Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Lei do Executivo n.º 060/2021
PROPONENTE : Executivo Municipal
     
PARECER : Nº 370/2021
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Altera a Lei Municipal nº 1570 de 06 de dezembro de 2000 que institui a Unidade Fiscal de Referência Municipal – UFIRM, para ser utilizada como expressão do valor de tributos, multas e preços, e dá outras providências"

1. Relatório

O Executivo Municipal apresentou o Projeto de Lei nº 060/2021 à Câmara Municipal, objetivando alterar a Lei Municipal nº 1.570, de 06 de dezembro de 2000, que institui a Unidade Fiscal de Referência Municipal – UFIRM, para ser utilizada como expressão do valor de tributos, multas e preços. A proposição foi encaminhada a esta Procuradoria para análise com fulcro no art. 105 do Regimento Interno.

2. FUNÇÕES DA PROCURADORIA JURÍDICA

A Procuradoria Jurídica da Câmara de Guaíba, órgão consultivo com previsão no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18, exerce as funções de assessoramento jurídico e de orientação da Mesa Diretora, da Presidência da Casa e dos setores legislativos, através da emissão de pareceres escritos e verbais, bem como de opiniões fundamentadas objetivando a tomada de decisões, por meio de reuniões, de manifestações escritas e de aconselhamentos. Trata-se de órgão público que, embora não detenha competência decisória, orienta juridicamente o gestor público e os setores legislativos, sem caráter vinculante.

Os pareceres jurídicos são atos resultantes do exercício da função consultiva desta Procuradoria Jurídica, no sentido de alertar para eventuais inconformidades que possam estar presentes. Conforme leciona Hely Lopes Meirelles na obra Direito Administrativo Brasileiro, 41ª ed., Malheiros Editores: São Paulo, 2015, p. 204, “O parecer tem caráter meramente opinativo, não vinculando a Administração ou os particulares à sua motivação ou conclusões, salvo se aprovado por ato subsequente. Já, então, o que subsiste como ato administrativo não é o parecer, mas, sim, o ato de sua aprovação, que poderá revestir a modalidade normativa, ordinatória, negocial ou punitiva.”

Desse modo, a função consultiva desempenhada por esta Procuradoria com base no art. 3º da Lei Municipal nº 3.687/18 – que dispõe sobre a organização administrativa da Câmara Municipal de Guaíba – não é vinculante, motivo pelo qual é possível, se for o caso, que os agentes políticos formem suas próprias convicções em discordância com as opiniões manifestadas por meio do parecer jurídico.

3. MÉRITO

O artigo 18 da Constituição Federal de 1988, inaugurando o tema da organização do Estado, prevê que “A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” O termo “autonomia política”, sob o ponto de vista jurídico, congrega um conjunto de capacidades conferidas aos entes federados para instituir sua organização, legislação, administração e governo próprios.

A autoadministração e a autolegislação, contemplando o conjunto de competências materiais e legislativas previstas na Constituição Federal para os Municípios, é tratada no artigo 30 da Lei Maior, nos seguintes termos:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual.

As alterações pretendidas se inserem na definição de interesse local, uma vez que dizem respeito ao estrito âmbito do Município de Guaíba, além de se referirem à competência constitucional de arrecadar os tributos que cabem ao referido ente federativo.

A iniciativa para o processo legislativo, por sua vez, também está adequada, visto que o Projeto de Lei nº 060/2021 propõe alterações na Lei Municipal nº 1.570/2000, que trata da UFIRM, expressão monetária de tributos, multas e preços públicos do Município de Guaíba, matéria para a qual é reconhecida a iniciativa concorrente, nos termos do artigo 61 da CF/88, artigo 59 da CE/RS e artigo 38 da Lei Orgânica Municipal.

A respeito disso, cumpre salientar que, segundo o entendimento jurisprudencial dominante, cabe ao Município a responsabilidade pela consecução de sua legislação tributária, pertencendo ao Executivo, ao Legislativo e, ainda, à população, através de iniciativa popular, a iniciativa dos referidos projetos de lei, por não haver qualquer restrição expressa à iniciativa para matéria tributária:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS DE DECISÃO MONOCRÁTICA. CONVERSÃO EM AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSO LEGISLATIVO. NORMAS SOBRE DIREITO TRIBUTÁRIO. INICIATIVA CONCORRENTE ENTRE O CHEFE DO PODER EXECUTIVO E OS MEMBROS DO LEGISLATIVO. POSSIBILIDADE DE LEI QUE VERSE SOBRE O TEMA PERCUTIR NO ORÇAMENTO DO ENTE FEDERADO. IRRELEVÂNCIA PARA FINS DE DEFINIÇÃO DOS LEGITIMADOS PARA A INSTAURAÇÃO DO PROCESSO LEGISLATIVO. AGRAVO IMPROVIDO. I. A iniciativa de leis que versem sobre matéria tributária é concorrente entre o chefe do poder executivo e os membros do legislativo. II. A circunstância de as leis que versem sobre matéria tributária poderem repercutir no orçamento do ente federado não conduz à conclusão de que sua iniciativa é privativa do chefe do executivo. III. Agravo Regimental improvido. (STF - RE: 590697 MG, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 23/08/2011, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-171 DIVULG 05-09-2011 PUBLIC 06-09-2011 EMENT VOL-02581-01 PP- 00169).

No caso, o projeto em questão partiu do próprio Poder Executivo, que procura fazer alterações na referida lei municipal, não havendo, portanto, qualquer obstáculo constitucional à competência e à iniciativa exercidas na proposta.

Quanto à matéria de fundo, também não se verificam óbices à proposta. Convém lembrar que a exposição de motivos informa que, atualmente, para o reajuste da UFIRM, é utilizada uma média entre os índices INPC, IPCA e IGP-M, e o proponente considera que essa forma de cálculo vem apresentando índices que não refletem a inflação real, podendo gerar uma oneração excessiva aos contribuintes. Nesse sentido, justifica-se a alteração da forma de cálculo da atualização, que será então definida pela média extraída da soma dos dois menores indicadores positivos não nulos dentre o INPC, IPCA e IGP-M, ou seja, trata-se de medida que busca concretizar maior justiça fiscal pela definição de índice de atualização monetária que reflita mais adequadamente a inflação.

A proposição encontra amparo na jurisprudência do TJRS, que considera não haver inconstitucionalidade ou ilegalidade na adoção do IGP-M como parâmetro para a correção da base de cálculo do IPTU e dos créditos tributários pelo Município de Bagé, visto que esse índice consubstancia um autêntico índice de preços, isto é, recomposição decorrente da progressiva perda do valor monetário dos tributos e créditos tributários:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 4º, PARÁGRAFOS 4º E 5º DA LEI MUNICIPAL N. 3.965/2002, COM A REDAÇÃO CONFERIDA PELA LEI MUNICIPAL N. 5.821/2017 DO MUNICÍPIO DE BAGÉ. ATUALIZAÇÃO DO VALOR VENAL DOS IMÓVEIS PARA FINS DE CÁLCULO DO IPTU, ASSIM COMO, CORREÇÃO DOS CRÉDITOS FISCAIS EM ATRASO. ADOÇÃO DO IGP-M, COMO FATOR DE CORREÇÃO MONETÁRIA. I.O Município detém competência para instituir imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana, na forma do art. 146, I, da Constituição Federal, bem como, dispõe de autonomia para arrecadar tributos de sua competência (art. 30, III, da Constituição Federal). Não constitui majoração do tributo para fins do disposto no inciso II deste artigo, a atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo (art. 97, §2º, do CTN). O Supremo Tribunal Federal assentou compreensão no sentido de que é inconstitucional a majoração do IPTU sem edição de lei em sentido formal, vedada a atualização, por ato do executivo em percentual superior aos índices da inflação (RE 648245, com repercussão geral). No mesmo sentido o disposto na súmula 160 do superior tribunal de justiça. II. O supremo Tribunal Federal quando tratou o tema correção monetária, a definiu como o escopo de preservar o poder aquisitivo da moeda diante da sua desvalorização nominal provocada pela inflação, devendo ‘os índices de correção monetária’ consubstanciar autênticos índices de preços. Não há na legislação federal qualquer índice de inflação que deva ser adotado compulsoriamente. O IGP-M adotado como parâmetro para a correção da base de cálculo do IPTU e dos créditos tributários pelo Município de Bagé, calculado pela Fundação Getúlio Vargas, apura informações sobre variação de preços do dia 21 do mês anterior ao dia 20 do mês seguinte, numa evidente compatibilidade com a decisão do Supremo Tribunal Federal. Inexistência de qualquer pecha de inconstitucionalidade na adoção de tal índice. Ação julgada improcedente. (Direta de Inconstitucionalidade, Nº 70084861657, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Aurélio Heinz, Julgado em: 11-06-2021)

4. Conclusão

Diante do exposto, respeitada a natureza opinativa do parecer jurídico, que não vincula, por si só, a manifestação das comissões permanentes e a convicção dos membros desta Câmara, e assegurada a soberania do Plenário, a Procuradoria opina pela legalidade e regular tramitação do Projeto de Lei nº 060/2021, por inexistirem vícios de natureza material ou formal que impeçam a sua deliberação em Plenário.

É o parecer, salvo melhor juízo.

Guaíba, 2 de dezembro de 2021.

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B

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02/12/2021 13:57:13
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