119, II, da Lei Orgânica Municipal. 3. Conclusão:Diante do exposto, com base nos fundamentos expostos, a Procuradoria orienta pela possibilidade de o Presidente, por meio de despacho fundamentado, devolver à autora a proposição em epígrafe (PLL nº 134/2022), pela caracterização de inconstitucionalidade formal por vício de iniciativa (art. 61, § 1º, II, “b”, da CF/88; art. 60, II, “d”; e art. 82, VII, da CE/RS) e de inconstitucionalidade material por afronta ao princípio da separação dos poderes (art. 2º da CF/88; art. 5º da CE/RS), bem como afronta ao art. 119, II, da Lei Orgânica Municipal. É o parecer, salvo melhor juízo. Guaíba, 27 de outubro de 2022. GUSTAVO DOBLER Procurador OAB/RS nº 110.114B Documento Assinado Digitalmente no padrão ICP-Brasil por:![]() 27/10/2022 17:36:55 |
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Documento publicado digitalmente por GUSTAVO DOBLER em 27/10/2022 ás 17:36:34. Chave MD5 para verificação de integridade desta publicação 83f726768d19c72696cf5046ba0ba41f.
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