PARECER JURÍDICO |
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"Dispõe sobre a comercialização ambulante de alimentos e bebidas sobre rodas - Food Trucks, nos espaços públicos, logradouros, praças e largos e dá outras providências" 1. RelatórioA Ver. Carla Vargas apresentou o Projeto de Lei nº 101/2022 à Câmara Municipal, que dispõe sobre a comercialização ambulante de alimentos e bebidas sobre rodas nos espaços públicos, logradouros, praças e largos. A proposição foi encaminhada a esta Procuradoria para análise com fulcro no art. 105 do RI. 2. MÉRITOPreliminarmente, verifica-se que a norma inscrita no artigo 105 do Regimento Interno outorga ao Presidente do Legislativo a possibilidade de devolução ao autor de proposições maculadas por manifesta inconstitucionalidade (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou de caráter pessoal (art. 105, III). Solução similar é encontrada no Regimento Interno da Câmara dos Deputados (art. 137, § 1º) – parlamento em que o controle vem sendo exercido – e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI – em que a solução é o arquivamento) e em diversos outros regimentos de casas legislativas pátrias. A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame perfunctório pela Presidência da Mesa Diretora, considerado controle preventivo de constitucionalidade interno, antes que a proposição possa percorrer todo o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução é efetuada mediante despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único). Quanto ao conteúdo da matéria proposta, verifica-se que pretende dispor sobre a comercialização ambulante de alimentos e bebidas sobre rodas – food trucks – em espaços públicos, o que caracteriza inconstitucionalidade formal por vício de iniciativa, com base no princípio da separação dos poderes, dado que há restrição de iniciativa neste caso. A matéria invade indevidamente a chamada reserva de administração, constante no art. 61, § 1º, da CF/88, substância central do princípio da separação de poderes, inscrito no art. 2º da CF/88, ao dispor sobre a comercialização de alimentos e bebidas em espaços públicos, o que cabe exclusivamente ao Chefe do Executivo decidir, por meio de atos administrativos, por ser o responsável pelo gerenciamento dos bens públicos. O Projeto de Lei nº 101/2022, ora em análise, vai de encontro, ainda, ao disposto no art. 60, II, “d”, da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, bem como afronta o previsto no art. 82, VII, do mesmo diploma:
Nessa perspectiva, Hely Lopes Meirelles leciona que não cabe ao Poder Legislativo, através de sua iniciativa legiferante, imiscuir-se em matéria tipicamente administrativa, em respeito ao princípio constitucional da separação dos poderes (art. 2º da CF/88 e art. 10 da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul):
A proposição trata, eminentemente, de disciplina tipicamente administrativa, a qual constitui atribuição político-administrativa do Prefeito, caracterizando inconstitucionalidade material e formal. Não cabe à lei de iniciativa parlamentar definir as possibilidades de utilização dos espaços públicos para a comercialização de alimentos, por se tratar de matéria de competência privativa do Chefe do Executivo, na esfera de sua discricionariedade. O Projeto de Lei nº 101/2022 apresenta, com base nos mesmos fundamentos, vício de iniciativa frente à Lei Orgânica Municipal de Guaíba, que, em seu art. 119, reserva a competência exclusiva ao Chefe do Poder Executivo Municipal nos projetos de lei que tratem da organização administrativa, inclusive quanto às atribuições dos órgãos públicos:
Assim, embora sejam admiráveis a justificativa e os termos da proposta, o PL nº 101/2022 contém vício de iniciativa e viola o princípio da separação dos poderes, por dispor sobre matéria cuja iniciativa é reservada ao Chefe do Executivo, nos termos dos artigos 2º e 61, § 1º, II, b, da CF/88, dos artigos 5º, 60, II, d, e 82, VII, da CE/RS e artigo 119, II, da LOM. 3. ConclusãoDiante do exposto, com base nos fundamentos expostos, a Procuradoria orienta pela possibilidade de o Presidente, por meio de despacho fundamentado, devolver à autora a proposta em epígrafe (PLL nº 101/2022), pela caracterização de inconstitucionalidade formal por vício de iniciativa (art. 61, § 1º, II, b, da CF/88; arts. 60, II, d, e 82, VII, da CE/RS) e de inconstitucionalidade material por afronta ao princípio da separação dos poderes (art. 2º da CF/88; art. 5º da CE/RS), bem como afronta ao art. 119, II, da Lei Orgânica Municipal. É o parecer, salvo melhor juízo. Guaíba, 8 de agosto de 2022. GUSTAVO DOBLER Procurador OAB/RS nº 110.114B Documento Assinado Digitalmente no padrão ICP-Brasil por:![]() 08/08/2022 14:16:25 |
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Documento publicado digitalmente por GUSTAVO DOBLER em 08/08/2022 ás 14:15:42. Chave MD5 para verificação de integridade desta publicação 5f76dfec177b6ea851c5f05dcfd66405.
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