Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Legislativo n.º 025/2022
PROPONENTE : Mesa Diretora
     
PARECER : Nº 025/2022
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Dispõe sobre a concessão de reajuste aos servidores do Poder Legislativo Municipal"

1. Relatório:

A Mesa Diretora apresentou o Projeto de Lei do Legislativo nº 025/2022 à Câmara Municipal, o qual concede reajuste aos servidores do Poder Legislativo Municipal. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pelo Presidente da Câmara para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno.

2. MÉRITO:

2.1 Da competência municipal e da iniciativa do processo legislativo

Em relação à competência, não há qualquer óbice à proposta. Conforme dispõe o artigo 30, I, da Constituição Federal de 1988, “Compete aos Municípios legislar sobre assuntos de interesse local.” No mesmo sentido, o artigo 6º, I, da Lei Orgânica do Município de Guaíba refere que “Ao Município compete prover a tudo quanto diga respeito ao seu peculiar interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe privativamente dentre outras, as seguintes atribuições: legislar sobre assunto de interesse local.”

O reajuste que se pretende aprovar se insere, efetivamente, na definição de interesse local, uma vez que compete a cada esfera da federação (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), por meio de cada poder constituído, promover a política remuneratória do serviço público, de modo que cabe ao Município de Guaíba adotar essa medida quanto aos seus servidores, nos termos do art. 30, inciso I, da CF/88.

A iniciativa para a deflagração do processo legislativo, por sua vez, está adequada, pois o projeto apresentado trata da concessão de reajuste aos servidores municipais vinculados ao Poder Legislativo, o que tem fundamento nos arts. 51, IV, 52, XIII, da CF/88, bem como no art. 53, XXXV, da Constituição Estadual.

2.2. Considerações sobre o reajuste remuneratório

A Mesa Diretora da Câmara propôs o projeto de lei argumentando que o objetivo da proposta é repor as perdas inflacionárias na remuneração dos servidores, neste momento, a título de reajuste (10,06%).

Em outras palavras, busca-se modificar a política remuneratória dos padrões básicos dos vencimentos dos cargos efetivos e dos cargos em comissão, proventos, pensões, bolsas-estágio, funções gratificadas, parcelas autônomas, vale-alimentação e gratificações por encargo para conceder-lhes um reajuste de 10,06%, a contar de 1º de março de 2022.

Na CF/88, o art. 37, inciso X, regula a forma de fixação e de alteração da remuneração dos servidores públicos, exigindo-se lei específica para cada caso e assegurando-se, ainda, a revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

X – a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices;

 Veja-se, nesse sentido, a elucidação dos Ministros Marco Aurélio e Carlos Ayres Britto, do Supremo Tribunal Federal, na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.459/RS:

Revisão geral distingue-se de aumento. Revisão geral implica simples manutenção do equilíbrio da equação inicial, afastando-se a perda sofrida por agentes públicos e servidores em virtude da inflação. Revisão geral, e o texto da Lei Fundamental a quer, repita-se, anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices – não resulta em acréscimo, mas na atualização monetária, de modo a eliminar os efeitos da inflação e com isso repor o poder aquisitivo da parcela percebida. (grifamos)

Entendo que em matéria de remuneração há apenas duas categorias ou dois institutos. Ou o instituto é da revisão, a implicar mera reposição do Poder aquisitivo da moeda, por isso que a Constituição no inciso X do artigo 37 fala de índices e datas absolutamente uniformes, iguais; ou, não sendo revisão, será reajuste – que eu tenho como sinônimo de aumento. Então, de um lado, temos ou revisão, que não é aumento, é mera recomposição do poder aquisitivo da moeda, ou, então, aumento. Mesmo que a lei chame de reajuste, entendo que é um aumento. Aí, sim, há uma elevação na expressão monetária do vencimento mais do que nominal e, sim, real. Aumento tem a ver com densificação no plano real, no plano material do padrão remuneratório do servidor; revisão, não. Com ela se dá uma alteração meramente nominal no padrão remuneratório do servidor, mas sem um ganho real.

Assim, seguindo-se o entendimento acima exposto, em matéria de remuneração há apenas dois institutos a serem compreendidos: revisão e reajuste. A revisão é a recomposição das perdas inflacionárias ocorridas durante determinado período, não se tratando de aumento, pois, embora haja uma elevação nominal da expressão monetária, não há, de fato, aumento real do padrão remuneratório. O reajuste, por outro lado, consiste na densificação do vencimento no plano real, para além dos índices inflacionários, tratando-se, efetivamente, de um aumento.

Na presente situação, a Mesa Diretora propõe o projeto de lei com o objetivo de conceder reajuste aos servidores municipais no percentual de 10,06%.

2.3 Do atendimento aos requisitos de natureza financeira

Além do atendimento da competência e da iniciativa legislativa, a proposta que objetive a concessão de reajuste aos servidores públicos deve demonstrar o cumprimento de requisitos de natureza orçamentária, previstos nos arts. 29-A e 169, § 1º, da CF/88 e nos arts. 15, 16, 17, 19 e 20 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Prevê o art. 169, caput e § 1º, da CF/88:

Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.

§ 1º A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos, empregos e funções ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo poder público, só poderão ser feitas: (Renumerado do parágrafo único, pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

I - se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

II - se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

Em relação à prévia dotação orçamentária, a estimativa de impacto orçamentário-financeiro indica que há recursos suficientes para o atendimento da despesa, pois a despesa total com pessoal projetada para o final do exercício é de R$ 11.304.524,02 e há dotação de R$ 18.791.102,94 no orçamento. Quanto à autorização específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias, verifica-se sua presença no art. 26 da Lei Municipal nº 4.081/2021.

Ainda, a estimativa do impacto orçamentário-financeiro contempla a previsão da classificação orçamentária por onde correrá a despesa, a declaração de que há previsão da despesa no orçamento e na programação financeira, demonstração do impacto no exercício corrente e nos dois posteriores, indicação dos percentuais de despesa e declaração de compatibilidade com as metas fiscais.

Na Lei de Responsabilidade Fiscal, preceituam os artigos 15 e 16, inc. I e II:

Art. 15. Serão consideradas não autorizadas, irregulares e lesivas ao patrimônio público a geração de despesa ou assunção de obrigação que não atendam o disposto nos arts. 16 e 17.

Art. 16. A criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa será acompanhado de:

I – estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subseqüentes;

II – declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias.

Tais exigências legais estão devidamente atendidas pela estimativa de impacto orçamentário-financeiro apresentada no projeto de lei. Além disso, dispõe o art. 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LC nº 101/00):

Art. 17. Considera-se obrigatória de caráter continuado a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios.

§ 1º Os atos que criarem ou aumentarem despesa de que trata o caput deverão ser instruídos com a estimativa prevista no inciso I do art. 16 e demonstrar a origem dos recursos para seu custeio.

§ 2º Para efeito do atendimento do § 1º, o ato será acompanhado de comprovação de que a despesa criada ou aumentada não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo referido no § 1º do art. 4º, devendo seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes, ser compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa.

§ 3º Para efeito do § 2º, considera-se aumento permanente de receita o proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

§ 4º A comprovação referida no § 2º, apresentada pelo proponente, conterá as premissas e metodologia de cálculo utilizadas, sem prejuízo do exame de compatibilidade da despesa com as demais normas do plano plurianual e da lei de diretrizes orçamentárias.

§ 5º A despesa de que trata este artigo não será executada antes da implementação das medidas referidas no § 2º, as quais integrarão o instrumento que a criar ou aumentar.

§ 6º O disposto no § 1º não se aplica às despesas destinadas ao serviço da dívida nem ao reajustamento de remuneração de pessoal de que trata o inciso X do art. 37 da Constituição.

§ 7º Considera-se aumento de despesa a prorrogação daquela criada por prazo determinado.

Quanto ao referido dispositivo legal, ressalta-se que a estimativa de impacto orçamentário-financeiro apresenta a origem dos recursos para o seu custeio e contém as premissas e a metodologia de cálculo, comprovando-se, ainda, que a despesa criada não afetará as metas de resultados fiscais.

Sobre a adequação da despesa aos limites constitucionais e da Lei Complementar nº 101/00, veja-se o disposto no artigo 29-A, inc. I, da CF/88:

Art. 29-A. O total da despesa do Poder Legislativo Municipal, incluídos os subsídios dos Vereadores e excluídos os gastos com inativos, não poderá ultrapassar os seguintes percentuais, relativos ao somatório da receita tributária e das transferências previstas no § 5º do art. 153 e nos arts. 158 e 159, efetivamente realizado no exercício anterior: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 25, de 2000)

I – 7% (sete por cento) para Municípios com população de até 100.000 (cem mil) habitantes; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 58, de 2009)

No caso de Guaíba, a receita tributária e as transferências para o Município somaram, em 2021, o valor de R$ 268.444.327,68. Aplicados 7% para a fixação da despesa total do Poder Legislativo, chega-se ao limite de R$ 18.791.102,94, que não será atingido pelo reajuste pretendido.

O artigo 29-A, § 1º, da CF/88 estabelece outro limite a ser observado:

Art. 29-A. [...]

§ 1º A Câmara Municipal não gastará mais de setenta por cento de sua receita com folha de pagamento, incluído o gasto com o subsídio de seus Vereadores. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 25, de 2000)

Quanto ao referido limite, o impacto orçamentário-financeiro estabelece a projeção de despesa com folha de pagamento em R$ 11.895.522,82, alcançando 63,30% da receita do Poder Legislativo, o que não torna ilegal a despesa, considerando que o limite constitucional em análise é de 70%.

Por fim, estabelecem os artigos 19 e 20 da LC nº 101/00:

Art. 19. Para os fins do disposto no caput do art. 169 da Constituição, a despesa total com pessoal, em cada período de apuração e em cada ente da Federação, não poderá exceder os percentuais da receita corrente líquida, a seguir discriminados:

I - União: 50% (cinqüenta por cento);

II - Estados: 60% (sessenta por cento);

III - Municípios: 60% (sessenta por cento).

Art. 20. A repartição dos limites globais do art. 19 não poderá exceder os seguintes percentuais:

[...]

III - na esfera municipal:

a) 6% (seis por cento) para o Legislativo, incluído o Tribunal de Contas do Município, quando houver;

De acordo com a estimativa de impacto orçamentário-financeiro, a receita corrente líquida para o exercício de 2022 é de R$ 335.325.600,00, de modo que 6% desse valor resulta no valor de R$ 20.119.536,00. A despesa total com pessoal projetada para o final do exercício é de R$ 11.304.524,02, representando 3,37% da receita corrente líquida.

Portanto, atendidas as exigências da CF/88 e da LRF no aspecto orçamentário e financeiro, o Projeto de Lei nº 025/2022, salvo melhor juízo, está apto para tramitação regimental, por estar compreendido na competência municipal e na iniciativa privativa da Mesa Diretora da Câmara Municipal de Guaíba.

3. Conclusão:

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula, por si só, a manifestação das comissões permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, a Procuradoria opina pela legalidade e pela regular tramitação do Projeto de Lei do Legislativo nº 025/2022, por inexistirem vícios de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário.

É o parecer.

Guaíba, 22 de março de 2022.

FERNANDO HENRIQUE ESCOBAR BINS

Procurador Geral

OAB/RS 107.136

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22/03/2022 16:17:01
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