Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 033/2022
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 241/2022
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Altera as Leis Municipais n.ºs 3571/2017, 3815/2019 e 3960/2021, que dispõem sobre Programa de Recuperação de Créditos - REFIS dos anos 2017, 2019 e 2021, e dá outras providências, convalidando os atos administrativos baseados nas alterações"

1. Relatório

O Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 033/2022 à Câmara Municipal, objetivando alterar as Leis Municipais nº 3.571/2017, 3.815/2019 e 3.960/2021, que dispõem sobre o Programa de Recuperação de Créditos – REFIS dos exercícios de 2017, 2019 e 2021, convalidando os atos administrativos baseados nas alterações. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno. O parecer orientou pela ausência de inconstitucionalidade manifesta, com alguns alertas. O proponente apresentou substitutivo, que tramitou perante as comissões permanentes. O Ver. Miguel Crizel apresentou emenda, tendo a Comissão de Constituição, Justiça e Redação solicitado parecer jurídico a esta Procuradoria.

2. MÉRITO

O presente parecer jurídico restringe-se à emenda apresentada pelo Ver. Miguel Crizel ao projeto, na medida em que a análise jurídica referente à proposição como um todo já foi realizada anteriormente.

A respeito desse assunto, não é vedada, em regra, a apresentação de emendas parlamentares a projetos de lei de iniciativa exclusiva do Chefe do Executivo, pois exercida previamente a iniciativa pelo Prefeito. Os limites para o exercício desse poder estão fixados, inicialmente, no artigo 63 da Constituição Federal, que prevê:

Art. 63. Não será admitido aumento da despesa prevista:

I - nos projetos de iniciativa exclusiva do Presidente da República, ressalvado o disposto no art. 166, § 3º e § 4º;

II - nos projetos sobre organização dos serviços administrativos da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, dos Tribunais Federais e do Ministério Público.

Na Constituição Estadual, a matéria é regulada pelo artigo 61, que estabelece:

Art. 61.  Não será admitido aumento na despesa prevista:

I - nos projetos de iniciativa privativa do Governador, ressalvado o disposto no art. 152;

II - nos projetos sobre organização dos serviços administrativos da Assembléia Legislativa, dos Tribunais e do Ministério Público.

Por fim, na esfera municipal, refere o artigo 46-A da Lei Orgânica de Guaíba:

Art. 46-A Não será admitido aumento na despesa prevista:

I - nos projetos de iniciativa exclusiva do Prefeito;

II - nos projetos sobre organização dos serviços administrativos da Câmara Municipal. (Redação acrescida pela Emenda à Lei Orgânica nº 2/2017)

O mais importante, portanto, no caso de emendas parlamentares a projetos de iniciativa do Executivo, é que não ocorra o aumento da despesa prevista, uma vez que tal medida é capaz de prejudicar o erário público por não demonstrar a viabilidade econômico-financeira, interferindo, assim, na independência do Poder Executivo, gestor das contas públicas. Além disso, a jurisprudência pacífica defende que as emendas parlamentares devem guardar o grau de pertinência temática da proposta originária, isto é, não podem veicular matérias diferentes das previstas inicialmente, de modo a não desnaturá-las ou desconfigurá-las. Veja-se a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:

As normas constitucionais de processo legislativo não impossibilitam, em regra, a modificação, por meio de emendas parlamentares, dos projetos de lei enviados pelo chefe do Poder Executivo no exercício de sua iniciativa privativa. Essa atribuição do Poder Legislativo brasileiro esbarra, porém, em duas limitações: a) a impossibilidade de o parlamento veicular matérias diferentes das versadas no projeto de lei, de modo a desfigurá-lo; e b) a impossibilidade de as emendas parlamentares aos projetos de lei de iniciativa do Presidente da República, ressalvado o disposto no § 3º e no § 4º do art. 166, implicarem aumento de despesa pública (inciso I do art. 63 da CF). [ADI 3.114, rel. min. Ayres Britto, j. 24-8-2005, P, DJ de 7-4-2006.] = ADI 2.583, rel. min. Cármen Lúcia, j. 1º-8-2011, P, DJE de 26-8-2011.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 2º DA LEI GAÚCHA N. 11.639/2001. CADASTRO DE CONTRATAÇÕES TEMPORÁRIAS. CRIAÇÃO DE PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS QUE DEVEM SER OBSERVADOS PELO PODER EXECUTIVO NA CONTRATAÇÃO DE SERVIDORES TEMPORÁRIOS. EMENDAS PARLAMENTARES EM PROJETO DE LEI DE INICIATIVA DO GOVERNADOR DO ESTADO. INOCORRÊNCIA DE INVASÃO DA COMPETÊNCIA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA IMPROCEDENTE. 1. As emendas parlamentares aos projetos de lei de iniciativa privativa do Poder Executivo e Judiciário são admitidas, desde que guardem pertinência temática com o projeto e não importem em aumento de despesas. 2. As normas impugnadas, decorrentes de emendas parlamentares, estabelecem o procedimento a ser adotado pelo Poder Executivo estadual para a realização de inscrições no Cadastro de Contratações Temporárias, tema não incluído entre aqueles cujos projetos de lei são de iniciativa privativa do Governador do Estado. [...] (ADI 2583, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, j. em 01/08/2011, DJe-164 DIVULG 25-08-2011 PUBLIC 26-08-2011 EMENT VOL-02574-01 PP-00001).

No mesmo sentido, a jurisprudência do Tribunal de Justiça Gaúcho:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI MUNICIPAL N.º 4.620/2016, DO MUNICÍPIO DE URUGUAIANA. PLANO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO. EMENDAS PARLAMENTARES. IMPOSSIBILIDADE DE AUMENTO DE DESPESA EM PROJETO DE INICIATIVA PRIVATIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO MUNICIPAL. 1. A Constituição Estadual, em seu art. 60, inc. II, delimita quais são as matérias cujas leis são de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, sendo tal dispositivo aplicável aos Municípios, por simetria. É inquestionável o cabimento das emendas parlamentares em projetos de lei de iniciativa reservada, porém, tais emendas devem guardar relação com a temática original da proposição e não podem implicar aumento de despesa, o art. 61, inc. I, da CE, também aplicável aos Municípios por simetria. [...] JULGARAM PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO FORMULADO NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. UNÂNIME. (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70072358336, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 07/08/2017)

AÇÃO DECLARATÓRIA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI MUNICIPAL. MATÉRIA DE INICIATIVA PRIVATIVA DO PODER EXECUTIVO. LIMITES AO PODER DE EMENDA DO PODER LEGISLATIVO. Em matérias de iniciativa privativa ou reservada ao Poder Executivo, o Poder Legislativo tem limites ao seu poder de emenda. Tais limites são a inviabilidade de aumentar despesas e a pertinência temática em relação ao projeto original. Precedentes do STF. Lição doutrinária. No presente caso, a matéria objeto do projeto de lei é de iniciativa privativa do Executivo. E o projeto de lei foi elaborado pelo próprio Executivo, não tendo ocorrido, na hipótese, vício de iniciativa. Contudo, ao longo da tramitação do processo legislativo, o Legislativo municipal emendou o projeto originário, acrescendo 02 artigos e alterando a redação de 01 artigo. Com tais emendas, considerando os seus respectivos teores, o Legislativo transcendeu seu poder de emenda, ao aumentar despesas para a Administração, ao acrescentar no projeto originário disposições que com ele não guardam pertinência temática estrita; e ao determinar a retroação dos efeitos da lei para antes da sua vigência, o que não é viável na hipótese tanto por gerar aumento de despesas, quanto por impor retroação de lei com efeito punitivo. Decreta-se a inconstitucionalidade integral dos artigos 3º e 4º da Lei Municipal n.º 4.439/2016; e a inconstitucionalidade parcial do art. 5º da mesma lei, com redução de texto. JULGARAM PARCIALMENTE PROCEDENTE. UNÂNIME. (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70068690429, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 01/08/2016)

A emenda protocolada em momento algum traduz aumento de despesas ao Executivo ou se afasta da temática tratada na proposição. No caso, a emenda propõe a divulgação dos beneficiários do REFIS no sítio eletrônico da Prefeitura, com a justificativa de garantir a publicidade que rege a Administração Pública, nos termos do art. 37, caput, da Constituição Federal de 1988.

A justificativa apresentada é plausível, respeita as exigências constitucionais e satisfaz os princípios que informam a atividade administrativa. Logo, na perspectiva dos precedentes jurisprudenciais levantados, considerando que a emenda parlamentar não aumenta a despesa e guarda pertinência temática com a proposição original, deve ser considerada viável sob o ponto de vista constitucional.

No aspecto da legalidade, ou seja, da legislação infraconstitucional, ainda que a emenda tenha sido editada em observância à orientação técnica do IGAM, faz-se necessária mais uma correção, pois a redação desatende ao disposto no art. 198, § 3º, inciso IV, do Código Tributário Nacional (CTN), incluído pela Lei Complementar nº 187/2021:

Art. 198 [...]

§ 3º Não é vedada a divulgação de informações relativas a: [...]

IV – incentivo, renúncia, benefício ou imunidade de natureza tributária cujo beneficiário seja pessoa jurídica.

Em outras palavras, a redação legal, em atenção ao direito fundamental à intimidade e à vida privada, do qual o sigilo fiscal é um desdobramento, estabelece que só é permitida a divulgação dos benefícios tributários de que pessoas jurídicas sejam beneficiárias, não sendo autorizada a ampla divulgação daqueles concedidos às pessoas físicas. Dessa forma, a emenda apresentada necessita ser ajustada, no art. 6º, para que somente sejam divulgadas as informações referentes aos benefícios recebidos por pessoas jurídicas.

3. Conclusão

Diante do exposto, na forma do parecer jurídico acostado anteriormente, a Procuradoria opina pela constitucionalidade da emenda parlamentar apresentada, pois guarda pertinência temática com a proposição original e não aumenta a despesa do Poder Executivo. No entanto, com fundamento no art. 198, § 3º, inciso IV, do Código Tributário Nacional, é necessária nova correção, especificamente sobre o art. 6º, no sentido de que somente os beneficiários pessoas jurídicas tenham divulgadas informações sobre os benefícios.

Sugere-se, assim, a redação de nova emenda, nos mesmos moldes da apresentada, com a diferença de que, na alteração do art. 6º, conste: “As pessoas jurídicas beneficiárias desta Lei serão divulgadas no sítio eletrônico da Prefeitura”.

É o parecer, salvo melhor juízo.

Guaíba, 22 de julho de 2022.

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B

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22/07/2022 17:46:07
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