Câmara de Vereadores de Guaíba

PARECER JURÍDICO

PROCESSO : Projeto de Emenda à Lei Orgânica n.º 001/2018
PROPONENTE : Ver. Dr. Renan Pereira
     
PARECER : Nº 141/2018
REQUERENTE : #REQUERENTE#

"Acrescenta o Art. 21-A à Lei Orgânica Municipal"

1. Relatório:

O Vereador Renan Pereira e outros cinco Vereadores apresentaram o Projeto de Emenda à Lei Orgânica nº 001/2018 à Câmara Municipal, em que busca acrescentar o artigo 21-A à Lei Orgânica, o qual reconhece, em âmbito local, a Procuradoria da Câmara como órgão da Advocacia Pública Municipal. A proposta foi encaminhada à Procuradoria pela Presidência da Câmara para análise nos termos do artigo 105 do Regimento Interno.

2. Parecer:

De fato, a norma insculpida no art. 105 do Regimento Interno da Câmara Municipal de Guaíba prevê que cabe ao Presidente do Legislativo a prerrogativa de devolver ao autor as proposições manifestadamente inconstitucionais (art. 105, II), alheias à competência da Câmara (art. 105, I) ou ainda aquelas de caráter pessoal (art. 105, III). O mesmo controle já é exercido no âmbito da Câmara dos Deputados, com base em seu Regimento Interno (art. 137, § 1º), e no Regimento Interno do Senado Federal (art. 48, XI), e foi replicado em diversos outros regimentos internos de outros parlamentos brasileiros.

A doutrina trata do sentido da norma jurídica inscrita no art. 105 do RI caracterizando-o como um controle de constitucionalidade político ou preventivo, sendo tal controle exercido dentro do Parlamento, através de exame superficial pela Presidência da Mesa Diretora, com natureza preventiva e interna, antes que a proposição possa percorrer o trâmite legislativo. Via de regra, a devolução se perfaz por despacho fundamentado da Presidência, indicando o artigo constitucional violado, passível de recurso ao Plenário (art. 105, p. único).

Inicialmente, verifica-se estar adequada a iniciativa para a deflagração do processo legislativo, uma vez que, tratando-se de projeto de emenda à Lei Orgânica, exige o artigo 35, § 1º, da LOM que a proposta, se for veiculada por Vereadores, seja subscrita por 1/3 dos membros da Câmara, requisito que foi devidamente observado (fl. 02).

 Além disso, lembra-se que, para a aprovação de projeto de emenda à Lei Orgânica, deve a proposta ser discutida e votada em duas sessões, entre as quais haverá interstício mínimo de 10 (dez) dias, considerando-se aprovada se obtiver 2/3 dos votos dos membros da Câmara Municipal em ambas as votações (artigo 36, LOM).

A promulgação da emenda à Lei Orgânica, se aprovado o seu projeto, caberá à Mesa Diretora da Câmara, a qual conferirá o respectivo número de ordem (artigo 37, Lei Orgânica Municipal). Respeitadas tais formalidades, não se verificará qualquer vício de natureza formal, porquanto são essas as exigências para a tramitação do projeto.

No que diz respeito aos aspectos materiais do projeto de emenda à Lei Orgânica, não há qualquer mácula constitucional ou legal a impedir a tramitação da proposta. Embora a Advocacia Pública Municipal não tenha sido regrada constitucionalmente, os artigos 131 e 132 da CF/88 lhe servem de fundamento geral de organização, já tendo sido reconhecida, na jurisprudência, a aplicabilidade desses dispositivos aos Municípios, especialmente pelo fato de todos os entes federados – União, Estados, DF e Municípios – terem de organizar os seus órgãos de assessoramento e representação judicial similarmente.

Aliás, sobre a aplicabilidade dos artigos 131 e 132 da CF/88 aos Municípios, cabe trazer à tona um exemplo já apresentado em pareceres anteriores desta Procuradoria Jurídica, no sentido de que, à luz da jurisprudência, é inconstitucional a manutenção de cargos em comissão de assessoramento jurídico no âmbito da Advocacia Pública Municipal, tendo em vista a natureza técnica das atribuições, que são incompatíveis com a relação de confiança típica dos cargos comissionados, e as exigências dos arts. 131 e 132, que organizam as Procuradorias apenas com servidores efetivos:

REEXAME NECESSÁRIO. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MUNICÍPIO DE SÃO FRANCISCO DE ASSIS. ASSESSOR JURÍDICO. CARGOS EM COMISSÃO. ATRIBUIÇÕES INCOMPATÍVEIS COM A FORMA DE PROVIMENTO. INCONSTITUCIONALIDADE. NULIDADE DOS ATOS DE NOMEAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA EM REEXAME NECESSÁRIO. Consoante o disposto no art. 10, par. Único, da Lei nº 440/2009 do Município de São Francisco de Assis, não há como se cogitar que os assessores jurídicos municipais desempenhassem atribuições conferidas a um cargo de confiança, porquanto se referem a tarefas de natureza eminentemente técnica, inerentes ao profissional da advocacia ou mesmo ao bacharel em direito. Inclusive, porque estavam sob a orientação e coordenação do Procurador-Geral do Município, este sim cargo em comissão subordinado ao Chefe do Executivo, responsável por traçar as linhas mestras a serem observadas pelos demais profissionais do direito. Ademais, não é simplesmente o nome dado ao cargo que irá definir a sua natureza e, consequentemente, sua forma de provimento. Não basta, pois, nominar como assessor jurídico o cargo ao qual é cometido um conjunto de atribuições cujo desempenho é inerente a um servidor efetivo, para fins de permitir a livre nomeação e exoneração, em evidente exceção ilegítima à regra geral de acesso ao cargo público via concurso público. Nulidade dos atos de nomeação mantida. SENTENÇA CONFIRMADA EM REEXAME NECESSÁRIO. (Reexame Necessário Nº 70062371752, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marilene Bonzanini, Julgado em 21/11/2014).

CONCURSO PÚBLICO. DIREITO ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. MUNICÍPIO DE CACEQUI. NOMEAÇÃO AO CARGO DE PROCURADOR JURÍDICO DO MUNICÍPIO DE CACEQUI. PLEITO DE DECLARAÇÃO INCIDENTAL DA ILEGALIDADE DA FORMA DE PROVIMENTO EM COMISSÃO DO CARGO DE PROCURADOR ADJUNTO. AÇÕES CIVIS PÚBLICAS AJUIZADAS ANTERIORMENTE. DECRETAÇÃO DA NULIDADE DE PORTARIAS DE NOMEAÇÃO. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI-CACEQUI Nº 1.810/98. AGRAVO DE INSTRUMENTO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE DIANTE DA REALIDADE ATUAL. A Pretensão do Município de Cacequi de ter reformada a decisão que deferiu a nomeação do agravado no cargo de Procurador Jurídico do Município de Cacequi em detrimento do cargo ocupado por outro servidor nomeado em cargo em comissão não merece ter seguimento. Isso porque foi declarada a inconstitucionalidade da Lei-Cacequi nº 1.810/98 pelo Tribunal Pleno desta Corte, norma que embasou as Portarias de nomeações de servidores para ocupar o cargo em comissão, além de ter sido decretada a nulidade de portarias de nomeação em duas ações civis públicas ajuizadas pelo Ministério Público. Situação atual relativamente às ilegalidades praticadas pela administração municipal de Cacequi que não autoriza o seguimento do presente recurso. SEGUIMENTO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO NEGADO POR MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA. DECISÃO MONOCRÁTICA. (Agravo de Instrumento Nº 70056903420, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nelson Antônio Monteiro Pacheco, Julgado em 18/10/2013).

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ASSESSOR JURÍDICO. CARGO EM COMISSÃO. ATRIBUIÇÃO DE FUNÇÕES TÍPICAS DE PROCURADOR DO MUNICÍPIO. LEGISLAÇÃO MUNICIPAL EM DESCOMPASSO ÀS CONSTITUIÇÕES FEDERAL E ESTADUAL. PRECEDENTES DO STF E DO TJRS. NULIDADE DOS ATOS DE NOMEAÇÃO DOS SERVIDORES. LEI SUPERVENIENTE. READEQUAÇÃO DAS ATRIBUIÇÕES DO CARGO. PERDA DE OBJETO. NÃO CARACTERIZADA. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO. (Apelação e Reexame Necessário Nº 70071254999, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marcelo Bandeira Pereira, Julgado em 23/11/2016).

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – [...] MÉRITO - MUNICÍPIO DE LINHARES - ARTIGO 329 E ANEXO II DA LEI Nº 2.560/2005 - CARGO DE PROCURADOR MUNICIPAL - FUNÇÃO COMISSIONADA - IMPOSSIBILIDADE - CARREIRA ACESSÍVEL SOMENTE POR CONCURSO PÚBLICO - PREVISÃO CONSTITUCIONAL - ARTIGO 132 DA CARTA MAGNA E 122 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO - NECESSÁRIA OBSERVÂNCIA PELA LEI ORGÂNICA MUNICIPAL - PRINCÍPIO DA SIMETRIA [...] - AÇÃO JULGADA PROCEDENTE. [...] 1 - Apesar do município ter sua autonomia política administrativa preservada dentro do nosso sistema jurídico essa não poderá se distanciar dos princípios estabelecidos nas constituições federal e estadual, conforme se denota do artigo 29 da Constituição Republicana e do artigo 20 da Lei Máxima do Estado do Espírito Santo. 2 - Apesar da exigência constitucional do concurso público, a ausência de uma abordagem especifica da Constituição Federal acerca da carreira jurídica municipal fez surgir uma comum e reiterada presença de cargos comissionados nesses setores, contudo, por meio de uma análise principiológica e constitucional, percebe-se que a estruturação das carreiras jurídicas municipais deve efetivar-se de forma simétrica às carreiras jurídicas da união e dos estados federados, sob pena, ao se adotar caminho diverso, de vir a incorrer em uma flagrante ofensa a diversos princípios constitucionais regentes da atividade administrativa e da Constituição Federal. ‘- A formação dos quadros da administração pública deve, obrigatoriamente, obedecer ao que prescreve o artigo 37, caput, da Constituição Federal, que elenca como princípios basilares da administração pública a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência. 4 - Pela análise do artigo 132 da Carta Magna, e artigo 122 da Constituição do Estado do Espírito Santo, não pode o Município criar sua advocacia pública essencialmente com servidores comissionados, pois estaria se afastando do modelo constitucionalmente desejado pelo legislador constituinte, eis que o desejo da norma máxima é aquele que impõe o ingresso na carreira da advocacia pública por meio de concurso público de provas e títulos, e que deve ser reprisado nas Leis Orgânicas Municipais, em atenção ao princípio da simetria e aos pensamentos principiológicos da administração pública. 5 - Conforme depreende-se do artigo 33, da Lei Municipal n. 2560/2005, ora impugnada, os procuradores jurídicos, admitidos pela municipalidade em cargos em comissão, atuavam em atividades meramente técnicas, rotineiras, relacionadas à atividade-meio da Administração Pública, o que deve ser desempenhado pelos servidores efetivos nomeados por concurso, este a ser realizado pelo Poder Público e, assim sendo, é evidente que a nomeação (admissão) das funções listas no artigo 329, em conjunto com o anexo II, da Lei n.º 2.560/2005, do Município de Linhares, para exercerem a função de procurador municipal, é ofensiva à ordem constitucional que contempla o concurso público como mecanismo de acesso ao funcionalismo público, fixado no artigo 37, inciso II, da Constituição Federal. [...] (TJES, Classe: Direta de Inconstitucionalidade, 100120001654, Relator : JOSÉ LUIZ BARRETO VIVAS, Órgão julgador: TRIBUNAL PLENO, Data de Julgamento: 13/12/2012, Data da Publicação no Diário: 30/01/2013).

Além disso, no Código de Processo Civil, o art. 182 dispõe sobre a Advocacia Pública nos seguintes termos: “Incumbe à Advocacia Pública, na forma da lei, defender e promover os interesses públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, por meio da representação judicial, em todos os âmbitos federativos, das pessoas jurídicas de direito público que integram a administração direta e indireta.”

A Câmara Municipal possui natureza jurídica de órgão público com personalidade judiciária, sendo capaz de contrair direitos e obrigações para atender às suas finalidades institucionais, com capacidade para estar em juízo a fim de defender o seu funcionamento, as suas prerrogativas e a sua independência. A sua Procuradoria Jurídica, sem dúvidas, integra a Advocacia Pública Municipal por exercer a representação judicial e o assessoramento do Legislativo, o qual também integra o Município de Guaíba, assim como o Executivo.

Assim, é totalmente viável o reconhecimento, na Lei Orgânica Municipal, da Procuradoria Jurídica da Câmara de Guaíba como um órgão da Advocacia Pública Municipal, por ser essa a sua exata natureza, considerando o disposto nos artigos 131 e 132 da CF/88 e o atual regramento instituído pelo Novo Código de Processo Civil. Sobre as vantagens práticas desse reconhecimento, os Procuradores da Casa Legislativa terão maiores fundamentos para sustentar a aplicação de prerrogativas processuais já reconhecidas aos membros da Advocacia Pública Municipal no âmbito do Executivo: a) atuação sem procuração, com base no artigo 287, parágrafo único, III, do CPC, respaldado pela Lei Municipal nº 3.634/18; b) prazo em dobro para todas as manifestações processuais (artigo 183, CPC); c) intimação pessoal (artigo 183, CPC); d) dispensa do preparo, inclusive porte de remessa e retorno, nos recursos que eventualmente sejam interpostos (artigo 1.007, § 1º, CPC); e) outras prerrogativas estabelecidas na legislação.

Portanto, não há qualquer vício de natureza formal ou material a impedir a regular tramitação do Projeto de Emenda à Lei Orgânica Municipal nº 001/2018, o qual pretende acrescentar dispositivo à Lei Orgânica Municipal para declarar a Procuradoria Jurídica da Câmara Municipal como órgão integrante da Advocacia Pública de Guaíba.

Conclusão:

Diante do exposto, a Procuradoria opina pela legalidade e pela regular tramitação do Projeto de Emenda à Lei Orgânica Municipal nº 001/2018, por inexistirem vícios formais ou materiais que impeçam a sua deliberação em Plenário, desde que atendidos os requisitos procedimentais previstos na Lei Orgânica para a aprovação da proposta: a) discussão e votação em duas sessões, com interstício mínimo de 10 (dez) dias; b) aprovação por 2/3 dos membros da Câmara Municipal em ambas as votações; c) promulgação pela Mesa Diretora, com o respectivo número de ordem.

Guaíba, 09 de maio de 2018.

GUSTAVO DOBLER

Procurador

OAB/RS nº 110.114B



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