PARECER JURÍDICO |
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"Dispõe sobre a concessão do direito a um dia de folga anual, às servidoras públicas municipais estatutárias, comissionadas e empregadas celetistas para a realização de exames de controle de câncer" 1. RelatórioO Vereador Alex Medeiros apresentou o Projeto de Lei nº 096/22 à Câmara Municipal, objetivando dispor sobre a concessão do direito a um dia de folga anual às servidoras públicas municipais estatutárias, comissionadas e empregadas celetistas para a realização de exames de controle de câncer. A proposta foi encaminhada a esta Procuradoria Jurídica para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno. 2. MÉRITOPreliminarmente, verifica-se que a norma inscrita no artigo 105 do Regimento Interno outorga ao Presidente do Legislativo a possibilidade de devolução ao autor de proposições maculadas por manifesta inconstitucionalidade (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou de caráter pessoal (art. 105, III). Solução similar é encontrada no Regimento Interno da Câmara dos Deputados (art. 137, § 1º) – parlamento em que o controle vem sendo exercido – e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI – em que a solução é o arquivamento) e em diversos outros regimentos de casas legislativas pátrias. A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame perfunctório pela Presidência da Mesa Diretora, considerado controle preventivo de constitucionalidade interno, antes que a proposição possa percorrer todo o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução é efetuada mediante despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único). O artigo 18 da Constituição Federal de 1988, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo “autonomia política”, sob o ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir sua organização, legislação, administração e governo próprios. A autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios, é tratada no artigo 30 da Lei Maior, nos seguintes termos:
O Projeto de Lei nº 096/2022 se insere, em parte, na definição de interesse local, uma vez que, ao dispor sobre a concessão do direito ao afastamento, uma vez ao ano, para empregadas celetistas realizarem exames de câncer, a proposta adentra em matéria de Direito do Trabalho, cuja competência legislativa é privativa da União (art. 22, I, da CF/88). Em relação às servidoras estatutárias, sejam efetivas, sejam comissionadas, embora não haja violação da competência legislativa, dado que se trata de matéria de interesse local (art. 30, I, da CF/88), verifica-se afronta à reserva de iniciativa estabelecida no art. 60, II, “b”, e no art. 82, VII, ambos da CE/RS, de modo que a proposição possui vício de inconstitucionalidade formal por violação das regras de iniciativa reservada:
Nessa perspectiva, Hely Lopes Meirelles leciona que não cabe ao Poder Legislativo, através de sua iniciativa legiferante, imiscuir-se em matéria tipicamente administrativa, em respeito ao princípio constitucional da separação dos poderes (art. 2º da CF/88 e art. 10 da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul):
O PL nº 096/2022 apresenta, com base nos mesmos fundamentos, vício de iniciativa frente à LOM de Guaíba, que, em seu art. 119, reserva a competência exclusiva ao Chefe do Executivo nos projetos de lei que tratem do regime jurídico dos servidores públicos:
Assim, embora sejam admiráveis a justificativa e os termos da proposta, o Projeto de Lei nº 096/2022 afronta competência legislativa da União e contém vício de iniciativa, por dispor sobre matéria cuja iniciativa é reservada ao Chefe do Executivo, na forma do art. 22, I, da CF/88, dos arts. 60, II, “b”, e 82, VII, da CE/RS e art. 119, III, da LOM. 3. ConclusãoDiante do exposto, com base nos fundamentos expostos, a Procuradoria orienta pela possibilidade de o Presidente, por meio de despacho fundamentado, devolver ao autor a proposta em epígrafe (PL nº 096/2022), pela caracterização de inconstitucionalidade formal orgânica e por vício de iniciativa (art. 22, I, da CF/88; arts. 60, II, “b”, e 82, VII, da CE/RS), bem como por afronta ao art. 119, III, da Lei Orgânica Municipal. Como o direito ao afastamento para realizar exames preventivos de câncer já é um direito previsto na CLT para empregados e empregadas (art. 473, XII – “até 3 (três) dias, em cada 12 (doze) meses de trabalho, em caso de realização de exames preventivos de câncer devidamente comprovada”), sugere-se a elaboração de requerimentos questionando a aplicação da lei. Em relação aos servidores/servidoras estatutárias (efetivos e comissionados), sugere-se a remessa de indicação ao Prefeito para que acrescente, preferencialmente no art. 48 do Estatuto dos Servidores Públicos, o mesmo direito previsto na CLT. É o parecer, salvo melhor juízo. Guaíba, 4 de agosto de 2022. GUSTAVO DOBLER Procurador OAB/RS nº 110.114B Documento Assinado Digitalmente no padrão ICP-Brasil por:![]() 04/08/2022 14:38:37 |
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Documento publicado digitalmente por GUSTAVO DOBLER em 04/08/2022 ás 14:37:33. Chave MD5 para verificação de integridade desta publicação 16bbc4925af6c40487262c3ee090629d.
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