PARECER JURÍDICO |
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"Autoriza o Poder Executivo Municipal a contratar temporariamente 06 (seis) Agentes Comunitários de Saúde, 30 (trinta) Agentes de Combate a Endemias, 01 (um) Contador, 05 (cinco) Enfermeiros e 03 (três)Terapeutas Ocupacionais e dá outras providências." 1. RelatórioO Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 064/2022 à Câmara Municipal, que objetiva autorizá-lo a contratar temporariamente seis Agentes Comunitários de Saúde, trinta Agentes de Combate a Endemias, um Contador, cinco Enfermeiros e três Terapeutas Ocupacionais. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno. 2. FUNÇÕES DA PROCURADORIA JURÍDICAA Procuradoria Jurídica da Câmara de Guaíba, órgão consultivo com previsão no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18, exerce as funções de assessoramento jurídico e de orientação da Mesa Diretora, da Presidência da Casa e dos setores legislativos, através da emissão de pareceres escritos e verbais, bem como de opiniões fundamentadas objetivando a tomada de decisões, por meio de reuniões, de manifestações escritas e de aconselhamentos. Trata-se de órgão público que, embora não detenha competência decisória, orienta juridicamente o gestor público e os setores legislativos, sem caráter vinculante. Os pareceres jurídicos são atos resultantes do exercício da função consultiva desta Procuradoria Jurídica, no sentido de alertar para eventuais inconformidades que possam estar presentes. Conforme leciona Hely Lopes Meirelles na obra Direito Administrativo Brasileiro, 41ª ed., Malheiros Editores: São Paulo, 2015, p. 204, “O parecer tem caráter meramente opinativo, não vinculando a Administração ou os particulares à sua motivação ou conclusões, salvo se aprovado por ato subsequente. Já, então, o que subsiste como ato administrativo não é o parecer, mas, sim, o ato de sua aprovação, que poderá revestir a modalidade normativa, ordinatória, negocial ou punitiva.” Desse modo, a função consultiva desempenhada por esta Procuradoria com base no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18 – que dispõe sobre a organização administrativa da Câmara Municipal de Guaíba – não é vinculante, motivo pelo qual é possível, se for o caso, que os agentes políticos formem suas próprias convicções em discordância com as opiniões manifestadas por meio do parecer jurídico. 3. MÉRITO3.1 Da competência e da iniciativa Quanto à competência, não há óbice à proposta. Conforme dispõe o artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, o artigo 6º, I, da Lei Orgânica do Município de Guaíba refere que “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente, dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local”. Alexandre de Moraes expõe que "interesse local refere-se aos interesses que disserem respeito mais diretamente às necessidades imediatas do município, mesmo que acabem gerando reflexos no interesse regional (Estados) ou geral (União)." (in Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 9ª ed., São Paulo: Atlas, 2013, p. 740). Assim, a matéria constante na proposta se adéqua efetivamente à definição de interesse local. A respeito da iniciativa para a deflagração do processo legislativo, uma vez que o projeto de lei apresentado propõe contratação temporária de agentes para o Poder Executivo, tem-se por adequada a iniciativa do Prefeito, ao qual cabem as competências privativas dos arts. 52 e 119 da Lei Orgânica Municipal:
Para os fins do direito municipal, mais relevante ainda é a observância das normas previstas na Constituição Estadual no que diz respeito à iniciativa para o processo legislativo, já que, em caso de eventual controle de constitucionalidade, o parâmetro para a análise da conformidade vertical se dá em relação ao disposto na Constituição Gaúcha, conforme preveem o artigo 125, § 2º, da CF/88 e o artigo 95, XII, alínea “d”, da CE/RS. Apenas excepcionalmente o parâmetro da constitucionalidade será a Constituição Federal, desde que se trate de normas constitucionais de reprodução obrigatória (STF, RE nº 650.898/RS). Nesse caso, refere o artigo 60 da CE/RS:
Portanto, foram respeitadas a iniciativa e a competência para a propositura do Projeto de Lei nº 064/2022, pois apresentado pelo Executivo Municipal, enquanto responsável pela sua organização administrativa. 3.2 Do conteúdo do Projeto de Lei do Executivo nº 064/2022 O PL nº 064/2022, de autoria do Poder Executivo, pretende autorizar que o Município contrate temporariamente, através do permissivo do art. 37, inciso IX, da CF/88, seis Agentes Comunitários de Saúde, trinta Agentes de Combate a Endemias, um Contador, cinco Enfermeiros e três Terapeutas Ocupacionais, valendo-se de processo seletivo simplificado, mediante análise curricular, títulos e entrevista pessoal (art. 2º, caput e parágrafo único). O proponente justifica a proposição com os seguintes argumentos: a) Agentes Comunitários de Saúde e Agentes de Combate a Endemias: existe um déficit de pessoal nas equipes municipais e que em breve deve ocorrer o aumento da transmissão da dengue; b) Contador: com a pandemia, elevou-se substancialmente a demanda no Departamento de Finanças e Orçamento, sendo necessário mais um profissional; c) Enfermeiros: após fiscalização do COREN/RS, verificou-se a falta de enfermeiros em algumas unidades de saúde, sendo necessário o imediato preenchimento; d) Terapeutas Ocupacionais: são essenciais à manutenção dos serviços de saúde mental. Com efeito, há permissivo constitucional da contratação por tempo determinado, desde que esteja atendida a necessidade temporária de excepcional interesse público:
Em âmbito local, o permissivo constitucional (art. 37, inciso IX, da CF/88) foi regulamentado pelo Estatuto do Servidor Público do Município de Guaíba, que prevê, em seu Título X, a contratação temporária de excepcional interesse público:
No entanto, apesar do permissivo constitucional e legal, é preciso atentar que a admissão de Agentes de Combate a Endemias e Agentes Comunitários de Saúde têm peculiaridades jurídicas que decorrem de disciplina jurídica específica na Constituição Federal de 1988 e na Lei nº 11.350/06. A matéria foi regulada constitucionalmente pela EC nº 51/06 e pela EC nº 63/10, que acrescentaram os §§ 4º, 5º e 6º ao art. 198 da CF/88:
Sabe-se que a regra geral para o provimento de cargos e empregos na Administração Pública é o concurso público (art. 37, II, da CF/88). A Constituição Federal, contudo, traz algumas exceções, tais como as hipóteses de nomeação para cargos em comissão e a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público. Devido à EC nº 51/2006, também ingressa como exceção à regra do concurso público a contratação de Agentes Comunitários de Saúde e de Agentes de Combate às Endemias, que deve ocorrer por processo seletivo público, em conformidade com a natureza e a complexidade das atribuições e os requisitos específicos para atuação. Além disso, pela redação constitucional, a definição do regime jurídico dos Agentes Comunitários de Saúde e dos Agentes de Combate às Endemias cabe à legislação federal, que deve dispor sobre piso profissional nacional, diretrizes de planos de carreira e prestação de assistência financeira pela União aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios. Essa regulamentação está na Lei nº 11.350, de 5 de outubro de 2006, que dispôs, com maior detalhamento, sobre os cargos públicos, a contratação e a carreira dos agentes. Da disciplina legal, é possível extrair os principais destaques:
Verifica-se que: a) os Agentes Comunitários de Saúde e os Agentes de Combate a Endemias submetem-se, como regra, ao regime celetista, salvo se a lei local dispuser de modo diverso, prevendo a aplicação do regime estatutário; b) a contratação, como já referido, ocorre por processo seletivo público; c) há piso salarial profissional nacional fixado de forma escalonada; d) compete aos gestores locais do SUS a criação dos cargos ou empregos públicos e a definição dos aspectos inerentes às atividades; e) é vedada, como regra, a contratação temporária ou terceirizada de Agentes Comunitários de Saúde e de Agentes de Combate às Endemias, com exceção da hipótese de combate a surtos epidêmicos. Como se percebe, só é possível contratar temporariamente Agentes de Combate às Endemias e Agentes Comunitários de Saúde para combater surtos epidêmicos, sendo esse um requisito indispensável à regularidade jurídica da medida pretendida. A respeito do assunto, a jurisprudência do TCE/RS vem se manifestando no sentido de negar registro às admissões de agentes temporários para a função de combate a endemias ou saúde comunitária quando não estejam justificadas para o enfrentamento de surtos epidêmicos. Leia-se, por exemplo, a Auditoria de Admissão nº 012613-0200/17-4:
Também, a Auditoria de Admissão nº 009654-0200/17-9:
Portanto, considerando que o Tribunal de Contas aprecia, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal referentes às contratações de excepcional interesse público (art. 71, III, da CF/88), essencial que fique demonstrada a direta vinculação da contratação temporária de Agentes Comunitários de Saúde e Agentes de Combate a Endemias ao enfrentamento de surtos epidêmicos. Nos casos de contratação temporária, não é necessária a realização de concurso público, exigindo-se, como regra, a realização de processo seletivo simplificado (art. 3º, caput, da Lei nº 8.745/1993). As Cortes de Contas têm sido rígidas quanto à obrigatoriedade de realizar o processo seletivo com critérios objetivos para efetivação das contratações autorizadas em lei. Veja-se o exarado pelo TCE/RS e em seguida pelo TCU:
O TCE/SC, no Prejulgado nº 1927, estabeleceu um rol exemplificativo de critérios que o edital de seleção precisa conter para que sejam atendidos os princípios constitucionais fundamentais para a lisura e idoneidade do processo, a fim de orientar os gestores e seus servidores na elaboração do edital. Leia-se, ainda, o entendimento do TCE/SP:
Nesse sentido, foi devidamente prevista no art. 2º, parágrafo único, a realização de processo seletivo simplificado, com a análise curricular, títulos e entrevista pessoal, estando, logo, atendida a exigência do art. 3º, caput, da Lei Federal nº 8.745/1993. Verifica-se estar correta a proposição no sentido de fixar um prazo determinado à duração do contrato, com previsão da possibilidade de prorrogação pelo idêntico período de 6 meses, tendo em vista que a providência está justificada na exata medida das necessidades de atendimento das demandas. Importante, também, destacar o tema de repercussão geral do STF nº 612, quanto aos requisitos para que se considere válida a contratação temporária de servidores públicos:
Constata-se, ademais, que a configuração da seleção a ser adotada pela Administração Municipal na proposta em análise está de acordo com parâmetros estabelecidos pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul (TCE-RS) na Informação 010/2011. De qualquer modo, as comissões permanentes, se assim entenderem necessário, poderão solicitar novas informações e justificativas do Poder Executivo que embasem a necessidade da contratação excepcional dos agentes temporários, cabendo lembrar, ainda, que o Tribunal de Contas aprecia, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal referentes às contratações de excepcional interesse público (art. 71, III, da Constituição Federal), sendo da responsabilidade do Prefeito a regularidade da admissão. 4. ConclusãoDiante do exposto, respeitada a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula, por si só, a manifestação das comissões permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria opina pela legalidade e regular tramitação do Projeto de Lei do Executivo nº 064/22, desde que esteja devidamente comprovado que a contratação temporária de Agentes Comunitários de Saúde e de Agentes de Combate a Endemias serve ao combate de surtos epidêmicos, o que é requisito previsto na legislação federal (art. 16 da Lei nº 11.350/2006). É o parecer, salvo melhor juízo. Guaíba, 27 de setembro de 2022. GUSTAVO DOBLER Procurador OAB/RS nº 110.114B Documento Assinado Digitalmente no padrão ICP-Brasil por:![]() 27/09/2022 21:14:45 |
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Documento publicado digitalmente por GUSTAVO DOBLER em 27/09/2022 ás 21:12:51. Chave MD5 para verificação de integridade desta publicação 2af4ef94a07c8267dc4cae9914e0a664.
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