Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 028/2022
PROPONENTE : Ver.ª Carla Vargas
     
PARECER : Nº 098/2022
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Dispõe sobre o atendimento preferencial aos doadores de sangue em Guaíba e dá outras providências"

1. Relatório:

A Vereadora Carla Vargas (PTB) apresentou à Câmara Municipal de Guaíba o Projeto de Lei nº 028/2022, o qual “Dispõe sobre o atendimento preferencial aos doadores de sangue em Guaíba e dá outras providências”. A proposta foi encaminhada à Procuradoria Jurídica pelo Presidente da Câmara Municipal para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno, a fim de que seja efetivado o controle quanto à constitucionalidade, à competência da Câmara e ao caráter pessoal das proposições.

2. MÉRITO:

De fato, a norma insculpida no art. 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba prevê que cabe ao Presidente do Legislativo a prerrogativa de devolver ao autor as proposições manifestadamente inconstitucionais (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou ainda aquelas de caráter pessoal (art. 105, III). O mesmo controle já é exercido no âmbito da Câmara dos Deputados, com base em seu Regimento Interno (art. 137, § 1º), e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI), e foi replicado em diversos outros regimentos internos de outros parlamentos brasileiros.

A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do Regimento Interno caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame superficial pela Presidência da Mesa Diretora, com natureza preventiva e interna, antes que a proposição possa percorrer o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução se perfaz por despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, podendo o autor recorrer da decisão ao Plenário (art. 105, parágrafo único).

Efetivamente, a proposição encontra respaldo no que diz respeito à autonomia e à competência legislativa do Município, insculpidas no artigo 18 da CF/88:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

 IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

Alexandre de Moraes afirma que "interesse local refere-se aos interesses que disserem respeito mais diretamente às necessidades imediatas do município, mesmo que acabem gerando reflexos no interesse regional (Estados) ou geral (União)" (in Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 9ª ed., São Paulo: Atlas, 2013, p. 740).

A iniciativa para o processo legislativo, por sua vez, também está adequada, visto que o Projeto de Lei nº 028/2022 dispõe sobre a promoção da dignidade humana e a promoção da doação de sangue, no círculo da competência municipal sobre saúde, matérias para as quais a iniciativa é concorrente, porquanto não incidente sobre qualquer dos temas de iniciativa privativa:

Art. 60. São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que:

I - fixem ou modifiquem os efetivos da Brigada Militar e do Corpo de Bombeiros Militar; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 67, de 17/06/14)

II - disponham sobre:

a) criação e aumento da remuneração de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta ou autárquica;

b) servidores públicos do Estado, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria de civis, e reforma ou transferência de militares para a inatividade;

c) organização da Defensoria Pública do Estado;

d) criação, estruturação e atribuições das Secretarias e órgãos da administração pública.

Destarte, a proposição está apropriada quanto à iniciativa para deflagração do processo legislativo. Quanto à matéria de fundo, também não há óbices. Isso porque o texto constitucional determina a obrigação do Estado, em sentido amplo, incentivar a doação de sangue, especificamente através das disposições constantes na A Política Nacional de Sangue, Componentes e Hemoderivados criada pela Lei nº 10.205/2001 que tem como um de seus objetivos incentivar as campanhas educativas de estímulo à doação regular de sangue.

Portanto, à luz dos fundamentos expostos, é possível reconhecer aos doadores de sangue, como já foi reconhecido aos portadores de, estendendo-lhes o direito de receber atendimento preferencial. Por oportuno, vale ressaltar que, de acordo com a orientação técnica nº 11.145/19 do IGAM,

No que se refere aos arts. 2º e 3º, considerando que não se está criando qualquer ônus aos empreendimentos comerciais e de prestação de serviços, não se identifica configuração de inconstitucionalidade ao impor atendimento preferencial aos fibromiálgicos, tampouco aos lhes garantir o uso de vagas preferenciais, em estacionamentos, reservadas aos idosos, gestantes e pessoas com deficiência. Recomenda-se, contudo, que o art. 3º seja alterado para que sua redação passe a constar da seguinte forma: “Art. 3º Será permitido aos portadores de Fibromialgia estacionar em vagas já destinadas às pessoas com deficiência.” Alteração justifica-se pela categorização da situação que envolve os fibromiálgicos, pois eles não entram em paralelo com idoso e com gestante, mas com pessoa com deficiência.

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo já julgou constitucional a Lei n.º 8.796, de 25 de setembro de 2012, do Município de São José dos Campos, a qual previu fomento aos doadores de sangue estabelecendo atendimento preferencial aos doadores na ADI 2038442320138260000, com acórdão a seguir ementado:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Lei nº 8.796/2012 do Município de São José dos Campos que assegurou aos doadores de sangue residentes no Município, atendimento preferencial em estabelecimentos comerciais que enumera - Alegado vício de iniciativa e afronta aos princípios da isonomia, razoabilidade e proporcionalidade - inocorrência - Política Nacional de Sangue criada Lei nº 10.205/01 que tem como objetivo incentivar as campanhas educativas de estímulo à doação regular de sangue, no sendo de iniciativa reservada - Atendimento preferencial assegurado aos Munícipes, que no tem caráter remuneratório, sequer estabelece ônus ou gera despesas de qualquer espécie à Municipalidade. Decreto de improcedência da Direta de Inconstitucionalidade.

...

Ora, o atendimento preferencial assegurado aos munícipes pela Lei n° 8.796, de 25 de setembro de 2.012, não tem caráter remuneratório, sequer estabelece ônus de qualquer espécie à Municipalidade ou gera despesas.

Pelos mesmos argumentos não se reconhecem violados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, atendendo a Lei atacada os objetivos e diretrizes que for aliás, ditados pelo artigo 199 da Constituição Federal e o dispositivo legal que o regulamentou, vale dizer, a Lei n° 10.205/01.

3. Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula, por si só, a manifestação das comissões permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria opina pela ausência de inconstitucionalidade manifesta no Projeto de Lei nº 028/2022, por inexistirem vícios de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário.

É o parecer.

Guaíba, 24 de março de 2022.

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador-Geral

OAB/RS nº 107.136

                                                   

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